Enquanto a população anseia pela punição severa de crimes cometidos pela classe política, na esteira da megainvestigação da Operação Lava Jato, membros do Congresso rumam na contramão do povo e tentam se salvar da maneira mais antirrepublicana, aprovando projetos e alterando legislações em vigor para salvar suas peles. Esta é uma das constatações do presidente da Associação Nacional de Peritos Criminais Federais (APCF), Marcos de Almeida Camargo, entidade que tem papel determinante na resolução de crimes em todas as esferas da administração pública. A APCF é uma das entidades parceiras do Diálogos Congresso em Foco 2, fórum de debates sobre os rumos do país a ser realizado neste mês de março, em Brasília (leia mais abaixo).
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“O grande receio que a gente tem é que todos esses episódios que nós temos visto, de combate à corrupção e da justiça sendo aplicada, com base em legislações em vigor, o grande receio que a gente tem é que aconteça uma reviravolta no sentido de fragilizar as legislações para facilitar determinados comportamentos ilegais, como ocorreu na Operação Mãos Limpas”, compara, mencionando a operação semelhante à Lava Jato executada na Itália, com milhares de agentes públicos presos ao final dos processos.
Marcos Camargo faz menção indireta a duas recentes tentativas do Congresso em aprovar projetos que reduzem a capacidade punitiva contra corruptos – a desfiguração promovida por deputados no pacote das dez medidas, que provocou a interferência do Supremo Tribunal Federal, e a proposição natimorta apresentada pelo líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), para blindar os presidentes da Câmara e do Senado de investigações no curso dos respectivos mandatos.
“O receio que a gente tem é, justamente, o de que tudo isso que a gente tem de positivo nesse processo [de combate à corrupção] seja utilizado para proteger ainda mais a corrupção – alterando ou impedindo legislações para que o que está acontecendo agora não venha mais a acontecer. O que a gente não quer que aconteça mais é a corrupção; o que a gente não quer que deixe de acontecer é que essas pessoas sejam punidas. Não podemos deixar prevalecer a impunidade”, completou o dirigente, com uma ressalva.
“Por outro lado, temos que ter a consciência de não entrarmos em um processo de punição severa de acusações infundadas. Temos que tomar cuidado para termos projetos de lei, legislações que, efetivamente, sejam capazes de punir os desvios, mas respeitando sempre o direito do contraditório, a questão da produção da prova. Às vezes, naquele afã de combater o crime a todo custo, muitas vezes a gente pode apresentar projetos que dificultem linhas de defesa e, de certa forma sejam autoritários, causando injustiças. Deve haver um equilíbrio nisso”, arrematou, com um voto de confiança nas instituições do país.
“A posição da APCF é ainda ter esperança nas instituições brasileiras. Acreditamos muito no trabalho da Polícia Federal, como no trabalho de todas as instituições que atuam nessa área de fiscalização, na área do processo legal – como o Ministério Público e o Judiciário, a própria Receita. Mais pontualmente, em relação ao trabalho da Polícia Federal, com o qual os nossos associados, peritos criminais federais, contribuem”, diz o presidente da APCF. “O que a gente pode fazer é continuar trabalhando e acreditando nas nossas instituições, para que todo esse processo generalizado seja resolvido, apurado, e que nós possamos, então, ter dias melhores”, acrescentou.
Para o perito federal, um dos entraves para o combate à corrupção é o próprio arcabouço de leis em vigência no país, algumas delas promulgadas há mais de 50 anos – a exemplo da própria Lei do Impeachment (nº 1.079), de 10 de abril de 1950. “Parte da dificuldade existe na fragilidade da legislação. A grande preocupação que a gente tem é com os instrumentos legais, para que a gente possa combater correta e adequadamente toda essa questão da corrupção. E, principalmente, não é só na questão do aprimoramento das legislações – que são fundamentais e, obviamente, temos todo o interesse em contribuir –, mas também no impedimento de que você tenha fragilização nas legislações”, observa, referindo-se às tentativas de setores do Congresso em desfigurar projetos que servem para endurecer o combate à práticas ilícitas, como no caso do pacote das dez medidas contra a corrupção.
Previdência
Para Marcos Camargo, a gestão de Michel Temer na Presidência da República não está preocupada com o conjunto da sociedade ao promover um pacote de ajuste das contas públicas. Marcos diz que a APCF vê com apreensão qualquer ação governamental de reforma que prive o público do processo decisório. “A APCF vê algumas dessas reformas com certa preocupação. Muitas delas têm um viés de atendimento a determinados setores da sociedade”, critica Marcos, para quem a reforma previdenciária foi concebida para favorecer interesses do setor econômico.
“E isso, muitas vezes, é feito sem o diálogo com o servidor e com outras pessoas interessadas no tema. A reforma da Previdência vai atingir a população como um todo, e não só os servidores, e a gente vê que muitas vezes todos esses processos são feitos sem o devido diálogo com as pessoas envolvidas, tirando da discussão pessoas que vão sentir na pele todo esse impacto”, acrescentou o perito.
Para Marcos Camargo, o governo age de maneira açodada para estancar problemas que poderiam ser levados à discussão ampla na sociedade. Nesse sentido, conclui o dirigente, os propósitos do Diálogos Congresso em Foco se tornam indispensáveis. “O Diálogos é um fórum extremamente importante e significativo para que possamos ampliar os debates, as discussões sobre políticas públicas, manter o assunto sempre em pauta. Para nós, é sempre um orgulho grande poder colaborar com vocês”, finaliza.
Diálogos
A APCF compõe a lista de instituições e entidades participantes do Diálogos Congresso em Foco 2, iniciativa que aposta na troca de ideias como caminho para o país sair da profunda crise em que se encontra. Em 2017, o fórum de discussões entra em seu segundo ano na expectativa de tratar de temas como a formação política da sociedade – e, nesse processo, o papel dos meios de comunicação –, medidas de combate à corrupção e ao desemprego, a gestão das finanças públicas etc.
Neste espaço, aberto à participação de todos, revezam-se questões consideradas cruciais para a superação dos entraves à retomada do crescimento econômico, ao aprimoramento da democracia e dos costumes políticos. Participe do debate, deixando registrada a sua opinião por meio de comentários em nosso site, na página do Diálogos no Facebook ou enviando suas contribuições em texto, vídeo ou áudio para o email dialogos@congressoemfoco.com.br.
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