O plenário da Câmara aprovou em primeiro turno nesta quarta-feira (7), por 433 votos a 16, o texto-base da proposta de emenda à Constituição (PEC 199/16) que autoriza a quem tiver mantido qualquer modalidade de relação trabalhista com os ex-territórios de Roraima e do Amapá a optar pelo vínculo ao quadro em extinção do governo federal, caso tal ligação tenha ocorrido entre a data da transformação, em estado, do ente federativo em questão (entre outubro de 1988 e outubro de 1993). A sessão foi conduzida pela deputada Mariana Carvalho (PSDB-RO), numa concessão do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-GO), a quem a tucana agradeceu ao final da deliberação.
Ainda resta a análise de emendas apresentadas ao texto principal. Mas, por meio de acordo de lideranças, o exame dos dispositivos será realizado na próxima semana. Entre eles, os que foram sugeridos pela relatora da PEC em comissão especial, deputada Maria Helena (PSB-RR), com possibilidade de alteração do conteúdo já aprovado. Deputados de Rondônia também vão tentar incluir servidores do estado entre os contemplados pelas diretrizes da PEC.
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Maria Helena explica a necessidade de alterações na Emenda Constitucional 19, de 1998: são muitos os casos em que trabalhadores mantiveram relações de trabalho com os respectivos governos estaduais recentemente instalados à época – ou seja, um contexto em que “difíceis e precárias condições de funcionamento da administração tornaram pouco convencionais as formas de retratar e comprovar vínculos e relações de trabalho havidas entre fins da década de 1980 e início da de 1990”.
Segundo a ementa da PEC, altera-se a Constituição “para prever a inclusão, em quadro em extinção da administração pública federal, de servidor público, de integrante da carreira de policial, civil ou militar, e de pessoa que haja mantido relação ou vínculo funcional, empregatício, estatutário ou de trabalho com a administração pública dos ex-Territórios ou dos Estados do Amapá ou de Roraima, inclusive suas prefeituras, na fase de instalação dessas unidades federadas, e dá outras providências” (leia a íntegra da proposta).
Foco no TSE
A relativamente tranquila aprovação da matéria transcorreu em um cenário de protestos recorrentes da oposição contra o presidente Michel Temer, cujas atenções estão voltadas para o julgamento, no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que pode lhe tirar o mandato. Não à toa o quórum de votação tão elevado (449 dos 513 deputados): a palavra de ordem na base governista é dar ares de normalidade aos trabalhos legislativos – uma vez que, no campo jurídico, é difícil a situação de Temer, formalmente investigado por corrupção passiva, associação criminosa e obstrução de Justiça.
Ao mesmo tempo em que a sessão era realizada, parlamentares oposicionistas, independentes e centrais sindicais lançaram uma frente parlamentar suprapartidária para defender as eleições diretas para presidente da República, como este site mostrou mais cedo. Embora reconheçam a dificuldade em mudara a Constituição com uma minoria parlamentar, os oposicionistas pretendem fomentar a mobilização popular contra Temer, a quem acusam de ter orquestrado um golpe, com viés de impeachment, contra a ex-presidente Dilma Rousseff.
A despeito do levante oposicionistas e dos diversos pedidos de impeachment protocolados na Câmara, Temer ainda conta com o apoio de Maia e do presidente do Senado, Eunício de Oliveira (PMDB-CE), fiadores de sua política de reformas estruturais – e, como Temer, investigados na Operação Lava Jato. Até que o julgamento no TSE seja concluído, partidos importantes da base, como PSDB e DEM, dizem preferir esperar os desdobramentos da crise antes de decidir por um eventual desembarque do governo.
Penúltimo passo
Na condição de relatora da PEC 199/16, Maria Helena lembrou que o impasse em relação aos servidores aguardava resolução há muito tempo. “Esses servidores merecem o nosso esforço, porque deram seu sangue para construir nossos estados. Houve discriminação desses trabalhadores. Todas as normas que já tentamos para resolver a questão não foram efetivas”, declarou, mencionando outras duas emendas constitucionais, de 1998 e 2014.
Como lembra a Agência Câmara, a proposta constou das articulações para definição da pauta por diversas vezes, mas sua tramitação jamais foi concluída em plenário. Agora, ressalta a deputada Janete Capiberibe (PSB-AP), a primeira fase da votação já está superada. “Lutamos para manter essa proposta na pauta e, finalmente, veremos aprovada”, disse Janete. Para os defensores da PEC, o desafio é a aprovação da matéria em segundo turno, quando novamente serão exigidos ao menos 308 votos.
Presidente da comissão especial da Câmara que examinou a PEC, Hiran Gonçalves (PP-RR) agradeceu o empenho das bancadas pela aprovação do texto. “A PEC resgata a dignidade de todos os servidores que construíram os estados de Roraima e Amapá”, afirmou.
Divergência
Mas houve quem tenha apontado problemas na proposta e, nesse sentido, insistindo na necessidade de aperfeiçoamento do texto por meio da aprovação das emendas à espera de análise. Para Edmilson Rodrigues (Psol-PA), servidores que não atendem aos critérios descritos na PEC podem ser por ela contemplados. Ele e seu companheiro de partido Chico Alencar (Psol-RJ) tentaram obstruir a votação e ressaltaram não ser contra o texto, mas contra a extrapolação dos propósitos da matéria.
“Aqui se pretende dar estabilidade para quem não tinha direito, para quem entrou depois de 1988 ou entrou em uma estatal ou autarquia, municípios, e isso não é possível”, destacou Edmilson, sinalizando a importância da votação da próxima semana.
Antes do anúncio da aprovação da matéria, Chico Alencar fez questão de mencionar o momento em que ela é levada ao plenário. “Inclusive a PEC foi feita originalmente pelo senador Randolfe Rodrigues [Rede-AP], quando era nosso filiado, mas estamos em obstrução pedindo a retirada do presidente da República. Não podemos votar como se vivêssemos em normalidade”, protestou o parlamentar fluminense.