José Marciano Monteiro *
A escolha do lema “Ordem e Progresso” escrito na bandeira brasileira como slogan do governo ilegítimo não foi aleatória. O golpe se vestiu e teve cor e cara. O golpe se vestiu com o traje da camisa da CBF (Confederação Brasileira de Futebol) e com a bandeira do Brasil, símbolos da unidade nacional. Antes do ritual que promoveria a ruptura institucional, a cara do golpe se materializou na iludida classe média. Aquela que bateu panelas nas varandas gourmet e desfilou, com cães enrolados na bandeira do Brasil, pelas principais avenidas deste país, com especial destaque para a Avenida Paulista, dizendo-se ser hipocritamente contra a corrupção. Após a ruptura, embora a corrupção tenha permanecido, fez-se sentir o silêncio das panelas. Estas deixaram de ser instrumento de protestos. Elas voltaram para seus lugares, de onde não deveriam ter sequer saído, pois não protestavam contra a corrupção, mas, eram movidas pelo ódio que lhes causam as minorias. O Brasil de 2017 não é o Brasil de 2016, e nem o país dos anos anteriores. É o país da “ordem e do progresso”. A questão que se coloca é: para quem deve ser a ordem e quem terá progresso numa sociedade em que desigualdades e injustiças caminham de braços dados?
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O Brasil não é mais aquele país em que seus filhos tinham orgulho de ser brasileiros. País que demonstrou ao mundo, há bem pouco tempo, que qualquer cidadão, independente da classe social, tinha a possibilidade de sonhar por dias melhores. O Brasil do sonho se transformou, após o golpe institucional, em país do pesadelo. O preço de sonhar por um país mais justo e igualitário se tornou caro, principalmente para a classe trabalhadora. O preço do sonho está sendo pago com juros e correção monetária, com cortes nos direitos e aumento da repressão. O lema deste governo é desastre e retrocesso, travestido de “ordem” e “progresso”. O país está governado por plutocratas e cleptocratas que não se cansam de sugar, como se morcegos fossem, a riqueza nacional. É um país em que a ordem, como lema, se transforma em instrumento de força e de contenção das lutas por direitos.
E o progresso? Este que ainda está por vir, embalado pelo sonho positivista, só se concretizou para os representantes das oligarquias financeiras, nacionalmente representados pela Febraran (Federação Brasileira de Bancos) e a Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo). Enquanto isso, o povo brasileiro assiste ao teatro da corrupção nas principais instituições da corroída “República”. Esta jovem, que de tão pouca idade, foi iludida por uma velharia que tem como sexo o poder e que gozam do povo brasileiro. O enredo da ordem e do progresso se transformou em desastre e retrocessos. Desastres? Sim. Isto mesmo: desastres. Desastres no social com cortes nos direitos, por meio das contrarreformas, e de uma agenda que tende a reforçar as desigualdades e conduzir milhões de pessoas para a condição de miseráveis. Plutocratas, sem a mínima vergonha na cara, que têm debochado da população e pautado interesses privados, na casa que, até bem pouco tempo, dizia-se ser do povo.
Este é o Brasil. País em que governantes assistem as desigualdades baterem nas portas dos mais necessitados, vangloriando-se por conter a inflação, às custas de milhões de desempregados. É o país em que os pés, dos que deveriam representar o povo, estão atolados no lamaçal da corrupção; mesmo, assim, vestem-se com ternos do cinismo, emplacando reformas que deformarão ainda mais os mais pobres. É o país em que as portas da Justiça se abrem para o poder político de forma escancarada e se fecham para os que clamam por direitos. É o país em que juízes teatralizam votos fundamentados em juridiquês que mais se assemelham a arrogância de quem goza com o poder de saber que não promove justiça, mas que alimentam privilégios com suas decisões. País em que, no $TF, maior corte de (in)justiça do Brasil, desconsidera o teto para si, tornando o céu o limite de seus vencimentos, mesmo sabendo que muitos ainda lutam pelo piso e por salários mínimos. País em que políticos têm juízes-defensores nas cortes, que mais se parecem advogados, quando nestas deveriam ser o locus das decisões fundamentadas nas decisões jurídicas com base nos autos e não em convicções políticas. É a podridão de uma “República” que não se republicanizou; de uma “República” no papel, escrita na realidade no caderno das injustiças.
Publicidade* Filósofo e sociólogo, é professor da Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), na Paraíba.
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