A transferência da capital federal do Rio para o Planalto Central ganhou as manchetes dos principais veículos de comunicação do país como o início de uma nova era da República. “Brasília amanhece”, “Brasil, capital Brasília”, “Brasília, do papel ao concreto” eram apenas alguns dos títulos de primeira página, quase sempre ilustrados por duas imagens que se confundiam: a de Juscelino Kubitschek e a da “capital mais moderna do mundo”.
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Os jornais também destacavam curiosidades. No ano que antecedeu a sua inauguração, por exemplo, Brasília registrou apenas oito casos de homicídio e somente três de corrupção. Uma família gaúcha viajou 240 dias em uma carroça só para participar da inauguração da nova capital. Em acesso de fúria por causa da mudança que não chegava, um deputado tentou incendiar o elevador do prédio funcional em que passaria a morar.
Confira os destaques (clique nas imagens para ampliá-las) dos principais jornais em 21 de abril de 1960:
Diários Associados
(O Jornal, Estado de Minas, Folha de Goyaz, Correio Braziliense)
PublicidadeO Brasil amanhece em nova capital federal. No vasto planalto central, Brasília, o sonho acalentado desde os Inconfidentes, surge no centro de gravidade do país para comandar a conquista do interior e trazer até êle a civilização que se espraia pelo Atlântico. Há pouco mais de três anos ela existia apenas na imaginação de alguns homens e era um esbôço sôbre uma prancheta. Hoje é um marco decisivo na história do desenvolvimento econômico do Brasil e a certeza de um amanhã melhor para os brasileiros de tôdas as latitudes. Louvo o esforço de quantos divulgam a saga de Brasília, suas obras, seus detalhes, suas perspectivas. – Trabalhos como êste valem como documento e testemunho de um momento de extraordinária beleza, em que uma nação se apossa de seu destino para se projetar no futuro. Juscelino Kubitscheck.
Kubitscheck: o mais difícil foi começar
Entrevista exclusiva concedida a José Leão Filho
O presidente Juscelino Kubitscheck, em entrevista exclusiva para esta edição dos Diários Associados, no dia da inauguração de Brasília, disse, olhando através dos vidros do Palácio Alvorada, que “desde menino olhava curiosamente aquêle quadrilátero que Cruls desenhou no centro do mapa do Brasil”. Disse ainda o presidente: 1 – “Até o primeiro comício de minha campanha política não tinha pensado em construir a nova capital. 2 – Brasília é a melhor e mais importante do meu governo, na medida em que sintetiza tôdas as demais. 3 – O mais difícil, na obra de Brasília, foi começá-la. 4 – Só poderia pensar na honra de representar Brasília no Congresso depois de aprovada sua organização política e judiciária. – Meu esporte predileto é dançar.
Plano Monumental nasceu com um sentido: criar condições que levam à especulação intelectual
“Monumental não no sentido da ostentação, mas no sentido da expressão palpável, por assim dizer, consciente, daquilo que vale e significa”. Brasília, segundo o projeto Lúcio Costa, vitorioso no Concurso promovido pela Companhia Urbanizadora da Nova Capital, é uma cidade “planejada para o trabalho ordenado e eficiente, mas ao mesmo tempo cidade viva e aprazível, própria ao devaneio e à especulação intelectual capaz de tornar, com o tempo, além do centro de govêrno e administração, num foco de cultura dos mais lúcidos e sensíveis do país”. Em seu “Relatório”, Lúcio Costa justifica o chamado “Plano Piloto”, originariamente em forma de cruz e que depois foi adaptado à topografia local, arqueando-se um dos eixos da cruz para se assemelhar ao arcabouço de um gigantesco avião.
Lema de trabalho para Israel é “tudo devia estar pronto ontem”
Um ceramista, formado na Escola de Minas de Ouro Preto, foi quem o chefe do govêrno escolheu para dirigir a construção de Brasília. Transformando o barro, êsse homem começou a vida. E, transformando o barro, êle ascendeu a uma das posições mais proeminentes da atualidade brasileira, após ter sido secretário de Estado em Minas Gerais, sua terra natal, e deputado por diversas vezes. Seu pai, João Pinheiro, chefe de uma família de oleiros, e antigo Presidente de Minas, deu-lhe o nome de Israel.
Goiás fornece a maioria de candangos
É mesmo de Goiás a maioria dos “candangos” que estão construindo Brasília, vindos os mineiros em segundo lugar, com 20,3% do total; os baianos em terceiro, com 13,5%, e os cearenses em quarto, com 7,4%, seguindo-se pela ordem os pernambucanos, paraibanos, paulistas e piauienses. Os goianos concentram-se mais no povoado de Brasilândia, enquanto os mineiros que lá residem preferem a central da Novacap, e os baianos são encontrados em maior número no Núcleo Provisório de Bananal. Apenas 1.216 estrangeiros residiam em Brasília durante sua construção, representando 2,1% do total, aparecendo os espanhóis em maior número, seguido dos italianos, portugueses, japoneses e gregos.
Ministério da Saúde dá a Brasília uma rêde hospital que é modelo
Os trabalhos preliminares do Ministério da Saúde em Brasília incluíam desde o início o estudo para implantação de uma rêde hospital modelar e atendendo aos requisitos modernos no que diz respeito à organização e distribuição das unidades. O problema se apresentava tanto mais complexo, porque dispunha de várias facetas. Compreendia o atendimento de doentes na fase de construção da nova capital desde os seus primeiros dias, de modo a possibilitar rapidez e assistência eficaz, não só no perímetro da zona da nova capital, mas estendendo-se as rodovias e vias de comunicação que caminhavam em direção ao Plano Pilôto.
Brasília espelha o Brasil: católicos são maioria com oitenta e oito por cento
Em Brasília, como no resto do Brasil, a religião católica mantém maioria quase absoluta, com oitenta e oito por cento do total de pessoas que revelaram ter fé numa doutrina para a alma. Fato curioso é que os homens confirmaram que sua fé católica quase que na mesma proporção das mulheres (88,3% contra 88,6%), o que não é comum no resto do país, onde é ressaltante a maioria das mulheres crentes sôbre os homens, mais rebeldes à disciplina das religiões. Os protestantes vêm em segundo lugar, com 5,5%, seguidos dos espíritas (3,4%) e outras religiões.
Candangos ouvem clássicos e assimilam “civilização” enquanto fazem “pé de meia”
No “King’s Bar”, o bar dos candangos em Brasília, só se toca música clássica. Nada de sambas, boleros ou foxes. De brasileira, só folclórica, como “Casinha Pequenina”, de Haeckel Tavares, ou o “Luar do Sertão”, de Catulo da Paixão Cearense. Dá gôsto ver dezenas de “candangos”, aproveitando momento de folga para, em meio a uma cerveja ou uma água mineral, ouvir com devoção religiosa Liszt, Chopin, Beethoven, Schubert, Debussy e Tchaikowski.
Prisões em Brasília apresentam média de seis décimos por mil: metade da média universal
A média anual de prisões efetuadas pela polícia de Brasília é de seis décimos por mil, ou seja, quase metade da média que as convenções internacionais estabelecem para as cidades ordeiras: um por mil. Essa revelação nos foi feita pelo major Gastão Barbosa Fernandez, oficial do Exército e comandante da Guarda Especial de Brasília (GEB), força pública diretamente subordinada ao Departamento Regional de Polícia de Brasília, do qual é diretor o general Osmar Soares Dutra.
Correio Braziliense
Brasil, capital Brasília
Gov. federal funciona aqui desde 0 hora
Com a elevação da Santa Hóstia à zero hora de hoje, Brasília tornou-se capital do Brasil. Possantes refletores do Exército, que iluminaram completamente a cidade, lançavam seus jatos de luz cruzando o céu na Praça dos Três Poderes, num espetáculo deslumbrante, enquanto a banda do Corpo de Fuzileiros Navais executava o Hino Nacional. Profundamente comovido, o presidente Juscelino Kubitscheck tinha seus olhos marejados de lágrimas, enquanto a emoção silenciava a enorme multidão, que compreendia que uma nova era se abria para os destinos do país.
Tentou incendiar um elevador o Deputado Clemens Sampaio
O presidente Ranieri Mazzili confessa que houve certa confusão no ato da mudança. Dezenas de deputados não encontraram seus apartamentos mobiliados. Para o presidente Mazzili, os responsáveis por êste setor da mudança foram mal inspirados com as concessões feitas. Fracassou a mudança no setor de entrega de mobília. Dizia um deputado que o objeto mais importante do mundo para ele, na noite de ontem para hoje, era um colchão.
– Até mesmo debaixo de uma árvore eu me deitaria, depois de mais de mil quilômetros de viagem de automóvel.
O deputado Gurgel do Amaral exasperou-se quando chegou ao seu apartamento e o encontrou sem mobília. Eram dezenas de parlamentares nas mesmas condições. O deputado Gurgel do Amaral, dominado por viva emoção, chegou a tomar uma atitude agressiva, segundo informações. Enquanto isso, o deputado Vasconcelos Tôrres conseguiu alguns caixões de madeira e inaugurava sua nova moradia, com muito bom humor. O deputado Clemens Sampaio quis incendiar o elevador do edifício onde deveria alojar-se. E o deputado Carvalho Sobrinho, confundido com Mister Davidson, da Embaixada da Dinamarca, alojava-se no luxuoso Brasília Palace Hotel, a poucos passos do Palácio da Alvorada.
A Câmara Federal reiniciará seus trabalhos a 2 de maio
O presidente da Câmara Federal, Ranieri Mazzili, palestrou longamente com um grupo de jornalistas em visita ao monumental edifício do Congresso Nacional. Nessa ocasião, o representante paulista teve o ensejo de mostrar ao pessoal da imprensa as instalações com que poderão contar os jornalistas no desempenho da sua missão. Para facilitar o trabalho dos jornais, do rádio e da televisão, haverá na Câmara uma sala de imprensa, ampla e confortável, com mesas e máquinas em profusão, junto ao próprio recinto das sessões, de modo que os jornalistas e radialistas terão contato direto com os deputados, podendo circular em volta do plenário sem qualquer constrangimento.
Apenas oito homicídios qualificados registrados em Brasília, em 1959
Apenas oito homicídios qualificados registraram as autoridades policiais de Brasília em todo o decorrer do ano de 1959 no território da nova capital – foi o que revelou, em entrevista concedida ao Correio Braziliense, o general Osmar Soares Dutra, chefe do Departamento Policial da cidade que agora se inaugura. Acrescentou o chefe da Polícia:
– No ano passado, a nova capital contou com a média de 100 mil habitantes, e o baixo índice de homicídios revela que não é de marginais, de indivíduos perversos ou aventureiros, como acreditam alguns, que se compõe a população de Brasília. Pelo contrário: o que temos aqui é gente trabalhadora, que cuida do seu trabalho e sabe comportar-se numa sociedade organizada.
Brasília não tem cadeia
“Esta cidade não tem cadeia, aduziu o general Osmar Soares Dutra. Os prêsos são enviados a um depósito de prêsos e, quando deverão aguardar julgamento remetidos para Goiânia, pois não temos prisão judiciária. Atualmente, estão com cêrca de 75 detidos aguardando processo, entre homens e mulheres. Estas foram prêsas por vadiagem e atentado ao pudor.
– “A situação em Brasília é, no tocante ao comportamento de sua população, bastante boa, afirmou o chefe de polícia. O número de crimes no ano passado é uma prova: 8 apenas. Considera-se uma cidade comportada aquela que registra até 1 crime por mil habitantes. Nossa cidade está abaixo dêste índice. Conheço cidades, como Aracaju, com cêrca de 30.000 pessôas, onde cometem-se 8 crimes por semana, e não por ano.
A estatística do crime
Segundo um quadro estatístico organizado pela Corregedoria de Polícia de Brasília durante o ano de 1959 registraram-se, na área de 5.820 quilômetros da nova capital, os seguintes casos que determinaram a abertura de inquéritos:
Homicídio qualificado – 8
homicídio culposo – 29
tentativa de homicídio – 10
lesões corporais graves – 37
lesões corporais leves – 95
lesão corporal seguida de morte – 1
suicídio – 1
rixa – 5
sedução – 6
estupro – 1
conjunção carnal para fraude – 1
rapto consensual – 1
atentado violento ao pudor – 3
desacato – 31
corrupção ativa – 2
corrupção ativa e passiva – 1
furto – 20
roubo – 3
furto qualificado – 26
estelionato – 22
acidente de trabalho – 17
acidentes diversos – 3
tráfico de entorpecentes – 4
porte ilegal de arma – 16
jôgo de azar – 4
falsificação de moeda – 1
lenocínio – 8
apropriação indébita – 8
adultério – 1
receptação – 5
ameaça – 2
aliciamento de trabalhadores para imigração – 2
economia popular – 3
incêndio – 3
falsificação de documento público – 2
imprudência – 3
dano 1
falsa identidade – 1
violação de correspondência – 1
constrangimento ilegal – 2
violação de domicílio – 1
calúnia – 1
Abastecimento
Brasília, ontem, estava preparada para alimentar mais de quatrocentas mil pessoas. Ouvido pela nossa reportagem, o sr. Guilherme Romano afirmava que os alimentos não faltariam, qualquer que fôsse o número de visitantes: aviões, carros, frigoríficos, caminhões, estavam a postos. Enquanto isso, a vasão da Brasília-Rio, em Belo Horizonte, era de oito carros por minuto: mais de cem mil carros, em 24 horas, trazendo mobílias, alimentos e passageiros para a Nova Capital. Alimentos não faltaram, até agora. Talvez não tenha havido um cardápio “exquise”, de finas iguarias para todos: mas sobrou a brasileiríssima comida do candango, principalmente feijão, farinha, arroz, carne, doce e queijo. Não se pode prever, com segurança, se teremos no futuro, novos hábitos da frugalidade, porventura, anteriormente adotado pelos candangos. Mas está provado, pela experiência, que foi possível alimentar, em cinco dias, uma cidade de quatrocentos mil habitantes, que será a população de Brasília dentro de cinco anos.
Candangos
Êles demonstraram, antes que a frase se transformasse em “slogan”, que “todos os caminhos conduzem a Brasília”: vieram de tôdas as setas da rosa dos ventos, do Brasil e de fora. Não são jovens, todos, porque raramente a juventude constrói cidades adultas.
Tancredo Neves ao Correio: “Brasília é o Cérebro e o Coração da Pátria”
Dia 19, pela manhã, chegavaa Brasília o sr. Tancredo Neves. Transmitindo suas impressões sôbre a nova Capital, declarou ao Correio Braziliense o candidato ao govêrno de Minas Gerais:
– Sou um velho adepto de Brasília, desde os tempos do govêrno do presidente Getúlio Vargas. Participei de várias reuniões que visavam a escolha dos meios para a definição da área da nova capital. Eleito presidente da República nosso eminente coestaduano Juscelino Kubitscheck de Oliveira, fui dos que mais o animaram à realização dêste ciclópico empreendimento. Acompanhei mês a mês a evolução da idéia e a superação de tôdos os obstáculos que ela enfrentou para se transformar na esplêndida realidade de hoje.
Servir o Brasil
Em seu último artigo do Correio Braziliense, cujo derradeiro número tinha a data de janeiro de 1823, Hipólito José da Costa falou do seu periódico “cujo escôpo é ùnicamente servir o Brazil”. Provando que nada se perde na vida dos povos, como na natureza, reata-se hoje a existência do jornal, fundado e impresso em Londres, mas para advogar a causa da independência, as idéias liberais e o constitucionalismo, que eram as grandes aspirações do tempo.
O “Correio Braziliense” volta a circular depois de 137 anos
Instalada a sua publicação em Londres, em 1808, e interrompida em 1823, volta o Correio Braziliense a circular. E ontem, com a presença da Sra. Sarah Lemos Kubitscheck, de S. Eminência o Cardeal D. Carlos Carmelo de Vasconcelos Mota, do Sr. João de Medeiros Calmon, diretor geral dos Diários Associados, do Sr. Herbert Moses, presidente da Associação Brasileira de Imprensa, do deputado Abelardo Jurema, líder da maioria na Câmara dos Deputados, além de destacadas autoridades civis, militares e eclesiásticas especialmente convidadas, foram inauguradas as suas novas instalações.
Correio da Manhã
Brasília desde hoje capital da União
Com saudação a novo Estado, presidente voa para Brasília
O presidente da República, acompanhado de sua esposa e filhas, antes de embarcar para Brasília, na manhã de ontem, esteve no Palácio do Catete, onde se despediu de todos os funcionários que não foram transferidos para a nova Capital do país. A cerimônia foi simples, sem qualquer protocolo. O chefe de Govêrno fez questão de reunir no seu antigo gabinete de trabalho todos os servidores do Catete independente de sua categoria funcional e abraçou um a um.
Brasília é pandemônio, diz líder da Oposição
O líder oposicionista, João Agripino (UDN-Paraíba), criticou duramente o atual estado das coisas em Brasília com as seguintes expressões:
1- Brasília é um pandemônio;
2 – Fatos degradantes têm acontecido com deputados em plena briga para conseguir colchões, roupas de cama, toalha de banho, cadeiras, água e gás para seus apartamentos;
3 – Brasília não tem condições de receber a Capital, nem simbolicamente;
4 – A quase totalidade dos apartamentos não está pintada;
5- Não há energia para os elevadores, nem telefone nos apartamentos. Ninguém sabe de ninguém.
Estado da Guanabara começa hoje sua existência
Nos primeiros minutos de hoje o Sr. Sette Câmara assumiu o cargo de governador do Estado da Guanabara. A cerimônia realizou-se no Palácio da Guanabara na presença de altas autoridades federais e outras até então municipais, tendo o ex-prefeito Sá Freire Alvim usado de palavra em primeiro lugar, pronunciando um discurso, no qual fêz uma exaltação de sua administração e das dificuldades que têve de enfrentar.
Nova capital inaugurada com a missa do Legado Pontífice
A nova capital do Brasil foi inaugurada. Chovia torrencialmente nas últimas horas de ontem. Ao primeiro minuto da madrugada de hoje, no altar improvisado, à porta de vidro do belo e inacabado do edifício do Supremo Tribunal Federal na Praça dos Três Poderes, o Cardeal Dom Manoel Gonçalves Cerejeira, elevou o Santíssimo à frente da cruz de Frei Henrique de Coimbra, diante da qual foi celebrada a primeira missa no Brasil e a Banda do Corpo de Fuzileiros Navais fez ecoar ao infinito os acordes do Hino Nacional.
Brasília converte-se em capital
Brasília, a mais moderna cidade do mundo, converte-se na manhã deste 21 de abril de 1960 na capital do Brasil. A solenidade culminante das festas organizadas para celebrar, com adequada grandiosidade, o episódio histórico que a nação vive, emocionada e renovada em suas esperanças, está prevista para as 9h30: a instalação simultânea dos Três Poderes.
Brasília, do papel ao concreto
No principio era apenas um sonho. Apenas isso. Brasília há séculos sugerida como imprescindível para o desenvolvimento nacional. Um dia decidiu-se que seria construída à custa de qualquer sacrifício. É feito um plano-piloto, arrojado e prático. Poucos crêem. Poucos lutam. Vem depois a maqueta. Todo mundo vê. Todo mundo gosta. Assenta-se o cruzeiro para ser dita a primeira missa. Dia 2 de maio de 1957. Mais de 15 mil pessoas estão presentes, a maioria para tirar a dúvida. É preciso ver para crer. O plano está indo mesmo. Começa-se a sedimentar no íntimo popular um sentimento de crença ou, pelo menos, de esperança. “Quem sabe se desta vez sai.”
Dia 2 de maio: a primeira sessão da Câmara dos Deputados em Brasília
A primeira sessão ordinária da Câmara dos Deputados em Brasília será realizada no dia 2 de maio próximo. Na sessão do dia 3, entrará em pauta o Plano de Classificação do Funcionalismo da União.
Confusão
Quando o deputado Ranieri Mazzili chegou, com a família e a mobília, ao edifício onde está localizado o seu apartamento, o elevador não funcionava. O parlamentar subiu pelas escadas, acompanhado pela sua família, até o quinto andar, para ver o apartamento. Quando voltou, a mobília tinha desaparecido. Mais tarde, tudo foi esclarecido: o deputado Etelvino Lins, ex-governador de Pernambuco, havia levado, por engano.
Brasil, capital Brasília
No momento em que se consuma a instalação da Capital Federal em Brasília, cerca de 200 mil pessoas se congregam nesta cidade – vindas de todos os quadrantes do país e de fora – para assistir aos atos solenes da inauguração. O papa falará de Roma, diretamente aos brasileiros, lançando sobre a nova capital a primeira bênção litúrgica a uma cidade. O poeta Guilherme de Almeida lerá sua “Prece Natalícia a Brasília” e, simultaneamente, o presidente da República reunirá o Ministério, a Câmara, o Senado e o Supremo Tribunal de Justiça farão sessões de instalação. E, neste dia em que a emoção varre nossa terra de Norte a Sul e os povos do mundo voltam para nós a sua admiração, a cidade de Brasília estará consumando um verdadeiro milagre, convertendo-se na capital do século.
A festa de Brasília começou ontem à tarde na Praça dos Três Poderes
Fora do programa, um candango, Geraldo Petulo de Queirós, usou da palavra, hoje, em frente à Praça dos Três Poderes, precedendo à oração de agradecimento do presidente Juscelino Kubitscheck ao Sr. Israel Pinheiro, ex-presidente da Novacap e primeiro prefeito de Brasília. A solenidade – primeira do programa de festas – teve por escopo a entrega ao presidente da República das chaves de Brasília pelo Sr. Israel Pinheiro. Êste usou da palavra em primeiro lugar; seguiu-se-lhe, extra-programa, o representante dos trabalhadores de Brasília. O discurso do presidente (que publicamos em outro local, juntamente com a oração do Sr. Israel Pinheiro) encerrou a cerimônia. Espetáculo de acrobacia aérea, pontificando as evoluções em flor e em leque da esquadrilha da fumaça, era visto nos intervalos entre um discurso e outro. A manifestação popular que antecipou a solenidade – iniciada pouco antes das 17h30 – foi das maiores que já se presenciou em Brasília.
Seis gaúchos vieram (de carroça) a Brasília; 240 dias de viagem
240 dias e milhares de quilômetros em uma carroça: seis gaúchos vieram a Brasília para assistir aos festejos da transferência da capital. São eles: Francisco Alves, um sul-riograndense de olhos azuis, desempregado e barrigudo, sua esposa e quatro filhos, a maior com sete anos.
“Brasília anula uma mentalidade inadaptável à realidade brasileira, esmaga velhos erros”
Foi o seguinte o discurso proferido pelo Sr. Israel Pinheiro, prefeito de Brasília, na solenidade de entrega da chave da cidade ao presidente Juscelino Kubitscheck, realizada hoje na Praça dos Três Poderes: “Hoje, à meia-noite, Brasília será a Capital da República. Há cento e setenta e um anos, a transferência era sonho patriótico dos Inconfidentes. Há quatro anos, passou a ser preceito constitucional. Há quatro anos, v. exa. dava início à concretização do sonho secular com a “Mensagem de Anápolis”.
JK a candangos: “Fostes os operários do milagre”
No discurso que hoje, dia 20, pronunciou na Praça dos Três Poderes, dirigindo-se aos operários de Brasília, o presidente Juscelino Kubitscheck enalteceu o papel desempenhado pelos denominados candangos na construção da nova capital.
– Meus amigos e companheiros de lutas, soldados da epopéia da construção de Brasília, recebo, profundamente emocionado, a chave simbólica da cidade filha do nosso esforço, da nossa crença, do nosso amor a êste país. Sou apenas o guardião desta chave. Ela é tão minha quanto vossa, quanto de todos os brasileiros. Falei em epopéia e retomo a palavra para vos dizer que ela marcará, sem dúvida, uma época, isto é, “o lugar do céu em que um astro atinge o seu apogeu”. Chegamos hoje, realmente, ao ponto alto da nossa obra. Criando-a, oferecemos ao mundo uma prova do muito que somos capazes de realizar e a nós próprios nos damos uma extraordinária demonstração de energia, e mais conscientes nos tornamos das nossas possibilidades de ação.
Prontos os Ministérios para a inauguração, mas há insuficiência de funcionários
Apesar de, na sua maioria, já terem realizado a mudança de móveis e parte dos seus arquivos, os Ministérios – como é natural – ainda não contam com funcionários em número suficiente para atender suas atividades normais. Com exceção do Ministério da Viação e Obras Públicas, cujos trabalhos de transferência apresentam grande atraso em relação aos demais, cada pasta conta com 20 funcionários, em média, para dar início aos serviços considerados essenciais. Junto ao Ministério da Justiça, que, como os outros, está instalado na Praça dos Três Poderes, já se encontra pronta para funcionar, se necessário, hoje mesmo, a Consultoria Jurídica da Presidência da República, que conta com oito servidores transferidos do Rio para Brasília.
Caravana de governadores
Pouco antes das 17h30 de hoje, chegou ao Aeroporto Internacional de Brasília o avião conduzindo a caravana de governadores. A aeronave, que era aguardada desde as 14 horas, trouxe a bordo os srs. Juraci Magalhães (Bahia), Parsifal Barroso (Ceará), Ponce de Arruda (Mato Grosso), Cid Sampaio (Pernambuco), Chagas Rodrigues (Piauí), Dinarte Mariz (Rio Grande do Norte), Luís Garcia (Sergipe), Moura Carvalho (Pará), e Roberto Silveira (Estado do Rio). Os visitantes seguiram do aeroporto para o Brasília Palace Hotel, onde ficarão hospedados.
Nascimento do Estado da Guanabara motiva novo carnaval dos cariocas
O carioca festejou o nascimento do Estado da Guanabara da maneira mais autêntica possível, com verdadeiro carnaval de rua, revestido de todas as características da grande festa anual que tanto celebrizam esta cidade em todo o mundo e que se constitui na mais típica manifestação de regozijo do povo do Rio de Janeiro. Pouco antes das 22 horas, a Avenida Rio Branco estava repleta de foliões no mesmo tempo em que desfilavam blocos, ranchos e escolas de samba.
Atropelado o deputado
O deputado Clovis Pestana, ex-ministro da Viação, foi atropelado ontem à noite na avenida Central, defronte à Fundação da Casa Popular. Conduzido ao ambulatório do Tapi, o parlamentar foi posteriormente removido para o hospital local, onde ainda se encontra internado.
Entoando o “Peixe Vivo”, JK deixou o Catete
Após abraçar um por um os funcionários da Presidência da República que não seguirão para Brasília, o Sr. Juscelino Kubitscheck desceu hoje, às 9h49, a mesma escada que subiu em 1956, quando assumiu o governo e fechou a porta principal do velho Palácio do Catete. Em seguida, acompanhado pela esposa, filhas e alguns auxiliares, rumou para o aeroporto a fim de embarcar para Brasília.
JK chegou “escondido”
O presidente Juscelino Kubitscheck chegou hoje duas vezes a Brasília: oficialmente às 15h, viajando de automóvel; extra-oficialmente, às 12h30, no “Viscount” presidencial onde viajaram também sua esposa, suas filhas. o vice-presidente, João Goulart, e o ministro Sebastião Pais de Almeida. Entre uma e outra “chegada”, o presidente permaneceu repousando, segundo informações de elementos da comissão de recepção, no sítio do prefeito Israel Pinheiro.
Jornal do Commercio
Participação mundial na festa de Brasília
Lisboa – Os sinos das igrejas repicarão aqui amanhã, ao meio-dia, em homenagem à inauguração de Brasília, a nova capital brasileira. A decisão das autoridades eclesiásticas de ordenar que sejam tocados os sinos em Lisboa e Santarém, onde está enterrado o descobridor do Brasil, Pedro Álvares Cabral, é um indício do orgulho que sentem os portugueses pelo progresso brasileiro. Uma nota da sede do patriarca de Lisboa diz: “Amanhã será inaugurada Brasília, a nova capital do Brasil. Ao Brasil deu Portugal a fé, a língua e o sangue. Assim se estabeleceu uma união que vem desde há cinco séculos e perdura forte e sadia, para recíproco benefício e exemplo universal. Afirmou estas verdades Sua Santidade João XXIII, ao escolher como seu legado um cardeal português, o patriarca português.
“Brasília é a vitória sôbre o impossível”
Declarando que o nome de Brasília já existia na imaginação dos homens da primeira metade do século XIX, o Sr. Ranieri Mazzili, presidente da Câmara, fará hoje, quando da inauguração da nova capital, o seguinte discurso: “Algum fundamento profundo há sempre nas idéias que resistem ao tempo e à transitoriedade dos homens. Trazido até nós, de geração em geração, desde os tempos dos Inconfidentes, o sonho da interiorização da capital brasileira encontrou sempre vozes que lhe deram novo vigor e nova forma, a cada etapa da vida imperial e republicana”.
Presidente saudou “candangos”ontem
Ao receber, ontem, a chave de Brasília das mãos do sr. Israel Pinheiro, o Presidente da República fêz um discurso de elogio aos “candangos”, salientando que aquêles trabalhadores, com o seu esfôrço, foram os “operários do milagre” da construção da nova capital. Disse o Presidente:
– Meus amigos e companheiros de lutas, soldados da epopéia da construção de Brasília, recebo, profundamente emocionado, a chave simbólica da cidade filha do nosso esforço, da nossa crença, do nosso amor a êste país. Sou apenas o guardião desta chave. Ela é tão minha quanto vossa, quanto de todos os brasileiros.
Jornal do Brasil
Brasília é feita capital, Guanabara nasce com festa
Deputados sem terem onde morar em Brasília começam hoje mesmo a voltar ao Rio
Presidente e sua espôsa choram ao deixar o Catete homenageados por crianças
Brasília terá grande influência nos rumos da campanha eleitoral
O Estado da Guanabara despertou com o samba
Trava-se em Brasília a batalha entre virtudes e defeitos
Brasília se inaugura sem depósito de lixo: o que havia virou favela
60 mil favelados em Brasília esperam a sorte que não vem
Brasília e Roma, nascidas na mesma data, se encontram hoje
Lúcio Costa e Niemeyer esquecidos: placa só de Juscelino
Oitocentos policiais fazem o policiamento de Brasília na inauguração
Rio foi 71 anos a capital da República com 25 presidentes
300 mil crianças das favelas não sabem nem escovar os dentes
Há um ano prefeito proibiu nomeação: depois nomeou 3.465
*As bibliotecas da Câmara e do Senado não guardam arquivos da época dos jornais O Globo e O Estado de S. Paulo. Também não foi encontrada a edição do dia 21 da Tribuna da Imprensa, do ex-governador Carlos Lacerda, um dos principais opositores à mudança da capital. O mau estado de conservação da edição do Jornal do Brasil impediu uma leitura mais precisa dos destaques do periódico. Agradecimento especial ao servidor Francisco S. Campelo, do departamento de Microfilmagem da Biblioteca da Câmara.
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