Lúcio Vaz
Pelo menos 56 assessores parlamentares contribuíram com doações para a campanha de seus respectivos senadores nesta eleição. Juntos, eles doaram cerca de R$ 230 mil para os seus chefes. O maior beneficiário foi o senador Mário Couto (PSDB-PA), que arrecadou R$ 71 mil entre nove funcionários – tudo em espécie. O valor corresponde a um quinto do total informado pelo tucano na segunda parcial de sua prestação de contas divulgada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Apesar do esforço dos assessores, o senador não conseguiu se reeleger.
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As maiores contribuições para Mário Couto foram feitas por Hanny dos Santos e Paulo Roberto Pena. Com salários de R$ 12,8 mil, eles doaram R$ 12 mil cada. Hanny afirma que a sua doação foi totalmente espontânea. “E acredito que a dos outros também”, disse. Segundo ela, a contribuição não prejudicou o seu orçamento, apesar de ter sido um valor maior do que o seu salário líquido. “Tenho umas economias”, justifica.
A assessora explica por que fez a doação: “Era uma questão de honra a reeleição do senador, com quem trabalho desde 2003. A minha doação foi mais uma forma de demonstrar a minha gratidão por ele. Fiz e faria tudo de novo”.
A existência da caixinha eleitoral no Parlamento é o principal destaque da Revista Congresso em Foco, cuja 13ª edição começa a circular. O valor das contribuições e o total de senadores beneficiados podem ser ainda maiores, já que o levantamento foi feito antes da prestação final de contas dos candidatos. Os parlamentares têm até 4 de novembro para entregar os dados ao TSE. A reportagem, no entanto, revela que essa prática foi bastante comum entre os congressistas nessa eleição.
As doações por assessores não são vedadas pela legislação eleitoral, mas representam uma vantagem dos parlamentares em relação a candidatos que não detêm mandato. Por lei, pessoa física pode doar valor correspondente a até 10% dos rendimentos que declarou à Receita Federal no ano anterior.
Vaquinha
A prática foi pulverizada em oito partidos. No PTB, três parlamentares receberam contribuições de funcionários. No gabinete de Mozarildo Cavalcanti (PTB-RR), também derrotado na tentativa de reeleição, houve praticamente uma “vaquinha”, com doações a partir de R$ 240. Alguns servidores optaram por parcelar a despesa.
Autor da maior doação, Francisco de Araújo deu R$ 1,4 mil em 16 de julho e repetiu a dose em 15 de agosto. No total, R$ 13,6 mil caíram na conta de campanha do senador, que arrecadou apenas R$ 120 mil, de acordo com a segunda parcial.
O ex-presidente da República Fernando Collor (PTB-AL), reeleito senador, apresentava em sua conta de campanha o valor acumulado de R$ 831 mil, conforme a parcial divulgada em setembro. Desse total, R$ 500 mil saíram dos cofres do Diretório Estadual do PTB e R$ 200 mil do próprio bolso. Ainda assim, o assessor Tarso de Lima Sarmento doou R$ 14,6 mil em valores estimados.
Dois assessores do gabinete do senador Gim Argello (PTB-DF), que não foi reeleito,fizeram doações num total de R$ 12,6 mil. Anicélia de Abreu doou R$ 3,6 mil em valores estimados. Ela cedeu um automóvel de sua propriedade para a campanha do senador. Celso Antônio Menezes, técnico legislativo do Senado, contribuiu com mais R$ 9 mil em valores estimados.
Ele também cedeu um veículo para a campanha e doou força de trabalho fora do expediente do gabinete como assessor jurídico da campanha. O gabinete afirma que os dois servidores são filiados ao PTB e as doações foram espontâneas.
Promessa de pagamento
O senador Ataídes Oliveira (Pros-TO) bancou com recursos próprios 88% da sua campanha, que arrecadou pouco mais de R$ 1,5 milhão até setembro, segundo relatório do TSE. Recebeu apenas 3,5% dos votos na disputa pelo governo de Tocantins. Ele disse ter ficado surpreso com a doação de R$ 11,1 mil em valores estimados feita pela assessora Dinikelly Geyser. “Foi feita sem o meu conhecimento. Já pedi para retirar da prestação de contas. Não tinha autorização e não concordo com isso. Eu banquei quase toda a nossa campanha. De repente, aparece isso. Deve ter sido para acertar algum valor”.
Questionado se seria correto receber doações de funcionários do gabinete, Ataídes respondeu: “Não acho errado, acho desnecessário”. O senador foi alertado que a doação foi em valor estimado e que o serviço já foi prestado. Assim, haveria apenas duas opções: ou a doação ou o pagamento pelo serviço. “Então, ela vai receber”, disse prontamente.
Indignada
Reeleita senadora numa disputa apertada com o deputado Eduardo Gomes (SD), a senadora Kátia Abreu (PMDB-TO) teve uma campanha milionária. Arrecadou mais de R$ 3 milhões, sendo R$ 950 mil só da empreiteira OAS. Mas contou também com a modesta ajuda da assessora Josefa Pereira, que doou R$ 3 mil em espécie e R$ 4 mil em valores estimados. “Doei um carro Fiesta de minha propriedade, que ficou à disposição da campanha no período de 5 de agosto a 5 de outubro do corrente ano”, explicou Josefa.
A assessora ficou indignada com os questionamentos enviados pela reportagem. “A despeito da minha indignação com a invasão de privacidade e com a maledicência das perguntas, esclareço que não sou filiada a nenhum partido político. Jamais fui vítima de achaque. Fiz doações espontâneas, obedecendo a princípios éticos e dentro da lei. Os valores doados foram livremente estabelecidos por mim, dentro de minhas posses. Sou uma mulher livre, independente, com uma aposentadoria da Secretaria de Fazenda de Goiás e que trabalha muito como funcionária do Senado”.
O senador Inácio Arruda (PCdoB-CE) contou com uma boa ajuda do partido na tentativa de se eleger deputado. Recebeu R$ 200 mil do Diretório Estadual e R$ 400 mil do Diretório Nacional, num caixa que totalizou R$ 757 mil até a segunda parcial. Obteve doações de três assessores no valor total de R$ 4,5 mil. E perdeu a eleição.
Dinheiro vivo
A maior transferência no Senado foi feita pelo analista legislativo Matias Batista, funcionário do gabinete do senador Marcelo Crivella (PRB-RJ), candidato ao governo do Rio de Janeiro. Com salário superior a R$ 20 mil, Matias contribuiu com R$ 25 mil em dinheiro vivo no dia 5 de agosto. Ao todo, quatro assessores reforçaram em R$ 50 mil o caixa de campanha do senador. Crivella não quis comentar o assunto. Disse apenas que todas as doações feitas à sua campanha estão de acordo com a legislação eleitoral.
Eleito no primeiro turno para o governo do Piauí, o senador Wellington Dias (PT) recebeu um total de R$ 26 mil de 17 dos seus assessores de gabinete – uma ajuda modesta perto do total arrecadado até o segundo relatório parcial: pouco mais de R$ 1 milhão. Os servidores doaram R$ 18,6 mil em dinheiro ou em cheque. O restante foi em valor estimado. A maior contribuição em dinheiro foi feita por Maria Regina Sousa: R$ 9 mil, valor próximo do seu salário.
O senador Rodrigo Rollemberg (PSB-DF), eleito governador no segundo turno, recebeu doações em valores estimados de quatro assessores, num total de R$ 20,4 mil. A maior delas foi de Maria Valéria Vasconcelos, no valor equivalente a R$ 7,5 mil, relativo ao serviço voluntário como administradora financeira da campanha. As outras contribuições correspondem à cessão de veículos de propriedade dos assessores, colocados à disposição da campanha. A avaliação desses bens representa o custo do aluguel de carros semelhantes. Segundo a assessoria de Rollemberg, como os servidores não realizaram doações em espécie, não houve comprometimento dos seus orçamentos.
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Leia a íntegra da reportagem na Revista Congresso em Foco (só para assinantes da revista e do UOL)
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