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Sarney não esconde que é contra a atuação do CQC na sua proposta original – a sátira política, em que entrevistas com senadores, caracterizadas pelo humor escrachado, nem sempre são bem recebidas pelos entrevistados. Para o senador, pela quarta vez não consecutiva no comando do Senado, o CQC não faz um trabalho propriamente jornalístico e, por isso, não pode receber credencial permanente para entrar livremente, a qualquer instante, na Casa. Mesmo que alguns dos integrantes do programa tenham diploma de Jornalismo – a começar por Marcelo Tas, que comanda a trupe e tem longa carreira jornalística.
Mas o próprio regimento interno permite a atuação de produções como o CQC. O Ato da Mesa Diretora Nº 8 de 2010, que normatiza o processo de credenciamento, trata da possibilidade no capítulo “Da produção não jornalística”. O artigo 15 define três dias de antecedência para pedidos de credenciamento, que deve relatar “o conteúdo detalhado da produção e do pré-roteiro; a sua finalidade; a data e horário de sua realização; as dependências que serão utilizadas”, bem como a “cópia do RG, CPF, comprovante de residência e função dos profissionais que participarão da produção”. Formalidade que, em análise imediata, engessaria o formato do programa.
Mas, no artigo seguinte (16), o Senado avisa. “Verificado o descumprimento de um ou mais itens do artigo anterior, o primeiro-secretário poderá suspender a autorização da produção, até que se restabeleçam as condições originais do pedido”. Extra-oficialmente, a razão para o veto ao CQC foi o fato de que o credenciamento provisório concedido ao programa estava com prazo expirado, mas a equipe continuou fazendo uso dele. No entanto, os próprios integrantes do CQC lembram que, antes de o programa ganhar a visibilidade atual, bastava a identificação nos acessos à Casa, como qualquer cidadão, para adentrar as dependências.
Publicidade“A Mesa [Diretora] pediu mais tempo para examinar o requerimento. Pelo regimento, só jornalistas podem ser [permanentemente] credenciados. Se for uma produtora, ela tem de fazer um trabalho específico com data e hora marcados”, explicou ao Congresso em Foco o diretor da Secretaria de Comunicação do Senado, Fernando César Mesquita, acrescentando que não há data definida para a deliberação, que pode ser retomada na próxima reunião do colegiado. Ainda segundo o diretor, estão em exame questões como o limite de credenciais por veículo de comunicação – no caso, a TV Bandeirantes – e a admissão do trabalho de profissionais do CQC como jornalístico, uma vez que o Senado não o considera como tal.
Metade mais um
Há alguns meses, diante da disposição do Senado em negar o acesso, o programa resolveu colher assinaturas de apoio entre os próprios senadores. Aos poucos, a ideia foi dando certo, com a devida exploração bem-humorada nas edições dos programas, até que atingiu 43 adesões – nos moldes do regimento interno, mais do que o mínimo suficiente (metade mais um do total de 81 senadores) para a aprovação de determinados projetos legislativos. O ex-senador goiano Demóstenes Torres (ex-DEM), segundo na história a ser cassado na Casa, é um dos que assinam a lista. Antes da cassação, era presença constante no programa.
Mas nem o primeiro-secretário do Senado, Cícero Lucena (PSDB-PB), a quem cabe a autorização do credenciamento segundo “mérito, conveniência e oportunidade”, nem o quarto-secretário da Casa, Ciro Nogueira (PP-PI), encarregado do pedido do CQC na Mesa Diretora, estão entre os signatários do abaixo-assinado. Também recusaram assinar o “documento” nomes como o líder do PMDB, Renan Calheiros (AL), Romero Jucá (PMDB-RR), há até pouco tempo líder do governo no Senado, e, obviamente, José Sarney, três das principais lideranças da instituição – não por acaso, alvos constantes das entrevistas fortuitas antes corriqueiras no Salão Azul.
Muitas destas ocasiões evidenciam o desconforto de alguns senadores com a presença dos “homens de preto” do CQC. Em maio de 2005, o programa mostrou, com base em reportagem deste site, que oito dos 15 senadores do Conselho de Ética do Senado respondiam a processos no Supremo Tribunal Federal. Senadores com Roberto Requião (PMDB-PR), que também não assina a lista, e Renan Calheiros não gostaram nada abordagem do Custe o Que Custar – o nome do programa, menos conhecido do que a sigla.
A partir do oitavo minuto do vídeo abaixo, o tempo fechou entre Danilo Gentili, que ainda integrava a equipe do CQC, e Renan. E dentro do elevador privativo: “Nomear o senhor para o Conselho de Ética é como nomear o Fernandinho Beira-Mar para a Secretaria Anti-Drogas?”, indagou Danilo. Renan, potencial próximo presidente do Senado, emudeceu.
Assista ao vídeo:
“É uma minoria que não quer o CQC no Senado. Mas é uma minoria que tem muito poder, como Sarney, Renan e mais um ou dois, no máximo”, disse à reportagem um produtor de conteúdo do CQC, resguardando sua identidade para evitar problemas com o Senado. Ele disse que o programa teria conseguido mais assinaturas não fosse o problema de acesso à Casa, que impediram a coleta pessoalmente. “Uns seis senadores recusaram assinar. Se tivéssemos mais tempo, conseguiríamos muito mais.”
A assessoria do senador Ciro Nogueira disse que ele não é contra o acesso do CQC ao Senado, mas ressaltou que, para que este seja autorizado, é preciso que a Mesa Diretora delibere sobre o assunto e aprove o requerimento – que, por se tratar de credenciamento para “produção não jornalística”, e ainda pelas características do caso, recebeu a tramitação especial na Mesa. Na condição de quarto-secretário, argumenta, ele não pode atropelar a atribuição de seus pares.
Enquanto isso, o Plenário do Senado, onde a questão pode desembocar, vez ou outra registra depoimentos públicos de apoio ao pleito do CQC – como a que foi feita em meio às cadeiras azuis do palco legislativo por Randolfe Rodrigues (Psol-AP), que disputou com Sarney, em 2011, a Presidência da Casa. “Estou de acordo com a manifestação do senador Randolfe Rodrigues”, aparteou Eduardo Suplicy (PT-SP). “Endosso a posição dos senadores”, arrematou Ana Amélia (PP-RS), que presidia a sessão plenária na ocasião.
Confira o vídeo: