A própria composição da Mesa Diretora para o biênio 2015-2016, cuja aprovação em plenário resultou em bate-boca entre Renan e Aécio Neves (PSDB-MG), o principal líder oposicionista no Senado, é vista como uma espécie de trincheira da base aliada, que alijou a oposição.
Leia também
Sem “rebeldes” na Mesa, o cardápio de assuntos indigestos para o governo e seus atores poderia ser mais facilmente barrado no Senado, apontam oposicionistas. Líder do PSDB, Cássio Cunha Lima (PB) disse ao Congresso em Foco que Renan fez um “movimento de defesa” ao barrar a oposição. Segundo Cássio, a legitimidade de comando do colega alagoano vale apenas para os 49 senadores que nele votaram em 1º de fevereiro, mantendo-o no posto, em processo de segregação “péssimo para o Senado”.
“O presidente Renan fez uma opção, a meu ver, equivocada. Ele escolheu presidir 49 senadores ao invés de liderar a Casa. Vejo esse movimento como um movimento de defesa. Na batalha da semana passada, construíram-se trincheiras para a guerra que está por vir”, disse o parlamentar paraibano, para quem a função de comando ocupada por Renan o expõe “naturalmente”.
Mas Cássio faz a ressalva de que as investigações da Lava Jato, ainda sem provas contra Renan, precisam ser concluídas. Além do presidente do Senado, outro membro da Mesa, Romero Jucá (PMDB-RR), também foi citado na Lava Jato, segundo reportagens do jornal O Estado de S.Paulo e da revista Veja. Ao todo, 41 políticos, a grande maioria da base aliada, já foram citados em algum momento das investigações, segundo notícias veiculadas na imprensa até o momento. As acusações criminais contra parlamentares serão tratadas no Supremo Tribunal Federal (STF), onde tramitam inquéritos e ações penais contra deputados, senadores e outras autoridades federais.
“Eu não posso pré-anunciar, porque não tenho informações nesse sentido, sobre quais parlamentares estarão citados na Lava Jato. Tenho que ter muita responsabilidade nas minhas declarações. Mas é inegável que a presidência do Senado gera um nível de exposição ainda maior”, acrescentou o líder do PSDB, recorrendo ao humor para resumir o cenário político atual. “A temperatura já está muito elevada e eu, como líder de um partido de oposição, não pretendo apagar incêndio com gasolina. Até porque está muito cara”, ironizou.
Ministra da Casa Civil no primeiro mandato da presidenta Dilma Rousseff, Gleisi Hoffmann (PT-PR) negou ao Congresso em Foco a tese da blindagem – ou a relação desta com a escolha da Mesa – de Renan ou da própria Dilma, alvo de rumores sobre uma interrupção de seu mandato. “É óbvio que não, de maneira alguma. Aliás, eu não sei como blindaria, não é? [Um processo de impeachment] não depende deste Congresso. Depende, se tiver, de uma comissão parlamentar de inquérito, e a comissão tiver condições de fazer um julgamento político. E, primeiro, nós temos de esperar acabar o processo, até para que tudo venha à tona”, declarou a senadora petista.
“Chumbo grosso”
De acordo com um senador que não votou em Renan, a “blindagem” do Planalto custaria ao PT, segunda maior bancada, seus 14 votos no peemedebista, que por fim também estaria blindado pelo conjunto dos aliados na Mesa, em uma relação de reciprocidade. Outro senador da oposição disse à reportagem que Renan Calheiros agiu pensando no futuro imediato, e logo tratou de se precaver com o arranjo dos cargos. Mas, para esse parlamentar, a posição do senador alagoano está longe de ser confortável, apesar do status conferido pelo comando do Senado.
“É uma situação difícil. Se por um lado ele fica forte na presidência do Senado, para se defender [de denúncias]; por outro lado, ele fica muito em evidência. O chumbo vai ser grosso contra ele. Acho que a presidência é ruim para ele”, observou o oposicionista, que pediu para não ser identificado.
Ontem (9), depois de participar de uma reunião com o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), Renan falou pela primeira vez, e não por meio de nota, sobre as menções ao seu nome nas investigações da Lava Jato. Ele negou qualquer tipo de contato com o doleiro Alberto Youssef. O suposto envolvimento entre Renan e Youssef foi suscitado no depoimento de Meire Poza, ex-contadora do doleiro, à CPI mista da Petrobras, no ano passado.
Segundo Meire, Renan e Youssef chegaram a se reunir para negociar uma operação financeira de R$ 25 milhões relativa ao fundo de pensão dos Correios, o Postalis. A ex-contadora disse que Renan atuou para que o Postalis comprasse aquele valor em debêntures emitidos por uma empresa de turismo da qual um dos sócios era Youssef, preso em decorrência da Lava Jato desde março de 2014.
“A chance de que eu possa ter tido encontro com essa gente é zero, absolutamente zero. Nem sei quem é [Youssef], nunca ouvi falar, só pelos desdobramentos [da Lava Jato] nos jornais. Não conheço nenhum dos nomes citados. Então, a chance é absolutamente zero”, declarou Renan.
Articulação
O argumento usado pelos governistas para justificar a escolha da Mesa é a questão da proporcionalidade, que dá prioridade a siglas mais numerosas na escolha dos principais cargos, inclusive para comissões temáticas. Nos momentos que precederam a eleição da chapa única, Renan recorreu à tese ao dizer que nomes de siglas menores resolveram disputar postos do colegiado seguindo o “precedente” aberto pelo candidato alternativo do PMDB, Luiz Henrique da Silveira (SC), ao comando do Senado. Desobedecendo a orientação da bancada, o senador catarinense foi para a briga com Renan e recebeu 31 votos, com o apoio da oposição.
“A oposição desrespeitou a proporcionalidade [ao apoiar Luiz Henrique]. Quando a oposição lançou um candidato avulso e não apoiou o candidato do maior partido da Casa, que era a primeira ação de proporcionalidade, liberou para que as composições fossem feitas de forma diferente”, acrescentou Gleisi Hoffmann, para quem a Mesa foi composta depois de uma “articulação” normal do Senado.
“Como havia outros senadores disputando outros cargos, entendeu-se que, a partir do momento em que a oposição desrespeitou a proporcionalidade, poderia ser feita também a eleição de outros cargos”, concluiu.
Mas a oposição não pensa assim, e promete acirrar o embate agora na distribuição dos postos de comando das comissões temáticas – colegiados que analisam os mais diversos tipos de projetos, de acordo com a área a que dizem respeito, antes da discussão deles em plenário. Embora o presidente nacional do DEM, José Agripino (RN), tenha evitado comentar ao Congresso em Foco o que aconteceu na escolha da Mesa (“É passado!”, resumiu), Cássio Cunha Lima garante que terá “muito cuidado” nas próximas disputas.
“Agora chegará o momento mais importante, a meu ver, que é a escolha do comando das comissões. Diferentemente dos cargos da Mesa – que dizem respeito às funções administrativas da Casa, e o PSDB e outros partidos de oposição não estão em busca de penduricalhos, de empreguinhos para acomodar aliados –, na distribuição das comissões está nossa responsabilidade legislativa e, sobretudo, a representatividade do voto popular”, disse Cássio, avisando que as minorias vão requerer indicações para alguns dos postos de comando das 12 comissões permanentes do Senado. Essas negociações têm início hoje (terça, 10), em reunião de líderes partidários, mas só devem ser concluídas depois do carnaval.
O líder tucano rebateu as reclamações governistas de que os rumores sobre impeachment presidencial são algo insuflado por oposicionistas descontentes com o resultado das eleições do ano passado. “Nessa última semana tem-se falado muito de golpe. A oposição não é golpista. Golpe seria impedir a participação das oposições nas comissões, como se comenta – no que eu não quero acreditar que acontecerá”, observou o senador.