Gilberto Rodrigues *
Jerusalém é uma cidade de muitas emoções. Sentimentos contraditórios ali confluem. As paixões religiosas e o amor a Ele, seja qual for a fé, estão impressos nas ruelas, no chão, nas paredes, nos muros. O Santo Sepulcro e a Via Crucis, dois locais sagrados e icônicos para o Cristianismo, estão próximos das igrejas cristãs, como a Ortodoxa e a Católica Romana, e se avizinham da Mesquita do Domo Dourado, local de adoração islâmica, que se limita com o Muro das Lamentações, onde o Judaísmo se pratica com fervor.
Nesse ambiente impregnado de histórias e imagens transcendentes, embebido de elevação espiritual, paira uma forte tensão no ar. Jerusalém é o pomo de discórdia do conflito entre palestinos e israelenses. Local sagrado para as três religiões monoteístas (Cristianismo, Judaísmo e Islamismo), para numerosos povos além dos palestinos e judeus, a cidade também é símbolo da grande possibilidade de uma convivência harmoniosa e ecumênica. Assim defendem alguns otimistas, talvez utópicos, mas prudentes articuladores e negociadores da paz no Oriente Médio.
Entrando nesse cenário de delicada tessitura política e diplomática, Roberto Carlos, o Rei Roberto, consagrado compositor e cantor brasileiro, admirado na América Latina, fez um show em Jerusalém. Seu périplo pela Terra Santa tem ares de visita de Estado: incluiu uma reunião com o presidente israelense, Shimon Perez, Prêmio Nobel da Paz, e sessão de fotos, tendo como pano de fundo as bandeiras brasileira e de Israel.
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É interessante analisar o momento desse show. O governo de Israel está hiperpressionado pelo movimento das autoridades palestinas em obter o reconhecimento de seu Estado na Organização das Nações Unidas. Tão logo se inicie a sessão anual da Assembleia Geral da ONU, em 20 de setembro, a Autoridade Nacional Palestina pedirá o reconhecimento do Estado. Será uma avalanche de votos a favor; e meia dúzia e pouco de votos em apoio a Israel, dentre eles o dos Estados Unidos, que podem vetar o pedido no Conselho de Segurança.
Onde entra o Brasil nesse processo? Primeiro país da região a declarar apoio à pretensão palestina, o Brasil causou mal-estar no governo de Israel, mas a nossa diplomacia não quer ser vista como partidária; quer atuar como mediadora do processo. O show de Roberto entra nesse jogo como diplomacia cidadã, agregando valor e carisma ao governo desgastado do primeiro-ministro Netanyahu. É um presente do Brasil ao processo de paz, manifestação do soft power brasileiro: “Para viver esse momento lindo…”.
Publicidade* PhD, professor do curso de Relações Internacionais da Faculdade Santa Marcelina e ex-professor visitante na Universidade de Notre Dame (EUA).
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