Até a palavra aborto foi retirada das últimas declarações da presidenciável petista Dilma Roussef. Para tentar afastá-la da polêmica com o eleitorado religioso, a candidata foi orientada a apenas reforçar em seus discursos que é pela defesa e valorização da vida.
Nada de dizer que aborto é questão de saúde pública ou que a legislação atual deve ser mantida, como já falou na semana passada. O termo aborto deve ser eliminado.
Na Secretaria Nacional de Mulheres do PT, também foi decretado o silêncio sobre o tema. A secretária Laisy Moriere informou, por meio da assessoria, que não vai falar sobre o assunto.
Na verdade, se falar, ela corre o risco de deixar a campanha de sua candidata Dilma ainda mais enrolada em contradições. Porque as resoluções do PT deixam claro seu posicionamento favorável à prática do aborto.
A resolução do terceiro Congresso do PT diz que o partido vai trabalhar pela “defesa da autodeterminação das mulheres, da descriminalização do aborto e regulamentação do atendimento a todos os casos no serviço público evitando assim a gravidez não desejada e a morte de centenas de mulheres, na sua maioria pobres e negras, em decorrência do aborto clandestino e da falta de responsabilidade do Estado no atendimento adequado às mulheres que assim optarem.”
Então, a secretária calou.
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Mas também não é a primeira vez que o tema obriga integrantes da legenda a ficarem mudos. Só que tudo depende do interesse do momento.
No ano passado, por exemplo, o diretório nacional do PT suspendeu os direitos partidários dos deputados federais Luiz Bassuma (BA) e Henrique Afonso (AC). Naquele momento, eles enfrentaram processo no conselho de ética da legenda, porque fizeram campanha contra o aborto, contrariando o que determinava a resolução do partido.
Bassuma, indignado, trocou de legenda. Foi para o PV. Hoje eu conversei com ele. Olha o que ele acha dessas contradições no PT: “Todo dia é uma contradição. Dilma era, assim como o PT, a favor da legalização do aborto. Cada vez que fala do assunto, ela fala de um jeito diferente. Ela tinha de falar a verdade para o povo brasileiro. Que ela é a favor da legalização, assim como o PT é. Mentir nesse momento, tentar enganar o povo para ganhar uma eleição, isso é muito feio”.
A verdade é que antes de ser candidata, no entanto, Dilma defendia abertamente a descriminalização do aborto. Fez inclusive declarações públicas, em sabatina do jornal Folha de S. Paulo em 2007 e em entrevista em 2009 à revista Marie Claire.
Outro episódio de silêncio foi no programa de governo da petista. Na primeira versão protocolada no TSE, o assunto já era tratado de forma velada, disfarçada.
O documento registrado no dia 5 de julho passado dizia que “o Estado brasileiro reafirmará o direito das mulheres de tomarem suas próprias decisões em assuntos que afetam seu corpo e sua saúde”.
Mas, na seqüência, prevendo a polêmica, o programa foi substituído, e até essa expressão foi retirada. Agora, na página do PT, o presidente do partido, José Eduardo Dutra, diz que a questão de aborto nunca esteve no programa de governo da Dilma.
* Roseann Kennedy é comentarista da CBN. De segunda a sexta, escreve esta coluna para o Congresso em Foco
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