Juízes e senadores reagiram nesta terça-feira (9) às críticas do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Joaquim Barbosa, sobre a criação de quatro tribunais regionais federais além dos cinco já existentes hoje. A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 544/02, aprovada pela Câmara na última quarta-feira (3), segue para promulgação do Congresso Nacional. A estrutura extra é considerada por Joaquim Barbosa desnecessária, cara e com objetivo único de construir de tribunais “em resorts”. Em ríspida conversa com entidades de classe dos juízes, o ministro ainda criticou a forma “sorrateira” como as entidades de classe teriam trabalhado para aprovar a PEC e ainda “induzir a erro” os deputados e senadores.
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“Não fiz nenhum encontro sorrateiro, nenhuma negociata!”, criticou o relator da PEC no Senado, Jorge Viana (PT-AC), que lembrou de encontro de Joaquim Barboa com senadores para discutir o assunto. “O que eu vou falar é grave: eu sei que o presidente desta Casa [Renan Calheiros, PMDB-AL] se reuniu com o presidente do Supremo para tratar dessa mesma matéria. Seria leviano da minha parte dizer que foi uma atitude sorrateira do presidente do Supremo chamar o presidente Renan para tratar de que não é bom criar os tribunais”, ironizou.
Hoje, as associações dos magistrados (AMB), dos juízes federais (Ajufe) e dos juízes do trabalho (Anamatra) disseram que Joaquim Barbosa “agiu de forma desrespeitosa, premeditadamente agressiva, grosseira e inadequada”. Os juízes afirmaram que o presidente do STF tem dificuldade de dialogar. “Sua Excelência mostrou sua enorme dificuldade em conviver com quem pensa de modo diferente do seu, pois acredita que somente suas ideias sejam as corretas”, disseram eles em nota.
Os juízes disseram que, de forma inédita, Joaquim permitiu a entrada de jornalistas na reunião, o que demonstraria seu objetivo de dialogar com outras pessoas e não com as entidades de classe. Também disseram que desrespeito às entidades não tem precedentes na história dos presidentes do Supremo. “Como tudo na vida, as pessoas passam e as instituições permanecem. A história do Supremo Tribunal Federal contempla grandes presidentes e o futuro há de corrigir os erros presentes.”
Sem propostas
Vice-presidente do Senado e relator da PEC, Jorge Viana foi duro contra Joaquim Barbosa. Negou o caráter pouco transparente da aprovação dos novos tribunais. “Fui relator dessa matéria no Senado e não fiz nenhum encontro sorrateiro, nenhuma negociata! Não me propuseram nenhuma condução sorrateira!”, disparou o senador. Outros senadores fizeram apartes concordando com Jorge Viana.
A PEC 544 determina que os novos tribunais tenham sede em Curitiba (PR), Belo Horizonte (MG), Salvador (BA) e Manaus (AM). Defendida por juízes e procuradores, o objetivo alegado da proposta é desafogar a Justiça Federal, principalmente o TRF da 1ª região, que é responsável por 13 estados e o Distrito Federal. A partir da validade da PEC, os tribunais terão até seis meses para ser instalados, o que pode ser impedido: a Advocacia Geral da União estuda contestar a validade da medida, mas vai esperar a promulgação da PEC pelo Congresso para então ajuizar ação na Justiça.
“Abaixe a voz”
Na audiência de ontem, Joaquim Barbosa usou tom irônico e, por vezes, ríspido, ele fez as críticas ontem (8), em audiência com as diretorias da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) e da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra). Além de condenar os termos da aprovação da PEC – “na surdina, à base de cochichos, de maneira sorrateira” – no Congresso, o presidente disse que o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que ele também preside, não discutiu a matéria, em procedimento que seria inconstitucional.
A audiência, na sala de reuniões da presidência do STF, foi parcialmente aberta à imprensa e registrou a discussão acalorada entre Joaquim Barbosa e o magistrado Ivanir César Ireno Junior. Imagens e o áudio das conversas foram amplamente veiculados pela imprensa já na noite de ontem. Hoje, ganhou as primeiras páginas dos principais jornais do país.
“Esses tribunais vão ser criados em resorts, em alguma grande praia… […] Mais uma vez, toma-se uma decisão de peso no país sem ouvir o CNJ. Ou seja, à base de cochichos. Os senadores e deputados foram induzidos ao erro, porque ninguém colocou nada no papel. Pelo que eu vejo, vocês [dirigente das entidades] participaram de forma sorrateira na aprovação. […] São responsáveis, na surdina, pela aprovação”, bradou Joaquim, interpelado por Ivanir.
“Sorrateira não, ministro! Sorrateira, não! Democrática e transparente!”, protestou o dirigente, um tanto alterado. A resposta do presidente do STF foi ainda mais enfática. “O senhor abaixe a voz que o senhor está na presidência do Supremo Tribunal Federal!”, vociferou Joaquim, para então ouvir do interlocutor que este não estava “gritando”. “Então só me dirija a palavra quando eu lhe pedir”, arrematou o ministro.
“Conluio”
Joaquim Barbosa já havia entrado em atrito com juízes recentemente, dessa vez ampliando o leque de críticas aos operadores do Direito. Em julgamento no CNJ em 19 de março, que resultou na aposentadoria compulsória de um magistrado piauiense denunciado por beneficiar advogados, Joaquim Barbosa bateu boca com o relator do processo, Tourinho Neto, ao dizer que o “conluio” entre juízes e advogados durante a tramitação de processos judiciais é o que de mais “pernicioso” há na magistratura brasileira.
A exemplo do que fizeram naquele episódio, as entidades da magistratura voltaram a divulgar nota conjunta de repúdio (veja aqui) em relação às declarações sobre as novas cortes. “O presidente do STF, ministro Joaquim Barbosa, agiu de forma desrespeitosa, premeditadamente agressiva, grosseira e inadequada para o cargo que ocupa. Ao permitir, de forma inédita, que jornalistas acompanhassem a reunião com os dirigentes associativos, demonstrou a intenção de dirigir-se aos jornalistas, e não aos presidentes das associações, com quem pouco dialogou, pois os interrompia sempre que se manifestavam”, diz trecho inicial da nota.
Confira a íntegra da nota conjunta
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