Silvia Alencar *
A movimentação nos portos brasileiros, por onde é escoado mais de 90% do comércio internacional, deverá crescer a taxas superiores a 5,7% nos próximos 18 anos. De acordo com estimativas da Secretaria de Portos da Presidência da República (SEP), até 2030 a movimentação nos terminais portuários será duas vezes e meia superior à registrada atualmente. Em dois anos, segundo a SEP, a capacidade de movimentação de cargas dos portos nacionais, que é de 370 milhões de toneladas, estará esgotada. Já para 2015, a previsão é de um resultado superior a 373 milhões de toneladas.
Para atender a esta demanda, que está diretamente ligada à manutenção e às previsões de crescimento econômico do país, o governo federal tem adotado medidas acertadas ao ampliar investimentos em projetos de infraestrutura e propor alterações no marco legal que rege a atividade portuária. No ano passado, o Executivo deu início a um programa para modernizar a gestão dos portos, atrair a iniciativa privada e, ao mesmo tempo, reduzir custos e aumentar a produtividade deste setor.
Uma das principais iniciativas é o Programa de Investimentos em Logística com foco nas ferrovias e na área portuária. São aproximadamente R$ 54,2 bilhões destinados a investimentos e arrendamentos de Terminais de Uso Privado (TUPs). Desse total, R$ 31 bilhões devem ser aplicados no biênio 2014/2015 e R$ 23,2 bilhões entre 2016/2017. O programa prevê também mais R$ 2,6 bilhões para investimentos em acessos hidroviários, rodoviários, ferroviários e em pátios de regularização de tráfego nos 18 principais portos públicos brasileiros. Outra parte significativa de recursos está em execução por meio do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC 2).
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Mudanças também estão previstas na Medida Provisória nº 595, que estabelece um novo marco regulatório para o setor portuário nacional. Até 2017, o Executivo deve licitar 159 áreas para terminais portuários, sendo 42 para novos arrendamentos. Uma das principais mudanças previstas na chamada MP dos Portos é a eliminação da diferença entre carga própria e de terceiro, possibilitando aos terminais utilizar plenamente sua capacidade, além de estimular a competição entre os operadores do setor.
No entanto, em meio a tamanha euforia, somos obrigados a chamar a atenção para o descompasso entre as projeções de determinados setores do governo e a realidade atual. Quem lida diariamente com o comércio internacional no Brasil sabe bem das limitações que existem hoje em órgãos públicos, em especial na Receita Federal do Brasil (RFB), e os entraves que a falta de servidores e de infraestrutura na Aduana brasileira causam ao país. A Receita Federal, a cada dia que passa, reduz sua presença nesses mesmos locais.
PublicidadeEm recente nota técnica, a Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan) mostrou que nos principais portos do mundo, como: Shanghai (China), Rotterdam (Holanda), Busan (Coreia do Sul), Los Angeles (Estados Unidos), as entidades anuentes mantêm o mesmo ritmo de funcionamento dos terminais, ou seja, operam 24 horas. Já no Brasil, a Receita Federal só funciona em dias úteis e no horário comercial, muitas vezes com parada para almoço. Essa realidade pode ser observada em portos como Santos, Rio de Janeiro, Paranaguá, Suape, Pecém; em terminais importantes como Manaus e Rio Grande e outros pontos de fronteira.
A situação é ainda pior. Nos poucos terminais em que ainda há o chamado plantão aduaneiro, realizados em portos, aeroportos e outros pontos de fronteira seca, o número de servidores está diminuindo, o volume de serviço cresce e os serviços não funcionam da forma plena e uniformizada.
Devido à falta de servidores e, principalmente, à ausência de definição das atribuições do analista-tributário em lei, procedimentos essenciais como a admissão temporária de veículos e embarcações, o desembaraço simplificado de importação e exportação, o desembaraço das declarações de bagagem acompanhada (DBA), de declaração de porte de valores (DPV) e outras atividades que são realizadas pelo analista-tributário só podem ser finalizadas por um auditor-fiscal. Ou seja, são necessários dois servidores para executar e finalizar a mesma atividade, o que gera morosidade e duplicidade de trabalho.
Em algumas unidades, essas atividades são realizadas por analistas-tributários, em outros pontos são privativos do auditor. Todas essas falhas de gestão, cometidas pela Receita Federal, têm como pano de fundo a insistente política corporativista de seus administradores, mas que ao final acabam por atrasar a liberação das cargas gerando custos extras para importadores e exportadores.
A Aduana deve prestar todos os serviços 24 horas, sem interrupção. O atendimento ao turista, o controle e a liberação de mercadorias, as ações de vigilância, fiscalização e repressão. O fato é que se torna cada vez mais escassa a presença dos servidores da Receita Federal em diversas ações como de vigilância portuária, que é uma atividade imprescindível ao controle das operações realizadas em terminais, especialmente durante o período noturno.
É neste contexto que o Sindicato Nacional dos Analistas-Tributários da Receita Federal do Brasil (Sindireceita) inicia uma mobilização em favor da extensão do horário de funcionamento dos serviços prestados pela Receita Federal do Brasil em unidades de fronteira terrestre, portos, portos secos, aeroportos e demais locais onde são realizadas ações de controle do comércio internacional, fiscalização, repressão e vigilância aduaneiros.
* É presidente do Sindicato Nacional dos Analistas-Tributários da Receita Federal do Brasil (Sindireceita).
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