Heitor Scalambrini Costa *
A questão energética definitivamente está incorporada ao debate da sucessão presidencial. Ela o foi na eleição de 2002. O assunto rendeu após o racionamento de longos oito meses, pela barbeiragem do governo FHC, que preferiu obedecer aos ditames do FMI quanto ao ajuste fiscal, em vez de investir na geração e transmissão de energia. Sem dúvida, a falta de energia para atender às necessidades da população com o corte de 20% imposto no consumo, contribuiu decisivamente para a derrocada do candidato de Fernando Henrique, indicado para sucedê-lo.
Em 2008, voltou com destaque. E o país passou “raspando” de um novo racionamento. Em 2010, 2011 e 2012, as interrupções temporárias no fornecimento de energia proliferaram pelo Brasil afora. Nunca antes na história recente tivemos tantos “apagões” e “apaguinhos”, atingindo as varias regiões do Sul ao Norte, do Leste ao Oeste, caracterizados por uma grande freqüência e longa duração no tempo. São Pedro, equipamentos com defeitos e mão de obra desatenciosa foram alguns dos responsáveis aos olhos do governo federal.
Agora, no inicio de 2013, os níveis de água dos reservatórios das hidrelétricas atingiram patamares semelhantes aos alcançados no racionamento de 2001/2002. O alerta amarelo foi acionado, e voltou-se a discutir o porquê de o sistema elétrico brasileiro viver aos sobressaltos.
Leia também
Nesses episódios recorrentes já se passaram 12 anos desde o maior racionamento da história brasileira, e verificou-se que as tarifas não pararam de aumentar e a qualidade dos serviços oferecidos à população deteriorou.
Todavia, os sucessivos governos não admitiram e nem admitem que as estratégias adotadas no setor foram erradas, no mínimo equivocadas. Culpam até aquele que ocupa um cargo junto a Deus, o santo das chuvas. É brincadeira!!!
PublicidadeMas, o mais importante para o governo de plantão é manter sua imagem fictícia e incólume junto à população (ou, na verdade, junto aos eleitores?). E qual é essa imagem? No presente caso, a da presidenta como rigorosa gestora, administradora competente, tocadora de obras públicas, a mãe do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e a excepcional especialista na temática da energia. “Colou” naquela que ocupa o cargo público de maior relevância, a grande expert em assuntos energéticos, sendo até escolhida como primeira mulher a ocupar o cargo de ministra de Minas e Energia. Com isso, se esperava garantir, perante a população traumatizada com o racionamento da época do FHC, credibilidade e a confiança de que no Brasil não haveria mais problemas com a energia.
Ledo engano. A realidade foi mais forte que os criadores de ilusão, os marqueteiros. Todavia não jogaram a toalha, e na corrida para a reeleição presidencial, voltaram com tudo, querendo vender “gato por lebre”.
No segundo semestre do ano passado, a presidenta, em duas oportunidades em rede nacional de rádio e televisão, abordou a questão energética enfaticamente. A primeira, às vésperas de um dia emblemático para os brasileiros, 7 de setembro – Dia da Independência. Em tom triunfal e apoteótico, anunciou o corte nas tarifas de energia elétrica. A presidenta invocou o talento, o esforço e a coragem de seu governo em tomar essa medida. Diga-se de passagem que ela mesma contribuiu antes para a explosão tarifária, tanto no cargo de ministra de Minas e Energia, como da Casa Civil, e agora como presidenta do Brasil.
No segundo pronunciamento em cadeia nacional, no dia 23 de dezembro de 2012, além das tradicionais desejos de boas festas, ela mais uma vez afirmou que a conta de luz residencial e a das empresas vão ficar menores. Pura jogada de marketing, pois todos os analistas do setor elétrico que estão fora do governo não cansam de afirmar que o governo federal com uma mão diminuirá as tarifas e com a outra neutralizará essa redução, com a introdução do encargo denominado “risco hidrológico”, com as bandeiras tarifárias e o repasse do custo da energia das termelétricas (até cinco vezes maior que as hidrelétricas ), nos reajustes anuais previstos nas revisões tarifárias.
Em 23 de janeiro de 2013, a presidenta, em novo pronunciamento em rede nacional de rádio e televisão, Dilma voltou a abordar o tema energético. Agora, depois de muita reza para que chovesse, e descartada a iminência de um racionamento. E mais uma vez, como uma “questão de honra” e em tom bombástico, não só garantiu que as tarifas serão reduzidas, acusando os pessimistas de sempre, como também anunciou a antecipação do desconto na conta de luz, que passará a vigorar a partir do dia 24 de janeiro. O tom triunfalista predominou na fala de sua excelência, fazendo até lembrar do velho refrão usado pela ditadura militar “Brasil: ame-o ou deixe-o”. Já se disse que “uma mentira muitas vezes repetida torna-se uma verdade”. Vamos aguardar quantas vezes mais será repetida que as tarifas elétricas vão diminuir. Uma vez mais o marketing das falas presidenciais subestima a inteligência e a capacidade de discernimento dos brasileiros.
E nessa batalha da comunicação não adianta a oposição à direita estrebuchar, acusando o governo de praticar o populismo energético etc e tal. Pois não devemos esquecer que tudo começou com FHC e continuou com Lula e Dilma. Durma com esta bronca!!!
* Graduado em Física pela Universidade de Campinas e doutor em Energética pela Universidade de Marselha III, Heitor Scalambrini Costa é professor da Universidade Federal de Pernambuco.
Veja ainda:
Deixe um comentário