Na cidade maravilhosa, no primeiro ano da década de 1960, nascia aquele que influenciaria gerações de brasileiros. Renato Russo, o Renato Manfredini Júnior da Dona Carminha, que veio ao mundo há 58 anos.
Brasília se tornou não apenas a casa de Renato, mas também o ponto de partida para a guinada estonteante percebida no rock nacional. Com Renato, veio à vida o Aborto, incubadora que geraria duas grandes bandas: Capital Inicial e a maior de todas e de todos os tempos, Legião Urbana.
Os pés calçados com coturnos dos “rebeldes” não eram exclusividade dos quarteis, que naquela época – estou falando do final dos anos 1970 e início dos 80 – produziam presidentes no país. Era dos governos militares, dos generais de dez estrelas que ficavam atrás da mesa com o “olho” na mão.
Mas foram eles, os “coturnados”, os “roupas-rasgadas”, que portavam a arma que atingiria em cheio os corações e mentes de toda uma geração de jovens – e até de outros não tão jovens assim. As canções de protesto contra a repressão, contra a corrupção, contra a violência, contra todos que eram contra qualquer coisa que fosse politicamente correta invadiam os lugares mais inesperados da capital brasileira.
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As espinhas vieram juntas com a vontade de vociferar ao mundo toda a revolta guardada contra o sistema social, econômico e político do país. O punk-rock tinha, de fato, chegado ao Brasil. Era muito mais que fitas cassetes com gravações dos Ramones ou Voidoids, ou mesmo o jeito “esquisito” de se vestir.
Plebe Rube, Aborto Elétrico, Cólera, AI-5 e tantas outras brandas surgiram das esquinas imaginárias de Brasília e chamavam a atenção de todos – para o bem e para o mal – com suas guitarras com doses cavalares de distorção, o inconfundível “bate-estaca” das baterias Pinguim, o contrabaixo tocado com semifusas confusas, mas não difusas, e as cantorias que revelavam letras carregadas de inconformismo e revolta.
De todas as bandas do movimento punk-rock candango sobressaiu um integrante, o jovem Renato, já recuperado de uma cirurgia no quadril, com enorme fluência no idioma inglês, que arriscou versos simples, mas ao mesmo tempo intrigantes que em pouco tempo dominariam o cenário musical brasileiro.
Hoje, 58 anos depois, não mais somos tão jovens assim. Eduardo, de cabelos grisalhos, curte sua recente aposentadoria do Banco Central ao lado dos netos, que brincam no jardim de sua casa no Lago Norte. Mônica não pinta mais o cabelo e o conhaque, agora, só aos finais de semana.
58 anos depois o mundo já não é mais o mesmo. Tudo mudou – e como mudou!
O rock e o punk foram empurrados para pequenos espaços pela indústria financeira da música. Aliás, música que não se mensura mais pela qualidade, mas sim por cifras – eu não estou falando das cifras que encontrávamos nas revistinhas que sempre traziam canções que nos ajudavam a aumentar o repertório e conquistar as meninas e quem mais se queria ter.
Mas como disse, tudo mudou. Infelizmente não surgiram novas Carminhas para darem à luz a novos Renatos, nem outras mães que pudessem gerar novos Dados, novos Marcelos, novos Philippes Seabras, novos Feijões, novos Dinhos, novos Andrés-X, novos Janders, novos Felipes e Flávios.
No aniversário de Renato Russo, o poeta maior do rock nacional (me desculpem os Cazuzistas. Também gosto das canções dele, mas…), por mais merecidos que sejam todas as palmas e sorrisos a ele direcionadas, tenho a triste certeza de que a melhor fase da música brasileira foi cremada juntamente com ele, isso há doze anos.
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