Cotado para ser reeleito presidente da Câmara, o deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ) disse há pouco não temer ficar na linha de tiro dos adversários, caso seja de fato reconduzido ao comando da Casa, diante das acusações de que recebeu dinheiro desviado da Petrobras. Bancado pelo Palácio do Planalto para a reeleição, Maia é um dos políticos mencionados por Cláudio Melo Filho, ex-vice-presidente de Relações Institucionais da Odebrecht, como beneficiário de R$ 500 mil de dinheiro não contabilizado de campanha eleitoral. Nessa lista, diz Cláudio, figuram nomes como o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), o deputado cassado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), o ex-ministro Geddel Vieira Lima e os ex-ministros da gestão Dilma Rousseff Jaques Wagner e Antonio Palocci. Um dos quase 80 delatores da empreiteira relacionados para acordos de delação premiada, Cláudio disse ainda que o próprio presidente Michel Temer recebeu R$ 10 milhões de caixa dois do petrolão.
Questionado pelo Congresso em Foco se não temia repetir o desgaste causado por Cunha, réu da Operação Java Jato, à frente da Câmara no biênio 2017-2018, justamente quando é iniciado um extenso processo de delação premiada por executivos da empresa-pivô do escândalo de corrupção na Petrobras, Maia disse estar tranquilo. Identificado como “Botafogo” em uma das planilhas de repasses da Odebrecht com apelidos de políticos, Maia afirmou ainda não temer o megadelação em curso – para o ex-presidente da República José Sarney, uma “metralhadora de [calibre] ponto 100”.
“Não… De jeito nenhum. Tenho certeza, sei do que eu fiz. Sei que não cometi nada errado. Acho que essa é uma questão que vai ficar clara em alguns meses. É importante qualquer político saber que pode ser investigado, não tem problema algum. Minha vida é aberta, todos sabem disso”, declarou o deputado, passando ao discurso institucional.
“O que eu quero é o melhor para a instituição, o melhor para a Câmara dos Deputados, e a certeza de que os Poderes precisam trabalhar em harmonia. A gente precisa tirar o Brasil da crise política e econômica”, acrescentou, em coletiva de imprensa no Salão Verde da Câmara.
Brecha legal
Maia não explicou a razão de ter ido à Câmara em pleno recesso parlamentar branco, oficialmente iniciado a partir desta sexta-feira (22). Ontem (terça, 20), o parlamentar fluminense recebeu uma notícia que o estimula a se fazer presente na Casa: o deputado Rubens Pereira Júnior (PCdoB-MA) encontrou um argumento jurídico para driblar um impedimento constitucional e regimental que proíbe a reeleição do presidente da Câmara em uma mesma legislatura. Rubens é o relator, na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), da consulta feito pelo PSD sobre a legalidade da reeleição do presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ) ao cargo.
Pereira Junior argumentou que não há previsão legal clara do impedimento e que há interpretação diversa da aplicação do Regimento Interno da Câmara e da Constituição. “Há uma omissão legal que precisamos resolver para o futuro. Mas agora não há impedimento da reeleição do atual presidente da Casa”, disse o deputado.
O parecer de Pereira Junior faz parte do grande acordo político que se costura há algumas semanas na Câmara pela base de apoio parlamentar ao governo do presidente Michel Temer. Apesar de ser de um partido teoricamente de oposição do governo, Pereira Junior é do PCdoB, legenda que apoiou a eleição de Rodrigo Maia em 14 de julho, em substituição a Cunha. Agora, a exemplo do Planalto, apoiará sua reeleição.
Sobre o assunto, Maia diz que, por ser ele um “presidente-tampão”, eleito em julho para substituir o ex-companheiro de bancada, não está enquadrado na vedação legal. Segundo esse entendimento, diz o deputado, não há, tanto na Constituição quanto no Regimento Interno da Câmara, a proibição textual sobre reeleição de presidente escolhido para completar o mandato de outro deputado. Assim, o caminho estaria livre para que ele seja reconduzido ao comando da Casa.
O relatório da CCJ “está bem fundamentado”, opina o presidente da Câmara. “O deputado Rubens é um deputado muito respeitado. É um relatório que vai na linha dos pareceres que o Democratas está analisando com alguns advogados. Está na linha correta. Do ponto de vista jurídico essa é uma questão muito clara: a decisão política que precisa ser tomada”, declarou Maia, acrescentando que ainda vai decidir, em conjunto com líderes aliados e a cúpula do DEM, se disputará a reeleição.
Interna corporis
Maia evitou comentar as queixas de alguns colegas cotados para disputar o pleito, a ser realizado em 1º de fevereiro. Como o deputado Rogério Rosso (PSD-DF), que perdeu a disputa para Maia em julho e é um dos nomes do chamado “centrão”, bloco partidário que servia de base de Cunha, para sucedê-lo. Segundo Rosso, já que alguns parlamentares têm insistido na candidatura de Maia, ele também vai manter a sua e submeter seu nome ao centrão.
Nesse ponto da entrevista, Maia se limitou a falar sobre ações ajuizadas no Supremo Tribunal Federal (STF) por partidos como Solidariedade e Psol contra sua candidatura. “O que todos os advogados estão dizendo é que a sinalização inicial do Supremo – inicial, claro, pois não houve conclusão e até porque não tem urgência pra isso, como decidiu o ministro [do STF] Celso de Mello – é que esta é uma questão interna da Casa. Então, a Casa vai decidir, se eu decidir disputar a eleição, se de fato cabe ou não a reeleição no caso de um presidente com um mandato em menos de um ano”, acrescentou o congressista.
Maia estava falando sobre o despacho do ministro Celso de Mello, ontem (terça, 20), dando prazo de dez dias para que a Câmara se posicione sobre a ação em que o Solidariedade, partido liderado pelo deputado Genecias Noronha (CE), questiona a possibilidade de candidatura de Maia diante da já mencionada vedação legal. A questão não será resolvida até 1º de fevereiro, quando a Câmara elege a nova Mesa Diretora, uma vez que o Judiciário está de recesso até 20 de janeiro – prazos legais, nesse sentido, não permitem a conclusão do caso em dez dias. A Advocacia-Geral da União (AGU) e a Procuradoria-Geral da República (PGR) também se manifestarão sobre as informações da Câmara, a partir de quando Celso de Mello levará o processo ao pleno do Supremo. Assim, o conjunto da Corte só deve julgar o caso depois da eleição para o comando da Casa legislativa.
Para Maia, novamente questionado por este site, não é errado alterar o entendimento constitucional com a disputa em andamento, para lhe beneficiar. “Mas quem mudou a regra do jogo? Eu mudei a Constituição? O que está escrito na Constituição? Diz que o presidente, no mandado suplementar, não pode ser candidato à reeleição? Onde está escrito? É uma decisão interna corporis, uma decisão da Casa. É isso o que advogados e juristas estão dizendo”, concluiu Maia. Ele disse ainda que, no início de janeiro, decidirá se concorrerá à reeleição.