Erich Decat
Relatório aprovado por uma subcomissão especial da Câmara propõe uma série de mudanças para tornar mais transparente o processo de outorga e renovação das concessões de rádio e TV. As alterações devem provocar debates acalorados na Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática (CCTCI) da Casa, à qual o colegiado é subordinado, assim que os parlamentares voltarem do recesso, em fevereiro.
Entre as recomendações em análise, está uma proposta de emenda constitucional (PEC) que dá maior autonomia ao Ministério da Comunicação para cassar, antes do término do contrato, a permissão de emissoras que tenham cometido irregularidades. Hoje o Executivo depende de decisão judicial para retomar a concessão antes do vencimento do prazo legal.
A subcomissão também quer revogar o dispositivo da Constituição que torna praticamente impossível a não renovação de uma concessão de rádio e TV. É que o artigo 223 estabelece que o contrato só não será renovado se essa for a vontade de dois quintos dos deputados (205 dos 513) e senadores (32 dos 81), em votação nominal, durante sessão conjunta do Congresso Nacional. Isso jamais aconteceu.
"Em nossa avaliação, o caráter público da atividade de radiodifusão não justifica a preservação dessa norma, sobretudo porque nenhuma outra espécie de prestador de serviço público dispõe dessa prerrogativa", observa a deputada Maria do Carmo Lara (PT-MG), relatora da subcomissão. Veja as principais mudanças propostas
Parlamentares concessionários
Mas a mudança constitucional que deve enfrentar maior resistência entre os parlamentares é a que proíbe, expressamente, os detentores de cargo público de serem proprietários, controladores, diretores ou gerentes de emissoras de rádio ou TV.
Apesar de o artigo 54 da Constituição proibir deputados e senadores, desde a expedição do diploma, de "firmar ou manter contrato com pessoa jurídica de direito público, autarquia, empresa pública, sociedade de economia mista ou empresa concessionária de serviço público", a prática é comum entre os parlamentares. A PEC sugerida pela subcomissão estende essa proibição para todos os ocupantes de cargos públicos.
Como revelou este site em março deste ano, um em cada cinco deputados da CCTCI tem ligações com emissoras de rádio ou TV. Dos 76 membros (titulares e suplentes) do colegiado, que tem o poder de analisar e aprovar projetos de outorga e renovação das concessões dos serviços de radiodifusão, 16 mantêm relações diretas ou indiretas com veículos de comunicação (leia mais).
Mais transparência
Segundo Maria do Carmo, as mudanças pretendem aperfeiçoar a legislação do setor. "Fizemos um diagnóstico da situação e o objetivo é dar maior transparência para os atos internos que tangem essa questão", explicou ao Congresso em Foco.
Para tornar o processo de outorga menos burocrático, a subcomissão defende que o Ministério das Comunicações diminua o número de documentos exigidos para expedição dos atos de outorga e renovação das concessões. O relatório de Maria do Carmo, aprovado semana passada, também recomenda o fim da duplicidade entre as tarefas executadas pelo ministério e a Casa Civil no exame dos processos de radiodifusão. Veja a íntegra do relatório
O deputado Paulo Henrique Lustosa (PMDB-CE), por exemplo, culpa a morosidade do Ministério das Comunicações na avaliação dos processos de outorga pelo aparecimento do seu nome na lista dos detentores de emissora de rádio. "Essa rádio realmente pertenceu ao meu pai, mas há sete anos ela foi vendida. Desde então, a concessão não foi passada para os novos proprietários", alega o deputado.
Fora da lei
Apesar da crítica, Lustosa se diz contrário à criação das regras propostas pela subcomissão. "Criando barreiras para burocratizar corre-se o risco de facilitar o surgimento de alternativas que estejam fora da lei. Por exemplo, proibir a concessão para parentes não vai adiantar porque já existem pessoas que fazem isso hoje à margem da lei", avalia.
A sugestão do deputado, que também integra a Comissão de Ciência e Tecnologia, é melhorar o aparelhamento das instituições responsáveis pela fiscalização das rádios e TVs. "O ministério não consegue analisar todos os processos. Não é uma critica ao ministério, mas a toda a estrutura, que é muito precária", ressalta.
"Acredito que a melhor forma de melhorar é destinar de forma efetiva os recursos do Fistel [ Fundo de Fiscalização das Telecomunicações] para a Anatel [Agência Nacional de Telecomunicação] para, a partir, daí ampliar a fiscalização. Precisamos do fortalecimento da agência", reivindica.
Com um caixa anual de R$ 3 bilhões, o Fistel é alimentado por taxas cobradas das operadoras de telecomunicações para, teoricamente, ser usado pela Anatel na fiscalização das empresas da área.
Fiscalização
A avaliação de Lustosa, no entanto, não é compartilhada com o ex-ministro das Comunicações e deputado Eunício Oliveira (PMDB-CE) que acredita que o problema da Anatel não é falta de recursos.
"A Anatel tem que cumprir o papel dela. Ela tem autonomia e tem poder. E não faltam verbas. Prova disso é o prédio que eles têm aqui no meu estado", disse o deputado, que não poupou críticas à entidade. "O maior exemplo da falta de atuação da Anatel é o caso de um jornalista que tem nove concessões de rádios educativas aqui no meu estado", reclama.
Também integrante da Comissão de Ciência e Tecnologia, o ex-ministro já foi acusado de ter ligações com a rádio comunitária ELO, em Lavras de Manga
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