A Polícia Federal entregou nesta segunda-feira (19) ao Supremo Tribunal Federal (STF) um relatório preliminar sobre o inquérito aberto contra o presidente Michel Temer e um de seus mais próximos aliados, o ex-deputado Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR), preso desde 3 de junho. Ambos são investigados por corrupção passiva, organização criminosa e obstrução de Justiça depois de flagrados em filmagens e gravações de áudio viabilizadas na delação premiada de executivos do Grupo JBS. Temer tem negado as acusações e resolveu partir para o ataque contra os acusadores, anunciando ações judiciais antes de partir para viagem oficial à Rússia e à Noruega.
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O material apresentado pela PF ainda não foi divulgado pelo STF, mas informações obtidas pelo jornal Folha de S.Paulo dão conta de que seu conteúdo aponta ao menos a ocorrência de corrupção passiva. Ao encaminhar o conjunto probatório ao STF, os investigadores aproveitaram para pedir ao ministro Edson Fachin, relator da Operação Lava Jato no Supremo, mais cinco dias para completar a apuração e verificar se outros crimes foram cometidos. A expectativa é que também fique comprovada a acusação de obstrução de Justiça – há a suspeita de que o grupo de Temer tenha atuado para comprar o silêncio do deputado cassado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), preso desde outubro e condenado a mais de 15 anos de prisão por envolvimento no petrolão, e assim impedir uma eventual delação premiada do ex-cacique peemedebista.
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Nesse período, diz a PF, será concluída a perícia do diálogo que Joesley Batista, um dos donos da JBS, teve com Temer por volta das 23h de 7 de março no Palácio do Jaburu, sede da Vice-Presidência da República. Segundo o conteúdo da gravação, o encontro foi secreto, não constou da agenda oficial da Presidência da República e não serviu para tratar de qualquer assunto inerente ao exercício do mandato presidencial.
Os áudios em que Temer avaliza compra do silêncio de Cunha e infiltração de procurador na Lava Jato
PublicidadeSegundo o jornal paulista, ainda não está claro o papel de Temer e Loures nos crimes apontados. Reportagem veiculado há pouco no site do jornal paulista informa que o documento da PF é “conclusivo” em relação ao cometimento do crime de corrupção passiva.
Em uma das imagens que marcam a investigação, Rocha Loures foi filmado correndo com uma mala de R$ 500 mil – segundo o Ministério Público Federal (MPF), responsável pela ação coordenada dos flagrantes, com base em relatos de Ricardo Saud, executivo da JBS, trata-se da primeira de uma série de parcelas que, pagas semanalmente por mais de 20 anos, constituiriam uma espécie de aposentadoria para Temer e Loures. O dinheiro foi devolvido pelo ex-deputado com R$ 35 mil a menos, valor posteriormente resposto pelo investigado.
Atualizada no final da noite desta segunda-feira (19), a reportagem da Folha não obteve posicionamento da PF sobre o inquérito. Também as defesas de Temer e Rocha Loures não se manifestaram sobre a conclusão do inquérito. O Congresso em Foco veiculará as eventuais manifestações sobre o assunto tão logo elas sejam tornadas públicas.
Denúncia a caminho
A entrega do relatório preliminar da PF antecede a denúncia esperada nos próximos dias contra Temer e Rocha Loures por parte da Procuradoria-Geral da República (PGR). Hoje (segunda, 19), o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, disse que só analisaria o pedido de arquivamento das investigações feito pela defesa de Temer depois que a Polícia Federal concluísse definitivamente o inquérito. No requerimento de abertura de inquérito, Janot comunicou a Fachin que o presidente de fato avalizou a compra do silêncio de Cunha e um dos operadores do grupo criminoso, Lúcio Funaro, também preso no âmbito da Lava Jato.
Ainda segundo a reportagem do jornal paulista, a PF conseguiu esclarecer trechos dos áudios gravados por Joesley Batista antes inaudíveis. Para embasar a identificação de corrupção passiva, os investigadores utilizaram dois laudos periciais sobre o teor de conversas entre Rocha Loures e Ricardo Saud, que atuava como lobista da JBS. Temer é relacionado na investigação justamente ao roteiro referente ao episódio da mala de dinheiro recebida pelo ex-deputado.
Três elementos centrais configuram o envolvimento do presidente na questão dos repasses de dinheiro da JBS, segundo a força-tarefa formada por MPF e PF. O primeiro deles é o fato de que o próprio Loures agendou, em 6 de março deste ano, o encontro entre Temer e Joesley no dia seguinte, no Palácio do Jaburu. Nessa reunião secreta, o presidente disse ao empresário que ele poderia tratar qualquer assunto com o ex-deputado, pois gozava de sua inteira confiança.
Dias depois, como acabaria por revelar as ações coordenadas executadas pela PF, sob monitoramento do MPF, Loures e Saud se encontram em São Paulo e combinam os termos da entrega do dinheiro, posteriormente flagrada em filmagens constantes no relatório parcial levado a Fachin. Segundo a investigação, propina seria uma contrapartida pela defesa de interesses do Grupo J&F, controlador da JBS, junto ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade).
Cheque nominal
Na noite desta segunda-feira (20), quase no mesmo instante que a PF entregava seu relatório parcial ao STF, o canal fechado Globonews veiculou uma reportagem afirmando ter tido acesso a cópias de cheques da empreiteira OAS e da JBS – ambas enredadas no bilionário esquema de corrupção que saqueou a Petrobras –, de R$ 500 mil cada, movimentados na campanha eleitoral que reelegeria Temer na chapa com a ex-presidente Dilma Rousseff – a mesma chapa absolvida por quatro votos a três no Tribunal Superior Eleitoral, no polêmico julgamento concluído em 9 de junho, depois de quase quatro anos desde seu início, a pedido do PSDB.
Um dos cheques é fruto de propina e financiou, segundo o MPF, a campanha Henrique Eduardo Alves (PMDB) ao Governo do Rio Grande do Norte. Ex-presidente da Câmara, o peemedebista, que exerceu 11 mandatos como deputado federal, é apontado como um dos beneficiários de esquemas de corrupção comandados pelo grupo do partido que reunia, entre outros nomes, Cunha, Loures e o próprio Temer. Sob acusação de ter recebido suborno, Henrique Alves está preso desde 6 de junho, após diligências da Operação Manus, desdobramento da Lava Jato – apura corrupção ativa e passiva e lavagem de dinheiro na construção da Arena das Dunas, em Natal.
“Segundo o MPF, parte da propina paga a Henrique Alves veio da OAS. O dinheiro, entretanto, foi depositado não na conta de Henrique Alves, na época candidato do Governo do Rio Grande do Norte, mas sim na conta do então vice-presidente da República, Michel Temer. No pedido de prisão de Alves, o Ministério Público afirma que R$ 500 mil em propina passaram pela conta de Temer antes de chegarem ao Diretório Regional do PMDB no Rio Grande do Norte. Além dos R$ 500 mil vindos da OAS por meio de Temer, Henrique Alves também recebeu do então vice-presidente outros R$ 50 mil vindos da JBS. Nesse caso, entretanto não há manifestação do Ministério Público sobre se esse recursos seriam ilícitos ou não”, diz trecho da reportagem narrada por Natuza Nery, que a assina com o jornalista Léo Arcoverde (veja no vídeo).
“O complicado no caso do dinheiro vindo da OAS é porque a gente consegue mostrar que, de fato, a campanha do então candidato à reeleição na Vice-Presidência da República fez um cheque e o transferiu para a conta de Henrique Eduardo Alves […]. No caso da JBS, ainda não existe manifestação do Ministério Público sobre se esse dinheiro é ilícito ou não. Mas há, nos casos que nós vimos, um modus operandi muito parecido”, afirma a própria Natuza, em comentário após a exibição da reportagem. Ela acrescenta que o maior montante dos recursos de campanha de Temer (R$ 6 milhões) teve origem na JBS, enfraquecendo o discurso de que o governo não tinha uma relação estreita com o grupo empresarial.
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