A preocupação do governo em apertar o cinto das contas públicas terá um elemento extra além das greves do funcionalismo em expansão em todo o país. Tramita na Comissão de Finanças e Tributação (CFT) da Câmara o Projeto de Decreto Legislativo (PDC, por ser da Câmara) 558/2012, de autoria do deputado Edinho Araújo (PMDB-SP), que pretende derrubar uma portaria interministerial impedindo transferências da União inferiores a R$ 250 mil para a execução de obras e serviços de engenharia, a título de emendas parlamentares individuais. A intenção do governo é evitar a pulverização do recurso público, com a liberação de dinheiro para emendas que só atendem aos interesses políticos pessoais do parlamentar, e não a eixos planejados de investimentos do governo federal.
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A restrição de gastos da portaria está expressa em seu artigo 10º: “É vedada a celebração de convênios: I – com órgãos e entidades da administração pública direta e indireta dos Estados, Distrito Federal e Municípios cujo valor seja inferior a R$ 100.000,00 (cem mil reais) ou, no caso de execução de obras e serviços de engenharia, exceto elaboração de projetos de engenharia, nos quais o valor da transferência da União seja inferior a R$ 250.000,00 (duzentos e cinquenta mil reais)”, diz o documento.
Segundo o entendimento do Executivo, as chamadas “emendas pulverizadas”, que têm valores reduzidos e são usadas por parlamentares para agradar a prefeitos aliados em suas bases eleitorais, estão proibidas desde 1º de janeiro, quando entrou em vigor a portaria assinada pela Controladoria-Geral da União (CGU) e pelos Ministérios do Planejamento e da Fazenda.
Desde então, iniciou-se a queda de braço. Na via oposta, parlamentares conseguiram aprovar, em 17 de julho, a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) deste ano derrubando a fixação daquele limite mínimo para os repasses governamentais (R$ 250 mil). Por sua vez, ao sancionar a LDO, a presidenta Dilma Rousseff vetou o trecho da lei que permitia a pulverização dos recusos e manteve o limite estabelecido pela portaria.
A interferência de Dilma está registrada em edição extraordinária do Diário Oficial publicada na última sexta-feira (17), por ocasião do encaminhamento da proposta de lei orçamentária para 2013 ao Congresso. Na razão do veto aos dispositivos do artigo 58 da LDO, que anulam os efeitos da portaria, a presidenta explica: “Não se justifica a proibição ao estabelecimento de valores mínimos para a realização de convênios e contratos de repasse, hoje estabelecida no Decreto no 6.170, de 25 de julho de 2007, dado que as transferências voluntárias em valores reduzidos provocam altos custos de acompanhamento e de controle”.
Derrubar a portaria
Feito o movimento de Dilma com o veto, a vez agora é dos parlamentares. Em resposta, um grupo capitaneado por Edinho Araújo, responsável pelo PDC 558, pretende derrubar os efeitos da portaria e, ato contínuo, o veto de Dilma. A matéria – também distribuída à Comissão de Constituição de Justiça (CCJ), onde serão examinados seus preceitos constitucionais e regimentais – teve relatoria atribuída ao deputado oposicionista Arnaldo Jardim (PPS-SP), membro suplente da CFT, e está em fase inicial de tramitação. A próxima reunião deliberativa da comissão está agendada para o próximo dia 22.
O PDC (confira a íntegra) está em regime de tramitação ordinário (sem urgência) e não terminativo (obrigatoriamente sujeito à apreciação do plenário). O relatório a ser apresentado por Arnaldo Jardim na CFT está em fase de elaboração e, segundo o próprio deputado, ficará pronto até o fim de agosto. O deputado adiantou ao Congresso em Foco que acatará a demanda de Edinho Araújo, e que pesquisou a legislação referente ao assunto (repasse de verbas, via emenda parlamentar, por parte da União) para elaborar um parecer favorável com fundamentação técnica.
“O Executivo vai além do que determina a lei. Minha posição é de acatar aquilo que foi proposto pelo deputado Edinho Araújo. O Executivo não pode agir isoladamente”, declarou Arnaldo Jardim.
Confronto de legislações
A portaria interministerial foi orientada pelo governo sob o argumento, entre outros, de que o Brasil precisa priorizar os “projetos estruturantes” – empreendimentos portuários e aeroportuários, hidrelétricos e rodoferroviários, por exemplo, muitas dessas obras no âmbito do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Tais projetos são essenciais ao desenvolvimento econômico face às restrições orçamentárias e ao desafio da crise financeira internacional, alega o Planalto. A pulverização de recursos da União, nesse sentido, estaria na contramão das medidas de arrocho financeiro implementadas pelo governo.
Confira a íntegra da Portaria Interministerial nº 24 de novembro de 2011
Em outras palavras, o Planalto considera desperdício o repasse fracionado de recursos para livre aplicação por parte de parlamentares, bem como despropositada a sua aplicação em obras cuja execução caberia às administrações municipais. Além disso, o fracionamento dos recursos dificulta a fiscalização devido à divisão dos repasses, avalia o governo. Sobre as razões daquele veto à LDO, a Secretaria de Comunicação da Presidência já adiantou que não comenta os eventuais vetos presidenciais, nem as matérias sob apreciação da presidenta.
Sem limite
Para invalidar a portaria interministerial e apontar sua inadequação legal, Edinho Araújo recorreu à Consultoria de Orçamento e Fiscalização Financeira da Câmara. O deputado peemedebista encaminhou aos técnicos da Casa, em abril deste ano, uma solicitação de trabalho (nº 223/2012) que acabou por apontar “a ilegalidade do dispositivo que estabelece restrições às transferências voluntárias da União” – as tais emendas parlamentares individuais. Cada parlamentar tem direito a indicar, anualmente, R$ 13 milhões cada um em emendas individuais.
“A Lei nº 12.465, de 12 de agosto de 2011, LDO [Lei de Diretrizes Orçamentárias] em vigor, cuida das transferências voluntárias, nos limites impostos pela LRF [Lei de Responsabilidade Fiscal], nos artigos 36 a 43 e 107 e 108. Em nenhum desses dispositivos é tratada a questão do limite mínimo de transferência da União”, diz o relatório.
Para Edinho Araújo, trata-se de “preconceito” e interferência indevida do Executivo na relação entre parlamentares e gestores regionais. “Eu sou contra, por princípio, todas as emendas parlamentares. Agora, restringir isso prejudica enormemente os municípios. Uma vez havendo emenda, restringi-la é uma discriminação contra os pequenos municípios, que necessitam de recursos do governo federal para poder prestar sua assistência à população”, arremata o peemedebista, para quem o instrumento da emenda parlamentar é “muita papelada”. “É uma burocracia muito grande.”