O Observatório Social de Brasília (OSBrasília) e o Instituto de Fiscalização e Controle (IFC), associações sem fins lucrativos que promovem a transparência e o controle social dos gastos públicos, lançaram nessa terça-feira (16), no Museu da República, a campanha “Câmara+Barata”, iniciativa popular e apartidária que pretende reduzir as despesas da Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF) e tornar as informações sobre a instituição mais transparentes para a população. O projeto conta com o apoio do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE), idealizador da Lei da Ficha Limpa. O presidente da CLDF, Joe Valle (PDT), também participou do ato, declarou apoio às medidas e foi um dos primeiros a assinar o anteprojeto.
No lançamento, o Observatório e o IFC apresentaram propostas que visam melhorar o custo-benefício das atividades da CLDF em três vertentes. A ideia é transformá-las no primeiro projeto de iniciativa popular do Distrito Federal. Para isso, é preciso reunir 20 mil assinaturas. A primeira medida sugerida mira o gasto com as chamadas verbas indenizatórias, que podem custear o aluguel e a manutenção de escritórios políticos, a compra de combustível, a divulgação da atividade parlamentar e a contratação de consultorias especializadas, entre outras despesas.
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Na Câmara Legislativa do DF, os 24 deputados distritais têm à disposição um valor mensal de R$ 25,3 mil, que podem ser gastos livremente pelos parlamentares. O benefício pode ser acumulado por até três meses. Caso não seja utilizado, o dinheiro volta aos cofres da Casa. O grande problema é que o gasto da CLDF com verbas indenizatórias é bastante elevado na comparação com a esfera federal e outras assembleias legislativas. No Senado, por exemplo, o recurso é de R$ 15 mil mensais. Mesmo assim, não são raros os casos de deputados distritais que gastam mais do que o limite mensal, além de denúncias quanto à má utilização do dinheiro.
“O que a gente propõe é a extinção dessa verba”, destacou o coordenador-geral do projeto “Câmara mais barata”, Guilherme Brandão. “É importante que se diga que não há nada de radical nisso. A assembleia do Rio de Janeiro já extinguiu essa verba, a assembleia do Espírito Santo também”, justificou.
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Diretor do Observatório Social, Brandão explicou que a economia gerada com o corte de gastos pode gerar benefícios a setores como saúde, educação e segurança. “A extinção dessa verba indenizatória pode representar uma economia de R$ 300 milhões por legislatura. R$ 300 milhões na saúde é o equivalente a 3.640 ambulâncias. Na educação, são 135 milhões de merendas. Na segurança, 5.851 novas viaturas”, exemplificou.
Alternativas
Pela proposta, mesmo com a extinção da verba indenizatória da forma como ela existe hoje, a verba para o exercício da atividade parlamentar ainda existiria, mas seria organizada de forma mais transparente e centralizada pela CLDF. O montante, por exemplo, deixaria de cobrir gastos com a instalação e manutenção de escritórios de apoio aos deputados, já que a estrutura do próprio Legislativo cumpre esse papel.
Despesas com o transporte de deputados e assessores, que inclui a locação de veículos e a aquisição de lubrificante e combustível, também sofreriam mudanças. Pelo texto, serão substituídas por compras conjuntas por meio de processos licitatórios, pelo uso de táxis e serviços operados por aplicativos móveis ou mesmo pelo transporte coletivo. No caso da contratação de consultoria e assessoria especializada, os serviços seriam prestados exclusivamente por servidores da CLDF.
A proposta também extingue os gastos relacionados à divulgação da atividade parlamentar, concentrando as contratações dentro da Casa. Segundo cálculo do Observatório Social, a adoção das medidas possibilitaria um gasto de apenas R$ 4.975,96 por deputado ao mês, uma economia de cerca de 20%.
Falta de transparência
A campanha “Câmara mais barata” também objetiva diminuir os gastos da CLDF com verbas de gabinete. Em média, cada um dos 24 deputados distritais poderia gastar cerca de R$ 230 mil por mês para a contratação de pessoal. A Câmara Federal não gasta sequer metade desse valor: são R$ 102 mil por mês para cada parlamentar cobrir os mesmos tipos de despesas. A proposta do Observatório Social de Brasília é equiparar o gasto da Casa com o de outras assembleias legislativas e o da Câmara dos Deputados. O novo valor mensal seria de R$ 76 mil, o que já representaria uma redução estimada em mais de R$ 48 milhões anuais.
Para a presidente do IFC, Jovita Rosa, falta transparência na divulgação dos dados. “A gente tem visto uma grande falta de transparência nesses gastos. Mesmo recebendo solicitações de esclarecimentos por ONGs e cidadãos, alguns deputados não esclarecem os gastos de forma apropriada. Isso favorece o risco de fraudes. É um tipo de manobra para que a gente não veja esse valor”, disse.
Ela acrescentou ainda que a Câmara Legislativa do DF é a mais cara do Brasil no quesito verba de gabinete. “A gente pode diminuir esse valor. Chegam até nós denúncias de assessores que não cumprem expediente, não aparecem para trabalhar, nepotismo cruzado e assessores que devolvem o salário para os deputados, essa é muito frequente. Quer dizer, continua a ineficiência, mesmo com tantos gastos e alto custo com assessoria”, avaliou.
Publicidade eficiente
Outro foco do projeto é a despesa com publicidade institucional. Em 2017, o orçamento inicial da CLDF previa R$ 25,9 milhões para o setor. Desse total, R$ 21,4 milhões foram empenhados (ou seja, sua execução foi assegurada). Guilherme Brandão comparou os gastos da Casa Legislativa do DF com os da Câmara dos Deputados. Isso porque, mesmo representando toda a população nacional e com 21 vezes mais deputados do que a CLDF, os gastos externos do Legislativo federal com propaganda institucional são inexistentes. Toda a produção e divulgação de publicidade da Casa é realizada por meio de seus órgãos internos, como a TV Câmara e perfis institucionais em redes sociais.
“Vejam o contraste. Enquanto a Câmara dos Deputados, que representa todo o Brasil, não gasta nada com publicidade, a nossa Câmara Legislativa vem gastando em média R$ 26 milhões ao ano”, apontou. “E se a gente pudesse, democraticamente, melhorar a imagem e o funcionamento da CLDF? Abrir a Câmara é a missão da iniciativa “Câmara mais barata”. E a solução que a gente encontrou é um projeto de lei de iniciativa popular. É um instrumento de cidadania”, acrescentou.
A proposta das duas ONGs é limitar os gastos em publicidade institucional da Câmara Legislativa do DF a 1% do orçamento anual previsto. Segundo esse padrão, considerando-se o orçamento de mais de R$ 492 milhões previsto para a CLDF em 2017, a despesa autorizada para publicidade ficaria em torno dos R$ 5 milhões. O cálculo do Observatório Social e do IFC é que a medida pode gerar uma economia de quase R$ 85 milhões por legislatura.
Apoio
O presidente da Câmara Legislativa, deputado Joe Valle (PDT), participou do lançamento do “Câmara mais barata” e também assinou o projeto de iniciativa popular. Aos presentes, ele detalhou as medidas de austeridade colocadas em prática pela gestão da CLDF em 2017, que conseguiram reduzir as despesas da Casa em 9,5%. Para esse ano, a meta é uma economia de 20%.
“Esse ano, tivemos uma economia de 22% do orçamento previsto em 2017. R$ 405 milhões foram executados. Temos feito um movimento em direção à um maior controle de gastos, e desde então tivemos o melhor resultado em responsabilidade fiscal desde o ano 2000. Esse processo de controle que fizemos também permitiu uma economia de 16,3% em relação a 2016 com verba indenizatória”, afirmou.
Em apoio à iniciativa, o presidente da CLDF disse ainda que um dos maiores objetivos da atual gestão é levar os cidadãos para dentro da Câmara. E prometeu: “Vamos fazer em fevereiro uma audiência pública para falar sobre a verba para publicidade”.