Lúcio Lambranho
Enviado especial a Corrente (PI) e Avelino Lopes (PI)
Neisandro desmaiou com a pancada. Quando conseguiu abrir os olhos, viu o irmão morto embaixo das sacas de feijão. Minutos antes de o caminhão capotar três vezes enquanto despencava no buraco de 15 metros de “fundura”, ele contrariara o irmão mais velho.
Havia sentado em outro canto da carroceria do pau-de-arara. Ouvia rádio com o amigo Edvan quando a montanha de feijão soterrou o lugar onde havia deixado Delson, seu irmão, um pouco antes do início do segundo ato dessa tragédia.
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“Foi Deus quem me ajudou”, afirma Neisandro quando explica o episódio. Mais de 12 anos depois, ainda sente fortes dores no peito e na perna esquerda, enfermidades que tiraram o rapaz do serviço pesado na roça. Precisa ir para a cama quando faz esforço e não agüenta mais ficar na lida nem por poucas horas. Leia também Publicidade
A morte de Delson, em outubro 1995, e as seqüelas de Neisandro só aumentaram a necessidade da família de 12 filhos, de seu Nestor e dona Caetana. Publicidade |
Eles vivem com apenas um salário mínimo – a aposentadoria do pai, que ainda continua trabalhando – e com o que colhem da roça de apenas oito hectares na localidade de Barra do Rio, em Corrente, sul do Piauí.
Justamente porque precisavam botar o dinheiro da comida em casa que Neisandro, o irmão e outros 77 trabalhadores rurais da região foram parar na Fazenda Porto Alegre, em Bom Jesus da Lapa, Bahia, distante quase 500 quilômetros de suas famílias. Eles saíram com esse destino 40 dias antes de o caminhão tombar.
Na fazenda, o primeiro ato da tragédia ainda atual de suas vidas: passaram fome e frio sob as barracas de lona e, durante um mês e dez dias, não puderam sair do mato. Volta e meia, os seguranças atiravam perto da barraca para mostrar quem mandava.
O isolamento da cidade, perdida a mais de 15 quilômetros, e o medo prenderam todos na lama do lugar. Ninguém tentou fugir, apesar da vontade e das humilhações diárias a que eram submetidos.
Também não havia nenhum equipamento de proteção para lidar com a cata do feijão, tarefa para a qual haviam sido contratados. Trabalhavam descalços, mesmo com as cobras cascavéis que rondavam o acampamento.
Quase sempre sob sol forte, eles catavam pelo menos um hectare do legume por dia, mas só podiam comer arroz e esse mesmo feijão que colhiam. A mistura só tinha sal e óleo de soja. A comida saía da saca suja direto para a panela.
Na venda da fazenda, tinha do “bom e do melhor”, mas era caro demais para o bolso deles. Quem se arriscasse a comprar qualquer coisa corria o risco de voltar para casa sem nada ou devendo, e, certamente, seria obrigado a ficar mais tempo até pagar a servidão por dívidas imposta pelo patrão. Para completar o desespero de todos, a água de beber era a de um canal do Rio São Francisco, o mesmo que eles usavam também como banheiro.
Barra da saia
Franzino e com apenas 13 anos na época, Neisandro Batista do Lago pegou o caminhão da agonia, tamanha a situação precária da família, para trabalhar na Bahia junto com o irmão, Delson Júnior Batista de Souza, morto aos 22 anos, soterrado pelas sacas de feijão que ambos haviam ajudado a colher.
Fotos: Lúcio Lambranho/Congresso em Foco
Luziano, também filho de seu Nestor (foto), quase foi junto. A mãe Caetana teve que brigar para segurar o filho pequeno em casa. Ainda hoje, ela se lembra, com os olhos cheios d’água, da luta que salvou o garoto do acidente e da escravidão na fazenda.
Dona Caetana foi xingada pelo aliciador contratado pelo capataz da fazenda. O “gato” – nome dado pra quem leva gente, principalmente do Norte e do Nordeste, para trabalhar em condição semelhante à de escravidão em fazendas Brasil afora – disse: “Esse menino já não precisa mais da barra da saia da mãe”.
O filho de dona Caetana tinha só dez anos. Os “gatos”, ainda hoje, aplicam a lei da demanda de braços baratos para a colheita ou plantio em meio à miséria de quem não tem o que comer nessa região do Piauí.
Carga cruel
Da volta para casa, além das barrigas vazias e da frustração, a maioria dos trabalhadores não levava praticamente nada. Menos de dois meses antes, o prometido era outro: comida por conta do patrão e oferta de dias melhores. Mas ficou só na promessa.
Sob a poeira do sertão baiano, 79 trabalhadores subiram no caminhão que os devolveria aos municípios de Corrente e Avelino Lopes, também no sul do Piauí, em 22 de outubro de 1995, data em que o sofrimento dobrado bateu na porta de suas famílias, marcadas ainda hoje pelo aliciamento de trabalhadores escravos.
Entre os que sobreviveram para contar essa história, persistem relatos a respeito de “gatos” que continuam, quase 13 anos depois, a rondar e a cooptar para o mesmo drama os mais pobres das duas cidades.
Voltando ao fatídico dia: só depois de carregar umas 20 sacas de feijão para dentro do caminhão amarelo, os trabalhadores puderam subir na carroceria, onde tiveram de se acomodar, acocorados, em cima da carga.
Em Barreiras, 262 quilômetros depois, foram obrigados a carregar mais sacas e ganharam, na soma dos dois embarques, a companhia de 105 fardos de 60 quilos de feijão.
Lá pelas 2h30min da madrugada, uma subida na BR-135, na altura de Rochedo, localidade de Formosa do Rio Preto (BA), venceu o motorista, Pedro Gonçalves de Araújo.
Ele tentou engatar uma marcha mais forte para subir o trecho íngreme por duas vezes, mas não conseguiu. O câmbio quebrou e, sem que os freios dessem mais conta do peso excessivo, o caminhão caiu para trás no vazio. Apenas 12 metros separavam o ponto onde Pedro perdeu o controle das marchas e a entrada do precipício.
Rio de sangue
Morreram 14 catadores de feijão, a maioria de politraumatismo ou traumatismos de tórax, crânio e face. O buraco era uma armadilha para qualquer carro que caísse na estrada, naquela época, de chão batido. Mas a carga, que seria vendida em Corrente, misturada com gente, foi ainda mais cruel para os catadores de feijão.
Quinze pessoas ficaram com lesões graves, grande parte delas não consegue mais trabalhar ou não dispõe mais das mesmas condições de trabalho de antes.
No boletim de ocorrência da polícia baiana, as sacas de feijão foram descritas e quantificadas precisamente no papel antes da contagem dos mortos e dos feridos.
Ao contrário da precisão dada para a carga, erros de datilografia nos nomes e nas idades das vítimas ainda atormentam a vida das famílias. Elas precisam ter paciência diante da burocracia cada vez que vão retirar novos documentos e se batem com os dados errados grafados pela polícia.
No acanhado posto de saúde, hoje um hospital, em Formosa do Rio Preto, os médicos não tinham muito o que fazer para salvar os feridos mais graves. Não se sabe quantos dos 14 mortos perderam suas vidas no local da queda ou depois do atendimento improvisado.
Por isso, o acidente também marcou Walter Oliveira, um dos médicos convocados para atender os feridos graves. “Foi muito ruim, pois como médico sabia que podia ajudar, mas não havia o equipamento necessário. Hoje posso apenas dar esse depoimento para confortar as famílias das pessoas que não consegui salvar”, lamenta.
A notícia da tragédia correu da Bahia, pelo rádio, até chegar ao sul do Piauí. Os moradores de Formosa do Rio Preto ficaram chocados quando testemunharam a lavagem dos corpos no posto médico da prefeitura. A água, misturada com sangue, seguia pela sarjeta da rua principal até cair no rio que margeia e dá nome à cidade.
O mapa da tragédia
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O traçado vermelho mostra o caminho que os trabalhadores percorreriam, de Bom Jesus da Lapa (BA) a Corrente (PI), antes de terem o destino alterado pelo acidente ocorrido em Formosa do Rio Preto (BA), em outubro de 1995. |
“São mais importantes as sacas de feijão”
No primeiro dia de trabalho na Fazenda Porto Alegre, Neisandro e seus colegas tiveram a mesma certeza que a juíza do Trabalho na Vara de Bom Jesus da Lapa (BA), Sílvia Isabelle Ribeiro Teixeira, manifestaria mais de 12 anos depois.
A magistrada, provocada pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) somente em junho de 2007, concluiu aquilo que alimenta até hoje a revolta das vítimas e de suas famílias:
“Para os demandados, são mais importantes as sacas de feijão que teoricamente perderam no acidente do que as vidas ceifadas pelo infortúnio, as enfermidades adquiridas pelos trabalhadores, ou até o susto de ter passado pelo pesadelo descrito”.
Enquanto a Justiça tarda – pois os donos da fazenda recorreram da decisão da juíza menos de um mês após ela determinar o pagamento das indenizações, no último dia 29 de abril –, seu Filomeno Gomes de Souza, hoje com 51 anos, sente vergonha de ser sustentado, desde o acidente, pelos três filhos e pela mulher.
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Como Neisandro, Filomeno (foto) viu a morte de perto. Ficou só com a cabeça pra fora, soterrado pelas sacas de feijão. Acredita que, se os colegas demorassem mais cinco minutos para retirá-lo, não teria mais como respirar. Ele estava exatamente no meio dos irmãos Jucelino da Silva Reis e Salu Mendes da Silva Reis, ambos mortos no acidente. |
“Fui salvo por um lugar mais alto que me deixou preso e com espaço para a cabeça”, lembra.
Hoje o agricultor faz planos. Pretende comprar um pedaço de terra com o dinheiro da indenização e, finalmente, “não dar mais trabalho aos filhos”, que já têm suas próprias famílias.
Com dores nos braços e convivendo com a pancada no peito que teima em não passar, Filomeno guarda um sorriso tímido no rosto. “Ficar triste não adianta nada, tristeza demais a gente já passou”, garante.
Vida “sacrificosa”
Os dois rapazes que morreram ao lado de seu Filomeno são filhos do carpinteiro Otacílio Reis (foto), 62 anos. Além de Jucelino e Salu, então com 31 e 26 anos respectivamente, outros dois filhos de Otacílio também estavam no caminhão e sofreram os mesmos maus-tratos na fazenda baiana. Taciano da Silva Reis, que também ainda sente fortes dores no peito, tinha 17 anos, e Ozéias Silva Reis, contava apenas 14.
Os filhos de Otacílio e Neisandro, o rapaz que despertou com o pesadelo do irmão morto, não eram os únicos menores de idade também submetidos ao trabalho infantil na Fazenda Porto Alegre. Dos 79 nove trabalhadores levados para a cata de feijão, 23 tinham menos de 18 anos.
Para sustentar os 18 filhos, que ainda dependem do seu suor, o carpinteiro toca com dificuldade sua oficina nos fundos de casa no bairro do Aeroporto, em Corrente. “Aqui é tudo feito na unha seca. Sem máquinas”, diz o pai, que faz carros de boi e miniaturas de madeira para sobreviver.
Recentemente, ele perdeu o carro velho com carroceria que usava para carregar pedaços de ipê, jatobá e peroba, produto da cata dele no meio do cerrado da região. Como em alguns meses não entrou dinheiro algum, as prestações do carro ficaram atrasadas e ele perdeu o instrumento de trabalho.
A vida, principalmente depois da morte dos dois filhos, ficou “sacrificosa”, como afirma Otacílio. Ele sonha em melhorar a oficina com ferramentas elétricas e produzir mais rápido com o dinheiro da indenização. Por enquanto, o carpinteiro, com ajuda de outros dois filhos, tira no máximo R$ 50 por mês com seu trabalho exaustivo.
“Tratamento de ser humano”
Entre os feridos graves, alguns passaram até 180 dias em tratamento nos hospitais da região e no Hospital de Base em Brasília. Foi o que sofreu José Aldir Barreira Lira (foto). O trabalhador perdeu a perna esquerda no acidente e só teve alta do hospital da capital no dia 1º de dezembro de 1995, quase dois meses depois.
A perna de Aldir foi amputada ainda no hospital em Barreiras. Ele não se esquece da data: 26 de outubro de 1995, quatro dias depois do acidente. A amputação se tornou inevitável após os médicos descobrirem no membro uma gangrena gasosa (infecção aguda), que ameaçava se espalhar letalmente por todo o corpo. Com a ajuda da mulher, Aldir cuida hoje de um bar instalado na casa de três cômodos, também localizada no Aeroporto, bairro de Corrente que recebeu, de uma só vez, sete caixões no dia seguinte ao acidente. |
Aldir completou 20 anos no acampamento da fazenda, em 11 de outubro de 1995. Nada de festa ou presente. Teve mesmo que encarar o que ele chama de “comida pra bicho bruto”. “Se não comesse, morria de fome”, relembra.
Para conseguir a prótese que usa há quase dez anos, ficou na casa do irmão Adilson, em Brasília. Foram três anos na capital federal e a metade desse período ele dedicou para garantir o direito de usar o equipamento. Voltou a Corrente somente em 1998, e até hoje não conseguiu trocar a perna de metal que o ajuda a caminhar.
“A primeira prótese já devia ter sido trocada, mas, como, sem dinheiro?”, lastima. Aldir sustenta a mulher e filha Kátia, de quatro anos, com um salário mínimo do amparo da Previdência Social, mas não consegue juntar nas vendas do bar os R$ 800 necessários para reformar o aparelho ou os R$ 6 mil para trocar o dispositivo, que já deveria ter sido revisado, pela terceira vez, há mais de seis meses.
“No início eu era bastante revoltado e achava que minha vida não tinha mais sentido. Hoje só peço que os donos da fazenda tratem as pessoas como seres humanos”, diz.
Aldir, assim como os demais catadores, nunca recebeu qualquer ajuda, nem dos “gatos”, nem dos fazendeiros. Seu benefício da Previdência Social saiu 11 meses após o acidente, período que sobreviveu graças à ajuda da família.
Indignação Social
A história dos trabalhadores rurais de Corrente é considerada um marco nacional da impunidade pelo procurador do Trabalho, Paulo Germano. Foi ele quem resgatou a tragédia do fundo de uma gaveta da Justiça baiana. Germano tinha acabado de inaugurar o Ofício do Ministério Público Trabalho (MPT) em Barreiras (BA), quando ficou indignado com o descaso e o esquecimento dessa tragédia.
“A despeito de toda a revolta e indignação social que cercaram o caso, o Estado brasileiro não puniu ou responsabilizou ninguém. ‘Gatos’, arrendatários e sub-arrendatários da fazenda estão livres e não desembolsaram um só centavo que seja com os trabalhadores vitimados ou suas famílias”, resume o procurador na ação civil pública que começou a resgatar finalmente a dignidade das vítimas e suas famílias.
Responsável pela condução do caso, agora dependendo de decisão do Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região, o procurador Luciano Leivas reconhece a culpa do Ministério Público antes da chegada do MPT na região, apesar do esforço e da dedicação do colega. Germano fez questão de ir até a região de Corrente para ouvir os catadores e suas famílias.
“Esse tempo, é preciso reconhecer, sem que fosse proposta a ação contra os responsáveis, é parte da omissão da Justiça”, afirma Leivas. “Infelizmente quase não existe transporte regular de trabalhadores nessa região. A maioria ainda é feita com caminhões”, explica.
Decisão “lapidar”
Por enquanto condenadas apenas na primeira instância da Justiça trabalhista, as empresas responsáveis pela colheita de feijão na Fazenda Porto Alegre, a Agrocel Agropecuária Ceres Ltda e a Galvani Fertilizantes, devem pagar R$ 200 mil por danos morais a cada família dos 14 mortos. O valor também deverá ser pago pelo italiano Gaetano Módica, administrador da fazenda na época.
A juíza concedeu, neste caso, apenas metade, dos R$ 400 mil pedidos pelo procurador Paulo Germano.
Mesmo assim, ele considera a decisão “dura e lapidar”, pois pode dar fim à impunidade que contorna o caso. O Ministério Público decidiu não recorrer, principalmente para não arrastar mais o processo e desgastar as vítimas e seus familiares.
A juíza também determinou que os réus paguem uma indenização cumulativa no valor de R$ 50 mil para os trabalhadores gravemente lesados e de R$ 25 mil para os que apresentam lesões visíveis ou cicatrizes profundas e irreversíveis, sem a perda de membro.
A sentença prevê ainda que os réus paguem uma pensão mensal, de 2/3 do salário mínimo legal, aos cônjuges e filhos de até 25 anos (na data do acidente) até o dia em que o falecido completaria 65 anos de idade. Os trabalhadores com limitações no trabalho, como perda ou inutilização de membro, poderão receber uma pensão no valor de um salário mínimo.
Vista pelo lado monetário, a decisão parece tímida diante do sofrimento das famílias e, principalmente, do tamanho de uma das rés, a Galvani Fertilizantes.
A empresa diz empregar diretamente cerca de mil funcionários, outros 850 terceirizados e revela “um faturamento líquido ao redor de R$ 470 milhões”. A responsabilidade da empresa, neste caso, também contradiz a postura empresarial assumida pelo grupo com a manutenção do Instituto Lina Galvani, entidade dedicada a projetos sociais.
Os depoimentos dos trabalhadores, que poderiam enquadrar as empresas no crime de trabalho análogo à escravidão, não valem atualmente como prova para uma denúncia formal na Justiça. Não houve flagrante, nem outras provas foram colhidas na fazenda, na época, por fiscais antes do acidente com o caminhão. |
Mas a ação do Ministério Público do Trabalho e a sentença da juíza mostram a vinculação evidente do crime anterior ao acidente: servidão por dívidas, restrição de liberdade e condições degradantes de trabalho. As três situações narradas pelos catadores são exatamente as mesmas que podem enquadrar qualquer empregador no crime de trabalho escravo.
A Galvani afirma, em nota (leia a íntegra), não ter em nenhuma de suas atividades o plantio de qualquer tipo de cultura, mas que, apesar disso, foi “envolvida, como uma das co-rés, em uma ação civil pública”.
“Apesar de não ter comprovadamente nenhuma relação jurídica com essa propriedade rural, com o veículo e nem mesmo com nenhum dos trabalhadores envolvidos no acidente, a Galvani, por ter tido relações comerciais com uma empresa envolvida no episódio, foi incluída entre os réus na ação pública para que fosse averiguada sua eventual participação, mesmo indireta, na ocorrência”, diz o texto encaminhado ao Congresso em Foco.
O site não conseguiu localizar, inclusive nos endereços utilizados pela Justiça, a Agrocel e o italiano Gaetano Módica. Os números registrados no nome do então administrador da Porto Alegre não puderam ser consultados, segundo a empresa telefônica, a pedido do próprio assinante. Os telefones em nome da Agrocel não atenderam. O advogado que representa Módica e a Agrocel, Hélcio Arbo, também não retornou os pedidos de entrevistas feitos durante duas semanas pela reportagem.
Esquecidos à própria sorte depois de uma dupla tragédia, os trabalhadores de Corrente convivem com a desconfiança. Acham que o dinheiro das indenizações ainda pode demorar ou até não chegar nunca, calejados pelo sofrimento, mais de 12 anos depois. Mas o que a Justiça não vai conseguir apagar é que esses escravos da impunidade viveram e morreram numa tragédia protagonizada a pouco mais de 14 horas, de ônibus, de Brasília.
“Moço, o quanto o senhor acreditar que essa história é triste ainda é pouco”, adverte Hilton Vieira (foto acima), vice-presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Corrente e um dos defensores das famílias em luto permanente desde 1995. Luta solitária, pois o país não pôde nem clamar pelas vítimas, por desconhecer o que é ser trabalhador rural no Brasil do atraso, camuflado de progresso.
Leia aqui mais sobre esse obituário, com as histórias de gente que ainda sofre com o pesadelo do acidente e da escravidão no interior do Piauí.
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