Claudia Spessatto* |
Licença para atirar nas diferenças. Direito de acabar com as minorias. Julgamento instantâneo e morte aos menos favorecidos. A nova lei da sobrevivência inclui não somente a luta pela continuidade do estabelecido, como também o extermínio do diferente e do estrangeiro. E, com isso, lá se vai o mundo sem fronteiras – sonhado por alguns visionários, restando apenas a dura regra que impõe, sem dó nem piedade, a velha e conhecida norma humana que busca os iguais em uma sociedade de múltiplas dicotomias. A reação européia e americana ao terrorismo, que incute medo e desconfiança diária aos seus habitantes, demonstra como a humanidade está, mais uma vez, caminhando para o lado errado. A lei do dente por dente não traz, em momento algum, a segurança tão sonhada pelos cidadãos do primeiro mundo. A fome da África incomoda, o modo diferente de vida dos árabes perturba e a pobreza do mundo os invade diariamente. A resposta da minoria vem em forma de medo e de guerra silenciosa. A vida normal e enfadonha ganha ares de perigo constante. Entrar em um ônibus, tomar o metrô e andar pelas ruas torna-se ato sem volta e que ameaça o cotidiano tão bem estabelecido em vidas que se pensam eternas. Talvez, de tanto viver com medo, alguns preferissem o terror absoluto da guerra declarada e a fome, que mata rápido e não dá chance à aterrorizante idéia de se ver seus padrões escorrendo pelo buraco das más políticas internacionais. A usual prática humana de invadir para fazer progredir, de lutar para impor seus propósitos e de destruir para voltar a erigir o que acredita correto, em momento algum, foi aceita ou atingiu seu intento sem ter destruído inúmeras vidas e países. Desde tempos imemoriais, a raça humana vem fazendo uso da força para impor sua vontade. Religiões, interesses econômicos, terras, petróleo, qualquer motivo torna-se meio para insuflar recurso no setor armamentista e no bolso-sem-fundo de governantes eleitos para defender o proveito de poucos. Quanto tempo levará para aprendermos a respeitar as diferentes formas de viver? Quantas vidas serão necessárias para ensinar a união? Quando começaremos a lutar apenas pela manutenção do bem viver da Terra e dos terráqueos? O tempo das cavernas já se foi há muito, mas continuamos defendendo nosso território como neandertais famintos. As guerras santas acabaram faz tempo, mas insistimos em acreditar que o nosso credo salva e que o do outro condena. A escravidão está proibida há dezenas de anos, mas teimamos em subjugar povos inteiros, só para manter nosso merecido bem-estar. Esperemos que a raça humana aprenda suas lições antes da extinção. Tomara que as fronteiras sirvam um dia apenas para respeitar as diferenças naturais entre iguais. Oxalá chegue logo o tempo em que o bem mais valioso seja a vida, que será defendida acima de qualquer interesse, vertente ou crença. * Claudia Spessatto, natural de Uruguaiana (RS), é jornalista e artista plástica. Atua profissionalmente em Brasília, no Congresso Nacional, desde 1982.
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