Mário Coelho
Os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) retomaram na tarde desta quinta-feira (23) o julgamento do recurso extraordinário apresentado pelo candidato ao governo do Distrito Federal Joaquim Roriz (PSC), questionando o indeferimento de seu registro de candidatura com base na Lei da Ficha Limpa (Lei Complementar 135/10). Por enquanto, o placar está dois a um reconhecendo a validade das novas regras de inelegibilidade para as eleições de outubro. O julgamento foi interrompido ontem (22) após o pedido de vista do ministro José Dias Toffoli.
Ao trazer seu voto vista, Dias Toffoli aceitou uma das teses usadas pela defesa de Roriz para conseguir liberar seu registro de candidatura. Para ele, o processo eleitoral começa muito antes das convenções. Portanto, a lei modificou o processo eleitoral, não devendo ser aplicada em 2010. Quando analisou duas consultas e julgou casos específicos, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) decidiu, por maioria, que o processo eleitoral só começa com as convenções partidárias.
No início do voto, o ministro afirmou que a corte precisa “suprir a omissão” da defesa e analisar se a emenda apresentada no Senado realmente modificou o mérito da Lei da Ficha Limpa. Ontem, o presidente do STF, Cezar Peluso, disse que a mudança do tempo verbal pelo Senado causou um inconstitucionalidade formal na lei. Na visão de Peluso, o projeto deveria ter voltado para a Câmara para uma nova votação e não ter sido sancionado pelo presidente Lula.
Para o ministro Toffoli, a questão de ordem, que causou polêmica ontem, deve ser respeitada, “não tendo que se falar em acrobacia”. A declaração foi uma resposta à frase dita pelo relator do caso, ministro Carlos Ayres Britto, que qualificou o argumento do presidente do STF como “saltro tripo carpado hermenêutico”. “Não vislumbro como ter a inconstitucionalidade formal”, disse, defendendo a constitucionalidade da lei. Ele citou, em seu voto, ofício enviado pelo senador Demóstenes Torres (DEM-GO) aos integrantes da corte, como antecipou o Congresso em Foco. “A CCJ não extrapolou suas competências. Ao contrário, foi zelosa”, disse Torres no ofício.
Após se manifestar contra a aplicação nas eleições de outubro, Toffoli afirmou que não há direito adquirido a “regime político de inelegibilidade”. Ou seja, atacou o argumento dos advogados de Roriz, que afirmavam que o ex-governador não pode ser declarado inelegível por ter renunciado ao mandato de senador há sete anos. “A renúncia continua tendo seus efeitos jurídicos reais”, afirmou. Sobre a questão da lei retroagir, ele fez uma comparação com o serviço militar. Disse que se uma lei disser que somente aqueles que serviram podem se candidatar, ela cria um critério, e não retroage para prejudicar os candidatos. Na mesma linha, o ministro afirmou que “não é o caso” de que a Lei da Ficha Limpa cria pena. Ele reforçou que, na visão dele, as novas regras estabelecem critérios para entrar na corrida eleitoral.
Já a ministra Cármen Lúcia ratificou sua posição já dada nos julgamentos no TSE. Inicialmente, ela entendeu, sobre a questão de ordem levantada por Cezar Peluso. Para ele, seria “inapropriado” a intromissão de um novo tema na análise do caso. Porém, Cármen Lúcia adiantou que, se a posição dela for superada, acredita que a inconstitucionalidade formal não existe por conta da mudança do tempo verbal de trechos da Lei da Ficha Limpa. “A questão do processo legislativo não deveria ser cogitada sem manifestação prévia das partes”, opinou.
Na questão do mérito, Cármen Lúcia afirmou que a ficha limpa tem como princípio proteger o sistema ético-jurídico das eleições. “Candidatos devem preencher condições exigidas. A lei não cria danos na igualdade entre os candidatos, não é manobra casuística”, disse. Para ela, as novas regras de inelegibilidade não alteraram o processo eleitoral. Portanto, não precisa obedecer o artigo 16 da Constituição Federal, que prevê o princípio da anualidade em leis eleitorais.
Sobre a questão da renúncia de Roriz, que a defesa argumenta ter sido o “ato jurídico perfeito”, sem poder resultar em inelegibilidade, a ministra disse que o ex-governador continua inocente da prática de quebra de decoro parlamentar. “Sua renúncia poderia deixar dúvidas quanto à veracidade das acusações, mas isso não tem qualquer importância. A renúncia é ato jurídico perfeito. A lei complementar não alterou nenhum dos efeitos da renúncia”, disse Cármen Lúcia. Ela ressaltou que inelegibilidades não são penas, são critérios para “ajustarem o modelo democrático brasileiro”. “A lei veio a cumprir uma exigência constitucional”, disse, fazendo referência ao artigo da Constituição que prevê a necessidade de uma lei complementar para estabelecer critérios de inelegibilidade.
Antes de Toffoli trazer seu voto vista, o ministro Marco Aurélio Mello, que ontem afirmou que os colegas estavam “complicando demais o julgamento”, mudou de posição. Ele levantou questão de ordem sobre o caso da inconstitucionalidade formal da ficha limpa. Na visão do ministro, a corte deveria analisar o caso. “Correríamos o risco de ter que analisar a Lei Complementar 135 mais de uma vez”, apontou.
Durante sua intervenção, antes de votar, ele já se posicionou que, por conta da emenda que modificou o tempo verbal de partes da ficha limpa, estaria demonstrado o vício de inconstitucionalidade da lei. Ele também disse ter o receio de que, ao liberar a lei para 2010, que pode criar um precedente para que outras normas fossem criadas aumentando ou diminuindo o rol de inelegibilidades. Ele ainda vai apresentar seu voto. Até o momento, na questão de ordem apresentada por Peluso, o placar está dois a zero pela constitucionalidade da ficha limpa.
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