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Como o Congresso em Foco tem noticiado nos últimos dias, a reforma administrativa do Senado irá para o seu quarto ano sem conclusão. Em sua 67ª e última reunião desta legislatura, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) encerrou 2011 sem votar o Projeto de Resolução do Senado (PRS) 96/2009, que promove a alardeada reforma administrativa iniciada há mais de dois anos em meio à mais grave crise da história da Casa, o caso dos atos secretos. O adiamento foi provocado por Pedro Simon (PMDB-RS), que, descontente com o teor do relatório apresentado por Benedito de Lira (PP-AL), na esfera da CCJ, ameaçou pedir vista da matéria caso ela fosse posta em votação. Simon entendeu que o projeto ia na contramão das propostas de enxugamento administrativo e economicidade propalada pela reforma, ao incluir acréscimos de funções e cargos comissionados – apenas isso significaria mais de R$ 3 milhões de gasto anual extra (leia mais abaixo) –, entre outras pontos contestados.
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Diante da intervenção do senador gaúcho, o presidente da CCJ, Eunício Oliveira (PMDB-CE), resolveu encerrar a sessão – mesmo com outros itens importantes na pauta, como a PEC do Conselho Nacional de Justiça, que reforça os poderes do órgão fiscalizador do Judiciário. Eunício alegou a restrição regimental que impede a realização simultânea de sessões deliberativas de plenário e de comissões temáticas (o Plenário do Congresso havia sido iniciado para a promulgação da chamada PEC da DRU). Além de Simon, outros senadores manifestaram objeção a pontos do parecer de Benedito – mas, ao contrário de Simon, estavam dispostos a resolver a questão ainda nesta quarta-feira.
Respectivamente relator e presidente da subcomissão especialmente criada na CCJ para promover a reforma, Ricardo Ferraço (PMDB-ES) e Eduardo Suplicy (PT-SP) lamentaram à reportagem o adiamento da votação. Eles chegaram a levar à reunião do colegiado um relatório de reclamações e questionamentos sobre a relatoria de Benedito, mas não tiveram a oportunidade de discutir elementos do texto com os demais membros da CCJ.
Diante do fato de que a matéria entrará no quarto ano sem efeitos práticos (a tramitação do PRS teve início no final de 2009), Ricardo Ferraço manifestou sua irritação ao Congresso em Foco. “Lamentavelmente, como nada aqui acontece por acaso, houve uma manobra política que nos impediu de votar a reforma administrativa. Nosso relatório está entregue desde julho, e o Senado não votou porque não teve vontade. É injustificável”, protestou o senador, depois de repassar à reportagem o documento elaborado em conjunto com Suplicy.
“Há um ditado que diz que ‘jaboti em árvore é enchente ou mão de gente’. Como não tem chovido em Brasília suficientemente para provocar enchentes, só posso acreditar que foi mão de gente que impediu a votação da reforma administrativa. Isso aconteceu porque foram feitas manobras políticas que impediram que a gente votasse a matéria”, desabafou Ferraço, visivelmente irritado, resumindo em seguida o clima de frustração de membros da CCJ – e, por outro lado, de alívio funcionários que poderiam ter regalias restringidas pela reformulação institucional, e mesmo ameaçados de perder o cargo comissionado. “É dia de luto.”
“Não há razão plausível para o Senado continuando adiando a reforma administrativa”, emendou Suplicy, frustrado por sequer ter a oportunidade de discutir a matéria na reunião de hoje.
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Mais despesas
O documento em que Ferraço e Suplicy registram a “evolução da reforma administrativa do Senado Federal”, datado de 20 de dezembro, faz um breve apanhado cronológico sobre a tramitação do projeto nesta legislatura. O texto lembra o voto em separado apresentado por Benedito de Lira em 29 de junho pela aprovação do parecer de Ferraço, na forma de emenda substitutiva. No dia 6 do mês seguinte, o relatório foi definitivamente aprovado, por unanimidade, com a exclusão do dispositivo de Benedito, por iniciativa do próprio senador alagoano.
As objeções começam aí. “Escapando às regras da prática legislativa, o presidente da CCJ [Eunício Oliveira] designou, em 21 de setembro, não o senador Ricardo Ferraço, mas o senador Benedito de Lira para relatar a matéria do âmbito da comissão. Em 20 de setembro, já havia designado o senador Francisco Dornelles, que devolveu a relatoria, declinando da tarefa por ser membro do Conselho da FGV [Fundação Getúlio Vargas]”, diz trecho do texto conjunto de Ferraço e Suplicy, reprovando o fato de que a relatoria do projeto de reforma ter mudado de mãos, quando a praxe – e o bom senso – recomenda a continuidade da linha de procedimentos, sob o risco de desvirtuação dos propósitos da proposição.
Mas são dois os principais pontos de contestação do documento, contrapondo os relatórios de Ferraço e Benedito. Os senadores “denunciam” a criação de 64 cargos (17) e funções (47) comissionadas. “Há [em relação ao primeiro texto] um acréscimo de 17 cargos comissionados, sendo 7 SF-2 e 10 APSF-4, o que significa um aumento anual de R$ 1.498.341,26”, diz a primeira objeção afeita a questões orçamentárias.
“Há uma acréscimo de funções comissionadas, a saber 15 FC-3, 25 FC-2 e 7 FC-1; considerando que os valores são R$ 4.103,09 para FC-3, R$ 2.949,10 para FC-2 e R$ 1.175,10 para FC-1, tem-se um acréscimo anual de R$ 1.865.485,96”, acrescentam os senadores, que ainda elencam questões a ser “esclarecidas pelo relator” Benedito. “Por que a elevação da função comissionada do chefe de gabinete dos secretários-gerais, FC-2 (R$ 2.949,10) para FC-3 (R$ 4.103,09)? Quais são as justificativas para os acréscimos anuais citados acima, de R$ 1.498.341,26 e de R$ 1.865.485,96?”, questionam ainda Ferraço e Suplicy, sem conseguir respostas para suas perguntas.
Segundo o presidente da CCJ, os trabalhos da reforma serão retomados com prioridade em fevereiro. “Por que vieram reclamar comigo? Tinham de reclamar com o senador Pedro Simon, que pediu vistas da matéria. Não tive culpa, eu não podia desrespeitar o regimento”, defendeu-se Eunício Oliveira, em almoço com líderes peemedebistas realizado depois da reunião do colegiado em um restaurante do Senado, do qual participaram jornalistas que cobrem as atividades do Congresso e servidores das duas Casa legislativas.
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