Diversos parlamentares reclamaram, tanto na Câmara quanto no Senado, da ação da polícia no confronto com índios para reprimir protesto contra a proposta que altera o processo de demarcação de terras indígenas. Mas foi a aparição da senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR) em plenário, com direito a cocar típico das comunidades tradicionais, quem roubou a cena na sessão deliberativa desta terça-feira (25).
De cocar na cabeça, Gleisi foi ao microfone com cápsulas de bomba e bala de borracha usadas pela polícia no confronto, quando índios tomaram a área gramada em frente ao Congresso e, depois de tentar entrar nas dependências do Parlamento, foram recebidos com bombas de efeito moral e gás lacrimogênio por tropas de choque. Os indígenas protestavam, entre outras demandas, contra a proposta de emenda à Constituição (íntegra da PEC 215/2000) que, em linhas gerais, transfere do Executivo para os congressistas (deputados e senadores) a tarefa de demarcar terras indígenas.
Leia também
Para a senadora, a ação foi excessiva e desproporcional, uma vez que os indígenas estavam armados de flechas – que foram atiradas e ficaram fincadas no gramado – e sem proteção corporal, enquanto as forças de segurança, além de armas letais, portavam o aparato completo de combate (armas, escudos, capacetes etc). Não houve registro de feridos no confronto, e os índios só se fizeram representar por meio de lideranças no interior do Congresso.
“O que nós assistimos aqui nesse campo de guerra na frente do Congresso Nacional é injustificável. Isso daqui é bomba, isso aqui é bala de borracha, é o pouco que eu trouxe – e tem mais aqui. Os índios foram tratados desse jeito ao chegar perto do Congresso. Falei com os policiais também, para saber qual era a visão deles sobre isso. E disseram que estavam ali defendendo o Congresso”, protestou a senadora petista, dizendo ter usado o cocar a pedido de uma indígena com quem se reuniu mais cedo.
Para Gleisi, o que aconteceu do lado de fora do Congresso é reflexo do governo Michel Temer. “Nós tivemos nove trabalhadores sem-terra assassinados; nós temos agora os índios sendo recebidos à bala; nós temos os movimentos sociais descriminalizados. Que país é esse, que fez uma das Constituições mais avançadas de todos os tempos, a Constituição de 88, e nós estamos tratando os movimentos sociais desta maneira? É incompetência política. Se nós temos a polícia hoje, aqui, recebendo trabalhador, indígena, sem-terra é incompetência política nossa de fazer as mediações necessárias para os direitos de que a sociedade precisa”, acrescentou a parlamentar.
Funai
A senadora fez menção também ao processo de desmonte que, segunda ela, tem sido executado pelo governo para enfraquecer a Fundação Nacional do Índio (Funai). Como este site antecipou em 20 de abril, o ministro da Justiça, Osmar Serraglio (PMDB), decidiu demitir, com o aval de Temer, o presidente da Funai, Antônio Fernandes Toninho Costa, e substituí-lo por um representante da bancada ruralista no Legislativo. A demissão foi exigida pelo líder do governo no Congresso, deputado André Moura (PSC-SE), porque o presidente da entidade responsável pela gestão das terras indígenas não aceitou nomear 25 pessoas indicadas por ele desde que a nova direção tomou posse.
“Não é possível a Funai ser desmontada como está sendo desmontada. As pessoas estão sendo demitidas. O ministro da Justiça tem lado, e não é o lado do povo, não é o lado dos índios. Sequer consegue mediar conflitos, porque ele tem lado – é o lado que mata o índio, que mata o povo. Não é possível que a gente assista a tudo isso e dê esse vexame para o mundo. O Brasil, que já foi um país que teve reconhecimento internacional nas tratativas de vários direitos humanos, agora está aí nessa situação”, acrescentou a senadora.
No instante em que Gleisi se manifestava em um plenário, no outro, o da Câmara, o deputado Vitor Valim (PMDB-CE) também protestou, mas com críticas ao outro lado. O peemedebista elogiou a atuação das forças de segurança e exibiu uma flecha que, segundo ele, foi atirada pelos índios durante o confronto. “Quero lamentar a violência dos índios contra os policiais”, reclamou Valim.