Preso em flagrante na noite dessa terça-feira (16) após atacar o Supremo Tribunal Federal (STF), Daniel Silveira (PSL-RJ) coleciona confusões desde antes de se eleger deputado federal em 2018, com quase 32 mil votos. Policial Militar do Rio de Janeiro entre 2012 e 2018, Silveira surfou na onda bolsonarista, com ataques aos direitos humanos, às instituições e à democracia. Aos 38 anos, forte e com quase dois metros de altura, o deputado não se impõe apenas pela condição física, mas também pela virulência verbal e de seus atos.
Durante a campanha eleitoral, ao lado do hoje deputado estadual Rodrigo Amorim (PSL), ele ficou conhecido nacionalmente ao quebrar uma placa que homenageava a vereadora Marielle Franco (Psol), assassinada no Rio em março de 2018. Investigado em dois inquéritos no Supremo Tribunal Federal, corte à qual fez os ataques que resultaram em sua prisão, Silveira é suspeito de promover atos contra a democracia e em defesa da intervenção militar e de participar de um esquema de propagação de notícias falsas, ao lado de outros colegas de partido.
Leia também
Professor de muay thai e defesa pessoal, Silveira trabalhou como PM por sete anos na Baixada Fluminense, uma das regiões mais violentas do país. “Matei o quê? Uns doze, por aí, mas dentro da legalidade, sempre em confronto”, disse o deputado à revista piauí.
Em outubro 2019, em seu primeiro ano de mandato, Daniel Silveira agrediu verbalmente o jornalista Guga Noblat e arremessou o celular do repórter contra o chão. “Arremessei. E aí irmão? Te bati, babaca. Vai no STF e me processa. Tu é um babaca, rapaz.” O parlamentar não gostou de ser questionado sobre o episódio em que quebrou a placa de Marielle e sobre a tentativa dele e de Amorim de “vistoriar”, por conta própria, o Colégio Dom Pedro II, um dos mais tradicionais do país. Naquele mesmo ano Silveira já tinha atacado publicamente jornalistas do site Azmina em razão de uma reportagem sobre aborto.
O deputado também virou alvo de processo por danos morais em 2019 após discutir com uma estudante de Direito, militante do Psol, em uma lanchonete em Petrópolis. Os dois trocaram cuspes. Depois de acusar Silveira de fascismo, Nayara Berdnasky foi chamada de “gorda”, “dragão de komodo”, “lhama cuspideira” e “aprendiz de Jean Wyllys” pelo parlamentar. “Foram opressões de todos os tipos: gordofobia, quando ele se refere a mim de forma pejorativa como uma mulher gorda; machismo, quando – incansavelmente – me chama de vagabunda; Fascismo, quando ele aproveita de sua condição de deputado federal para dizer: ‘Vamos ver quem manda aqui! Peça ajuda para a Marielle'”, relatou a estudante.
Os ataques ao Supremo que levaram Silveira à prisão não são inéditos. Em novembro de 2019, após o STF vetar a prisão em segunda instância, o deputado se dispôs a ajudar no fechamento do tribunal. “Se precisar de um cabo, estou à disposição”, escreveu, em referência à declaração de Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) de que não precisaria de muito para fechar o Supremo. “Se quiser fechar o STF, sabe o que você faz? Não manda nem um jipe. Manda um soldado e um cabo (…) Tira o poder da caneta da mão de um ministro do STF, o que ele é na rua?”, disse o filho deputado do presidente em 2018.
Daniel Silveira voltou a atacar o Supremo e o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em dezembro do ano passado. “O voto impresso vai acontecer ou então o STF e a Justiça Eleitoral não mais existirão porque a gente não vai permitir”, escreveu. O deputado ainda chamou os ministros do STF de marginais e afirmou que Luis Roberto Barroso, atual presidente do TSE, é “moleque”. A manifestação ocorreu após seguidas declarações de Jair Bolsonaro que, sem apresentar provas, afirma haver manipulações no resultado eleitoral.
PSL vai analisar expulsão de Daniel Silveira
O deputado também já se envolveu em polêmicas por causa da covid-19. No fim de janeiro, a GOL chamou a Polícia Federal para retirá-lo de uma aeronave por se recusar a usar máscara. No embarque de uma conexão, em São Paulo, ele apresentou um atestado médico que indicava a dispensa da máscara por dor de cabeça crônica. A companhia não aceitou a justificativa e acionou a PF após bate-boca entre funcionários e o deputado. Em vídeo publicado nas redes em que deu sua versão dos fatos, Silveira chamou o item de proteção de “focinheira ideológica”.
Em maio do ano passado, após ser repreendido em um supermercado por não usar máscara, ele disse que os cuidados com a covid-19 “idiotizam” as pessoas. “As pessoas não estão mais doentes. As pessoas não adoecem com o coronavírus, na verdade, ele idiotiza. O poder do coronavírus é idiotizar as pessoas”, afirmou em vídeo. “Cê (sic.) tá em casa, cê se tranca na porcaria da casa, sanitiza a casa toda, usa álcool 70, álcool 70 de hora em hora, bota luva, bota máscara, não respira mais nenhum tipo de microrganismo, não troca mais microrganismo, não tem contato social, você não pisa mais no chão de terra, você não faz mais nada”. Um mês depois, ele foi diagnosticado com covid-19.
O deputado foi preso em flagrante, no fim da noite dessa terça-feira (16), por determinação do ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre Moraes. Mais cedo, Silveira publicou um vídeo com ataques a ministros da corte, no qual defendia o fechamento do Supremo. Caberá ao plenário da Câmara decidir, no prazo de até 24 horas após a notificação, se mantém ou não o deputado preso.
“As manifestações do parlamentar Daniel Silveira, por meio das redes sociais, revelam-se gravíssimas, pois não só atingem a honorabilidade e constituem ameaça ilegal à segurança dos ministros do Supremo Tribunal Federal, como se revestem de claro intuito visando a impedir o exercício da judicatura, notadamente a independência do Poder Judiciário e a manutenção do Estado Democrático de Direito”, argumenta Moraes.
O ministro também determinou que o YouTube retire o vídeo da plataforma, sob pena de multa diária de R$ 100 mil em caso de descumprimento. Ao confirmar que a PF estava em sua casa, o deputado ainda provocou seus opositores. “Aos esquerdistas que estão comemorando, relaxem, tenho imunidade material. Só vou dormir fora de casa e provar para o Brasil quem são.”
Silveira afirma, no vídeo, que os 11 ministros do Supremo “não servem para p… nenhuma para esse país”, “não têm caráter, nem escrúpulo, nem moral”. “Vá lá, prende Villas Bôas. Seja homem uma vez na tua vida, vai lá e prende Villas Bôas. Seja homem uma vez na tua vida, vai lá e prende Villas Bôas. Fala pro Alexandre de Moraes, o homenzão, o f…, vai lá e manda ele prender o Villas Bôas. Vai lá e prende um general do Exército”, disse o deputado em referência ao ex-comandante do Exército que admitiu ter feito uma publicação nas redes para pressionar o Supremo a não soltar o ex-presidente Lula.
Preso em flagrante, deputado bolsonarista debocha: “Só vou dormir fora”