Diante de um plenário lotado por parlamentares tucanos e aliados de campanha, o senador Aécio Neves (PSDB-MG) voltou à tribuna do Senado e deu um ultimato à presidenta Dilma Rousseff, que o derrotou nas urnas no último dia 26: a oposição só negocia se houver punição aos responsáveis do esquema de corrupção bilionário instalado na Petrobras. Além disso, avisou Aécio, todo e qualquer diálogo com o governo só se dará mediante apresentação de propostas voltadas “aos interesses brasileiros”.
“Os fatos falaram mais alto. Os que foram intolerantes durante 12 anos agora falam em diálogo. Pois bem, qualquer diálogo estará condicionado ao envio de propostas que atendam aos interesses dos brasileiros. E, principalmente, chamo a atenção desta Casa e dos brasileiros para o que vou dizer: qualquer diálogo tem que estar condicionado, especialmente, ao aprofundamento das investigações e exemplares punições àqueles que protagonizaram o maior escândalo de corrupção da história desse país, já conhecido como petrolão”, discursou Aécio, interrompido por aplausos.
Leia também
Para Aécio, o caso só veio à tona depois dos depoimentos de dois dos artífices das irregularidades na estatal – o ex-diretor de Abastecimento Paulo Roberto Costa e o doleiro Alberto Youssef, acusado de lavar no exterior o dinheiro desviado dos cofres públicos. Segundo o senador, a verdade sobre o escândalo apareceu justamente em razão da delação premiada a que ambos se submeterem para diminuir suas eventuais sentenças judiciais – jogando por terra, acrescentou Aécio, “todo o esforço” do governo para “inibir as investigações” das CPIs instaladas no Senado.
As críticas à economia foi um dos pontos fortes do pronunciamento. Depois de reafirmar ter sido vítima do “vale-tudo eleitoral” do PT, o senador mineiro disse que o governo fez, “três dias depois” do segundo turno, o que disse que ele faria caso tivesse sido eleito. Apontando o crescimento do déficit comercial, o “rombo” das contas externas e a consequente redução das taxas de investimento, ele acusou o governo de não ter se preparado “para controlar a inflação e recuperar o controle fiscal”. “Mas a história, rapidamente, mostrou quem tinha razão. Esconder, camuflar virou a rotina deste governo”, disse.
“Chegamos à menor taxa de investimentos da nossa economia das últimas décadas, apenas 16,5% do PIB. A candidata oficial também negou perante todo o Brasil a necessidade de reajustar as tarifas públicas, e acusou a minha candidatura de o estar preparando, caso vencêssemos as eleições. Pois bem, a presidente já está fazendo aquilo que disse que não faria. Na próxima semana, teremos o aumento da gasolina e, já nesta semana, tivemos aumento de tarifas de energia, que sofrerão reajustes que simplesmente anulam toda a redução obtida com a truculência da intervenção havida no setor elétrico. Isso sem falar na ameaça estampada nos jornais de hoje, de que no verão nos esperam apagões de energia”, declarou.
O pronunciamento teve início por volta das 16h, e durou cerca de 40 minutos. Ao todo, a sessão reservada ao discurso do senador tucano se estendeu até as 18h. Em seguida, Aécio recebeu apartes de 18 colegas, apenas dois deles de campo político oposto – o líder do PT no Senado, Humberto Costa (PE), e o senador Eduardo Suplicy (PT-SP).
“Strip-tease moral”
O primeiro a apartear Aécio foi o senador Magno Malta (PR-ES), que chegou a cogitar, no final do ano passado, disputar a corrida presidencial. Dizendo ser um dos “51 milhões” que votaram no tucano, o senador capixaba também criticou a campanha de Dilma, que teria contas a acertar com o povo “daqui a quatro anos”.
“Que paguem a conta aqueles que, depois de entenderem que pegaram parte do Brasil, dos nossos irmãos mais simples, pelo estômago, disseram: ‘Agora, pelo estômago, nós os pegamos; agora nós podemos fazer strip-tease moral em praça pública, às 10 horas da manhã, que está tudo dominado e ganharemos qualquer eleição’”, discursou Magno.
Mas foi o segundo aparte o único a contestar as palavras de Aécio – a ponto de ser vaiado pelos tucanos e parte das galerias superiores do plenário, reservadas a visitantes. Para Humberto Costa, não foi só Aécio o alvo de ataques de adversários durante a campanha.
“A presidenta Dilma foi vítima, também, de agressões violentíssimas. E não são apenas dessa campanha, são de quatro anos de governo. No Brasil, talvez apenas Getúlio Vargas e João Goulart tenham sido submetidos ao cerco a que essa mulher foi submetida, ao longo desses quatro anos, pela oposição, que é seu papel; pela mídia, a quem não caberia fazer; e também por muitos e muitos outros”, disse o petista, referindo-se a dois ex-presidentes da República. “O ódio que foi gerado nessa eleição está permitindo que alguns façam a defesa da volta da ditadura militar, a defesa odiosa e discriminatória contra o povo do Nordeste, quando não foi só o Nordeste que elegeu a presidenta Dilma. O Rio, Minas Gerais, de vossa excelência, e outros estados também.”
O senador pernambucano também reclamou, sem citar nomes, da reportagem da revista Veja cuja edição foi antecipada em dois dias, antes das eleições, com acusações a Dilma e o ex-presidente Lula – segundo a publicação, Youssef disse, em depoimento, que ambos sabiam do esquema de corrupção na Petrobras. Mas Humberto também tentou o discurso da conciliação.
“É preciso, nessa hora, nós desmontarmos os palanques. A oposição precisa ter a visão clara de que há muitas coisas que nós temos que trabalhar, inclusive em conjunto”, ponderou Humberto Costa.
Saia justa
Mas foi a intervenção de Cyro Miranda (PSDB-GO), correligionário de Aécio, que abordou um dos assuntos mais delicados da campanha presidencial – e, para Cyro, usado como estratégia de desconstrução do PT. O senador goiano também condenava a postura do partido quando foi além e lembrou como Aécio foi, em sua opinião, “achincalhado” pelos adversários: ele chegou a lembrar que o colega havia sido acusado de “bater em mulher”. “Vossa excelência não foi fruto de marqueteiro”, alfinetou o tucano.
Além de Humberto Costa, Cyro Miranda e Suplicy, também apartearam Aécio nomes como Cristovam Buarque (PDT-DF), Ana Amélia (PP-RS), Cássio Cunha Lima (PSDB-PB), Pedro Taques (PDT-MT) e Romero Jucá (PMDB-RR). À exceção de Suplicy, todos reafirmaram o apoio a Aécio no retorno ao Senado e o elogiaram pela postura durante a campanha.
Mas não só senadores da atual legislatura estiveram no Senado durante o pronunciamento de Aécio. O prefeito de Manaus, Arthur Virgílio (PSDB), ex-senador, acompanhou todo a fala do colega, ao contrário do que fizeram o governador reeleito do Rio de Janeiro, Luiz Fernando Pezão (PMDB), e o colega Tarso Genro (PT), governador do Rio Grande do Sul; e os prefeitos de São Paulo, Fernando Haddad (PT), e do Rio de Janeiro, Eduardo Paes (PMDB). Esses se refugiram no cafezinho do plenário ou participavam de reuniões com o presidente da Casa, Renan Calheiros (PMDB-AL), no momento do discurso.
Dilma sobre a oposição: “É preciso saber perder”
Após derrota, Aécio é recebido por tucanos no Senado como “presidente”