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“Impeachment sem crime de responsabilidade é uma violação das regras do jogo”, enfatizou a presidente afastada, em mais de uma ocasião.
A ida de Dilma ao Senado exigiu uma gigantesca logística de segurança no entorno do Congresso, que está isolado com cercas e aparatos policiais e com acesso restrito ao público. Do lado de fora, o ensaio para as manifestações – pró e contra o impeachment – não mostrou o que será, de fato, a mobilização popular no julgamento final. Mas, no interior do plenário, a movimentada sessão de interrogatório deu vantagem à presidente afastada diante de um grupo de senadores impossibilitados de fazer réplicas – a queixa geral dos adversários de Dilma era de que, sem o contraponto às respostas da mandatária, acabaria por prevalecer a versão dela diante de câmeras de TV e sistemas de rádio.
No começo de seu discurso de defesa, Dilma se colocou na condição de vítima de um grupo político “sem voto” que, encabeçado por seu antigo vice, Michel Temer, queria chegar ao poder pela maneira mais fácil – de maneira a atingir o presidente em exercício, em diversos momentos da sessão a presidente fez questão de lembrar que o impeachment foi patrocinado na Câmara pelo deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), réu em duas ações penais da Operação Lava Jato, e que ele é aliado de Temer e favorece a cúpula peemedebista que ora comanda o país. Dando tom emotivo à fala, apressou-se em dizer que tem defeitos e comete erros – um drible na acusação recorrente de que não os reconhecia –, mas que não praticou qualquer crime. A petista lembrou que resistiu quando foi presa e torturada pela ditadura militar, aos 19 anos, e que não será agora, que é mãe e avó, que cederá a pressões (leia a íntegra do discurso).
“Não posso deixar de sentir na boca novamente o gosto áspero e amargo da injustiça e do arbítrio. Como no passado, resisto. Não esperem de mim o obsequioso silêncio dos covardes”, declarou Dilma, diante de inimigos políticos como Ronaldo Caiado (GO), líder do DEM no Senado, e alguns de seus ex-ministros, como Edison Lobão (Minas e Energia) e Marta Suplicy (PMDB-SP), dois dos seis que votarão a favor do impeachment.
Veja o vídeo com a íntegra do discurso:
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Encorajada pela presença de aliados, Dilma não repetiu a palavra “golpe” por acaso. Afinal, discursou para sua base parlamentar e seus convidados (14 ex-ministros, o ex-presidente Lula e artistas como Chico Buarque e Letícia Sabatella), que foram acomodados nas galerias dos plenário para acompanhar a reta final do julgamento do impeachment do Senado. Representantes do Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra (MST) e do Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST), dirigentes do PT, do PCdoB e do PT e de centrais sindicais, além de assessores, também foram ao Congresso na comitiva da petista.
Ao final da maratona de perguntas dos senadores, Dilma ainda teve de ouvir a acusação se manifestar por cinco minutos, função que coube à advogada Janaína Paschoal e ao jurista Miguel Reale Júnior, que dividiram esse tempo para dirigir questionamentos à presidente. Advogado de Dilma, José Eduardo Cardozo abdicou do direito de falar no final da sessão e abriu caminho para o pronunciamento final da petista.
“Nós já temos maturidade suficiente para superar esse processo”, concluiu.
Observadores da cena política dão como certa a derrota de Dilma no julgamento final previsto para ser iniciado nesta terça-feira (30) – tese reforçada em sinais como o do ex-petista Cristovam Buarque (PPS-DF), que antes se dizia indeciso, mas agora parece irreversível na defesa do impeachment. Do outro lado, há nos aliados da presidente a esperança de que a velha fórmula da negociação política se imponha para reverter votos em cima da hora. Como este site mostrou mais cedo, o PT ainda tenta uma última cartada: nessa reta final do julgamento, dirigentes e parlamentares petistas e membros de partidos aliados estão oferecendo espaços de poder para tentar conseguir pelo menos seis votos de senadores ainda indecisos. As tratativas envolvem as eleições municipais de outubro e a disputa geral para o Congresso, assembleias legislativas e governos estaduais – além da própria Presidência da República – de 2018.