Definindo-se como um político “de esquerda” por não estar satisfeito com o “estado de coisas” do país, Cristovam já está em ritmo de pré-campanha pelo país, a cerca de três anos do pleito majoritário. Em 2015, o senador já visitou diversas capitais do país, onde suou a camisa em discursos e debates com correligionários pedetistas. No último fim de semana, segundo sua assessoria, percorreu mais de mil quilômetros e foi a seis cidades do Rio Grande do Sul, berço do trabalhismo, onde dispõe de apoio significativo do PDT local.
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Contrário à filiação dos irmãos Ciro e Cid Gomes, também ex-ministro e ex-governador do Ceará, Cristovam diz já estar preparado para o estilo explosivo de ambos – para exemplificar, nas respectivas solenidades de filiação, Cid chamou o vice-presidente da República, Michel Temer, de “chefe de quadrilha”, enquanto Ciro classificou o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), de “maior vagabundo de todos”. Mas o senador deve se preocupar especialmente com Ciro, com quem terá de disputar a preferência do PDT.
Para Cristovam, a filiação dos irmãos Gomes ao PDT é uma prova da “submissão” de Lupi ao ex-presidente Lula e uma maneira de promover a reaproximação entre a sigla, uma das rebeldes da base aliado, e o PT. Questionado sobre como lidará com o gênio do ex-ministro da Integração Nacional no governo Lula, o senador foi fiel ao próprio estilo. “Eu preferia que você perguntasse a ele como é que, com o espírito aguerrido dele, vai enfrentar um diplomático. Eu não vou mudar meu estilo. Não consigo, aliás, mudar meu estilo. E não vejo por que mudar. Eu vou continuar nesse estilo de composição, de compromisso, de diálogo. E falando manso, como dizem”, declarou.
Cortejado por partidos como PPS, que lhe ofereceu legenda para disputar o cargo que pretender (Cristovam é recorrentemente cogitado para o Governo do Distrito Federal), e a Rede Sustentabilidade, o senador faz da federalização da educação e do trabalhismo suas principais bandeiras na corrida presidencial. Ex-governador do Distrito Federal pelo PT entre 1995 e 1999, quando criou o Bolsa-Escola, Cristovam diz que a presidenta Dilma Rousseff repete o mesmo erro do ex-presidente Fernando Collor, cassado em 1992, ao não apostar no diálogo para governar.
“O PT só quer ouvir quem é da patota”, lamentou o senador, membro do grupo suprapartidário de senadores que, no começo do ano, foram levar sugestões para que Dilma conseguisse retomar a governabilidade. Decepcionado com a recepção, ele diz que a petista não é propensa ao diálogo e prefere negociar cargos para manter as relações com os partidos da base aliada – a entrega do Ministério das Comunicações ao deputado e colega de partido André Figueiredo (PDT-CE), nas palavras do próprio Cristovam, foi mera “negociata”.
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Na condição de independente em relação à base aliada, Cristovam não raro assume o papel de oposição ao governo no Senado. No entanto, ele diz não ser favorável ao impeachment de Dilma sem provas de que ela cometeu crime que justifique a medida extrema.
“Eu vou ficar muito constrangido se descobrir-se que a Dilma tem crime e eu ter que votar pelo impeachment e ficar na História como um parlamentar que votou para derrubar uma presidente eleita. Se ela tiver envolvida, comprovadamente, em crime. Se ela não tiver, eu não votarei – mas, aí, vai ser muito ruim mais três anos de governo Dilma”, vislumbrou.
Segundo Cristovam, a crise em que o PT mergulhou está relacionada à “acomodação” de suas lideranças. “Quando eu saí do PT, em 2005, quando estava já começando o mensalão, eu disse: ‘Eu saio porque o PT perdeu o vigor transformador’ – porque o compromisso ético perdido é de alguns, não é do partido. Até hoje eu ainda sinto que a militância petista, a nação petista, é um pessoal correto, descente. O Estado petista é que se corrompeu muito”, opinou.
À parte o passado petista, Cristovam já havia deixado claro, em setembro, em sua conta no Twitter, a pretensão de disputar a Presidência contra o principal nome do PT, caso a possibilidade se confirme. “Ciro Gomes disse não querer enfrentar o Lula em 2018, pelo PDT, e eu gostaria de enfrentar o Ciro [junto à militância] para ser o candidato do PDT”, escreveu o senador. Em 2006, Cristovam concorreu ao Palácio do Planalto. Ficou na quarta colocação, com 2,6 milhões de votos (2,64% dos votos válidos). Durante a campanha, manteve a educação, sua principal bandeira na política, como grande mote.
Confira a íntegra da entrevista:
Congresso em Foco – O senhor está pronto para disputar a Presidência da República?
Cristovam Buarque – Estou pronto para disputar por uma razão muito simples: nenhum político tem o direito, neste momento, de dizer que fica de fora. Nós temos duas crises muito profundas: uma crise circunstancial, conjuntural, momentânea, que é a inflação, o déficit fiscal, a desarrumação que o país vive, que é a recessão; e temos uma outra, que é a arrumar a casa do Brasil e construir um Brasil diferente. Esse Brasil diferente, a meu ver, terá que seguir, por exemplo… Em vez de apenas ter transferências de renda da Bolsa Família, ter programas de emancipação dos pobres; trabalhar projetos que façam com que, enquanto uma família precisar de bolsa, vai ter, mas só vamos comemorar quando nenhuma precisar. Segundo: a economia tem que dar um salto não apenas para crescer, mas para mudar de cara. Não apenas para aumentar o PIB [Produto Interno Bruto], mas ter um PIB diferente. Um PIB que não seja baseado no agronegócio, na indústria metalomecânica, mas baseado nas indústrias de alta tecnologia, que é o que realmente gera renda para um país. Terceiro: um país onde a democracia funcione. Isso quer dizer partidos organizados, com base ideológica, com regras éticas para todos os seus militantes, para todos os seus dirigentes, sobretudo. E que, também, este país seja capaz de ter uma estabilidade monetária, que nós estamos perdendo. Essas quatro pilastras têm que, obviamente, trazer uma porção de outras preocupações, como a violência, que está por aí; como a Previdência, que está quebrada; como o fato de sermos um país que vive mais para pagar as dívidas do passado – inclusive com os pobres, com os velhos – do que para pagar o novo, que são as crianças, que é a infraestrutura. E, além disso, o que eu acho que eu traria de diferente é que tudo isso, para mim, virá, sobretudo, da educação. A educação não é a única preocupação que o país deve ter, de maneira alguma. Até porque ela não funciona se não tivermos uma economia sólida, um estado eficiente. Mas o motor, o vetor, o que transforma um país é a educação. Não é mais a terra, como no começo da colonização, em que bastava a terra fértil em que a gente jogava a semente e, ali, em se plantando tudo dava. Não. Agora, em se plantando não dá tudo, porque precisa de tecnologia, de ciência, de formação. Precisa trabalhar os neurônios, e não a terra.
Foi o grande erro do Lula estimular o consumo, a liberação de crédito, e não dar atenção assim à produção de conhecimento, ao estímulo à ciência e à tecnologia?
Não tenho a menor dúvida de que foi um dos grandes erros dele, e eu o critiquei na época. Eu dizia o tempo todo. Quantas vezes fiz discursos dizendo que o país não vai para frente se não for capaz de poupar – e um país não poupa se consome quase tudo. É claro que, se não consome, a economia não se desenvolve no mercado de bens de consumo, mas pode se desenvolver no mercado de bens de capital. Tem gente que diz: “Mas se não se compra, como é que a gente vai ter crescimento”? É fazer produtos chamados “ferramentas”, fazer infraestrutura – isso também dinamiza a economia. Não é só sapato que dinamiza a economia. O Estado também demanda. O capitalista demanda quando ele compra uma camisa ou ele demanda quando compra um computador para sua empresa. O primeiro vem do consumo e o outro vem da poupança. Mas eu acho que o maior erro do Lula foi não ter aproveitado os seus oito anos [de mandato presidencial], com sua liderança, com sua competência, para arrumar bem a educação brasileira, para dar um salto – como eu tentei. Tentei como ministro, tentei quando saí do Ministério da Educação, em uma carta para ele em que eu listava as dez medidas que a gente precisava fazer para dar um salto educacional. Nunca nem recebi uma confirmação de recebimento. O maior erro de Lula foi não ter se concentrado na erradicação do analfabetismo, como um exemplo do Brasil, que a gente poderia ter feito no governo dele. E dar um salto pela federalização da educação, que não dava para fazer, no Brasil inteiro, nos oito anos dele, mas dava para fazer em boa parte do Brasil – e, aí, ninguém parava mais.
Voltando ao tema da corrida presidencial. O ex-ministro Ciro Gomes, com quem o senhor deve disputar a indicação do PDT para a corrida presidencial, é conhecido pelo estilo combativo. O senhor, por outro lado, tem um estilo mais sereno, diplomático. Como o senhor pretende se sobrepor a Ciro?
Eu preferia que você perguntasse a ele como é que, com o espírito aguerrido dele, vai enfrentar um diplomático. Eu não vou mudar meu estilo. Não consigo, aliás, mudar meu estilo. E não vejo por que mudar. Eu vou continuar nesse estilo de composição, de compromisso, de diálogo. E falando manso, como dizem.
Recentemente, o irmão dele, o ex-governador do Ceará Cid Gomes, foi à tribuna da Câmara chamar Eduardo Cunha de achacador…
Eu não vou xingar ninguém. Nunca xinguei, não vou xingar.
O senhor foi militante da Ação Popular, grupo ligado à igreja progressista de esquerda. Hoje, muitos dizem que o modelo de governo esquerdista está exaurido pelos governos Lula e Dilma. O senhor concorda com isso?
Não. Acho que se esgotou um tipo de esquerda. Mas vamos ver o que quer dizer “esquerda”. Para mim, esquerda quer dizer aquele conjunto de pessoas que, primeiro, não estão satisfeitas com o estado de coisas. Segundo, que acham que essas coisas não mudarão sozinhas. Isso para mim é esquerda. Porque você pega um conservador que pode ser até progressista, mas ele acha que o mercado resolve. E outros não querem nem mudar mais nada; querem manter o que está aí. Eu acho que o que está aí é muito ruim. Nós estamos numa situação vergonhosa socialmente, economicamente, e precisamos construir um país novo. Esse é o primeiro ponto que define se você é de direita ou de esquerda. O de direita está contente com o que está aí – eu não estou. Segundo, tem alguns direitistas que não estão contentes, mas acham que o mercado resolve. Eu acho que não. Eu acho que vão ser necessárias medidas concretas. Então, aí, já sou de esquerda e discordo disso de que a esquerda morreu. Além disso, tenho uma característica na esquerda, minha, diferente. Duas coisas. Por exemplo: eu sou conservador em matéria fiscal. Eu acho que é anti-esquerda tolerar a inflação. Para mim, a estabilidade monetária é uma questão de bem-estar do povo, de bem-estar das regras a respeito de como a sociedade funciona nas suas trocas. Eu sou conservador em matéria fiscal.
Então está de acordo com o ajuste fiscal proposto pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy?
Até um certo ponto atrás eu estava, por causa das medidas. Eu não estou mais porque ele não tem confiança, então não adianta mais. Ele não passa essa confiança. Minha discordância com o Levy, hoje, é menos pelas medidas dele – embora no começo eu tenha criticado o tamanho do superávit a que ele se propunha. Ia ser muito doloroso. Poderia ser mais lento. Eu defendo que se toque na dívida, renegociando, de alguma forma, no que se refere ao pagamento da dívida. E a outra coisa que eu defendo é que o caminho é a educação. A esquerda, há até algum tempo atrás, ela dizia: “Vamos fazer o socialismo para educar”. A minha é o contrário: “Vamos educar para, depois, ver como será a utopia”. E aí essas crianças de hoje vão inventar até um outro nome [para a utopia], que não seja socialismo. Vão até dizer que é o próprio capitalismo. Eles é que vão criar. Então, essas são as diferenças que eu vejo. Eu não ponho o lugar da revolução, da mudança, do progresso, na economia. A economia é base, e não propósito. O propósito, para mim, vem da educação e é a educação. E, finalmente, uma coisa que a esquerda antes não colocava, que é o meio ambiente, o equilíbrio ecológico. Eu sou defensor do equilíbrio ecológico desde muito jovem. Então, nisso eu me considero de uma esquerda diferente, mas me considero de esquerda.
Mesmo na condição de ministro da Educação do ex-presidente Lula o senhor poderia se caracterizar como um político de esquerda?
Claro. Tanto que, naquela época – dezembro do primeiro ano [de mandato presidencial, em 2003] – eu fiz um documento para o [ex-ministro da Secretaria de Comunicação do governo Lula, Luiz] Gushiken, aproveitando o feriado de Natal. Entreguei a ele nos primeiros dias de janeiro – tem gente que diz que foi por isso que eu fui derrubado –, em que eu mostrava para ele que o governo estava ficando acomodado. Eu não estava usando a palavra conservador. Acomodado. E ficou. E foi, eu acho, a grande causa de tudo isso que aconteceu no PT: o acomodamento. Eu acho que a volúpia de dinheiro que alguns do PT passaram a ter veio depois do acomodamento. Quando eu saí do PT, em 2005, quando estava já começando o mensalão, eu disse: “Eu saio porque o PT perdeu o vigor transformador” – porque o compromisso ético perdido é de alguns, não é do partido. Até hoje eu ainda sinto que a militância petista, a nação petista, é um pessoal correto, descente. O Estado petista é que se corrompeu muito. Naquela época em que eu saí, o Estado petista ainda era honesto. Alguns do Estado, alguns “generais”, é que já estavam se manifestando. Então, acho que o problema do PT foi perder o vigor transformador, e eu disse isso em uma carta ao Gushiken, entregue a ele no começo de janeiro de 2004. Alguns dias depois eu fui demitido.
O senhor considera a ideia deixar o PDT em direção a um partido como a Rede Sustentabilidade, de Marina Silva, ou o PPS, com o qual o senhor já tem conversado?
Quando eu saí do PT, eu tinha uma atração muito forte para onde ia, o PDT. Eu fui brizolista – eu não votei em Lula em 1989, a não ser no segundo turno. Eu era brizolista, trabalhava com [o fundador do PDT, Leonel] o Brizola. Agora, mesmo descontente com o PDT – desde 2007, quando o [Carlos] Lupi foi ser ministro [do Trabalho] e eu fui contra, achei que foi um erro, e continuo achando –, acho que o PDT hoje seria uma alternativa, sem dúvida alguma, no Brasil se não tivesse entrado no governo. Se tivesse construído um projeto com base naquilo que se chamava e se chama, hoje, de trabalhismo – que, antigamente, era uma novidade que não era aceita. Ora, imagine Getúlio [Vargas, o “pai do trabalhismo”] dizer que não era nem capitalismo nem socialismo o futuro, mas sim o capitalismo sob a ótica e a ética dos trabalhadores; [o ex-presidente da República] João Goulart falar em reformas – hoje todo mundo fala e reconhece que o socialismo não é alternativa. E que o capitalismo também não. E, terceiro, educação. Quando o Brizola falava em educação, ainda nos anos 50, era coisa de uma pessoa um tanto fora da realidade, porque naquela época o importante para o país era estrada, era porto, aeroporto, hidrelétrica, capital, máquina, como Juscelino [Kubitschek, também ex-presidente] defendia. E ia ele [Brizola] falar em escola. Hoje, a gente sabe que o verdadeiro fator de produção, vetor do progresso, não é mais – embora o seja, também – estrada, portos, aeroportos. É educação. Até porque sem educação, que faça os engenheiros, a gente não vai ter portos ou vai ter represas se rompendo, prédios caindo, inovação zero. Então, essas três coisas estão aí à disposição, e nós perdemos, porque mergulhamos no governo do PT. Como dizia Pedro Taques [ex-senador pelo PDT e atual governador do Mato Grosso pelo PSDB]: “Viramos um puxadinho do PT”. Estamos justificando este governo, corrupção. Então, nós perdemos a possibilidade de sermos, hoje, uma alternativa forte. Mas, graças a esse vazio que está aí, acho que o PDT pode ser alternativa séria.
O PT está em vias de extinção?
Eu acho que o PT não vai desaparecer. O PT tem uma história, uma militância. Vai entrar, ao meu ver, em um período de diminuição de influência, mas vai voltar. E vai voltar melhor. Quando eu votei no Aécio [Neves, senador pelo PSDB de Minas Gerais], não era para ser governo com o Aécio; eu ia ser oposição ao Aécio. Mas seria uma oposição com alternativa, retomando as utopias. Eu me lembro que, em uma época, eu disse: “É difícil sonhar dormindo em camas de palácios”. Era preciso sair dos palácios para voltar a sonhar. O PT, ao meu ver, pode voltar a sonhar. Não acredito que esse vício do poder pelo poder, essa voracidade por poder e dinheiro – e a gente vê o que muitos têm – continuará [com o PT eventualmente] na oposição. Eu creio que, em vez de já pensar em como voltar para ser igual, eles vão pensar em como ser diferentes.
O “Fla x Flu” político, que é o apelido dado à polarização PT x PSDB, ultrapassou ao limite do razoável?
Esse Fla x Flu está nos destruindo. Já houve Fla x Flu antes no Brasil, mas eram melhorzinhos. Por exemplo, comunistas e capitalistas. Era um Fla x Flu bem melhor do que esse, porque era carregado de ideologia, de propostas alternativas – se um falhar, a gente tem outro [sistema]. Hoje, é um Fla x Flu sem propostas. Não tem grandes alternativas, propostas por um lado ou por outro. Esse Fla x Flu tem que acabar
O senhor já declarou ser contra o impeachment da presidenta Dilma Rousseff sem provas de que ela tenha cometido crime que justifique a medida extrema. Mas que ela tem de encontrar uma saída institucional para sair da estagnação. Como isso seria possível?
Igualzinho ao que fez Itamar [Franco, ex-presidente da República]. O [também ex-presidente Fernando] Collor tentou e não conseguiu; já era tarde quando ele tentou. Ele mesmo diz isso. O Collor conta umas histórias interessantes. Ele, por exemplo, diz que procurou [o ex-presidente do PMDB Orestes] Quércia, em um certo momento, para dizer: “Como é que eu faço para governar com todos”? Aliás, ele tentou, e fez um bom ministério no final. E o Quércia disse: “Presidente, se o senhor tivesse vindo aqui algumas semanas antes dava. Agora, não dá mais. Eu tentei com a Dilma nessas semanas anteriores. Para ela ser a Itamar dela própria. Isso implicaria ela reconhecer os erros e pedir desculpas; dizer que não é mais do PT, mas do “Partido do Brasil”; lembrar que tem três anos pela frente, que foi eleita; e queira governar esses três anos para ficar bem na História e, para isso, precisa do apoio de todos; e chamar a oposição para compor um governo.
Não são muitas as condições para que Dilma, eventualmente, aceitasse tal alternativa?
Hoje, eu acho que está sendo. Mas, quando eu comecei a falar isso, eu creio que, na primeira, segunda ou terceira sessão [plenária] de fevereiro, no Senado. Logo que começou o novo governo dela eu falei isso. Falei do diálogo, falei que [o ex-presidente da República] Fernando Henrique deveria falar com Lula, e vice-versa. Naquela época eu falava na necessidade de um diálogo, o que é óbvio que ia acontecer mais ou menos desse jeito. Eu não achava que tanto – até porque, naquela época, acho que não havia, ainda, a Operação Lava Jato; e se havia não estava, ainda, no conhecimento da gente –, mas era previsível. Talvez já tenha passado [o tempo do diálogo]. E, aí, nós criamos um problema muito sério: uma presidente que não tem legitimidade, mas tem a legalidade com ela. Se descobre-se que ela está envolvida em crime – corrupção, tudo isso –, aí a gente resolve fácil, tirando-a, embora seja ruim interromper o mandato de presidente. Eu vou ficar muito constrangido se descobrir-se que a Dilma tem crime e eu ter que votar pelo impeachment e ficar na História como um parlamentar que votou para derrubar uma presidente eleita. Se ela tiver envolvida, comprovadamente, em crime. Se ela não tiver, eu não votarei – mas, aí, vai ser muito ruim mais três anos de governo Dilma. Então, estamos em uma situação muito difícil. Com ela, é ruim.
Ela não se abre para o diálogo?
Ela não se abre para o diálogo. Neste momento temos um debate no Senado sobre isso. Agora, com essa greve de caminhoneiros, tem que haver um diálogo total. Mas aí é preciso chamar também os caminhoneiros para que eles venham ao diálogo. Não é só o governo ir; eles têm que vir também. Se eles dizem “nós queremos um único item da pauta: presidente fora”, aí não tem diálogo. Você não pode impor isso em um diálogo.
No final de janeiro, publicamos a história da carta em que o então senador Eduardo Suplicy, o primeiro petista eleito para o Senado, questiona por que jamais foi recebido por Dilma para uma conversa. O que o senhor acha disso?
E não foi recebido mesmo depois de, por ser do PT, ter sido de certa forma agredido em uma livraria em São Paulo. É um erro primário do governo, mas são muitos erros. Agora, é um erro inexplicável não receber um Suplicy. Inexplicável! Primeiro senador do PT, um petista que honrou o PT. Não tem nada, nada, nada contra o Suplicy. Tem o que falar. Mas, às vezes, é uma coisa em que o PT caiu, e por isso caiu: não gosta de quem é crítico. E ele não é afinado totalmente. O PT só quer ouvir quem é da patota. Esse é o problema.
Como o senhor vê um Congresso presidido por dois peemedebistas investigados por suspeita de envolvimento no esquema de corrupção descoberto pela Lava Jato na Petrobras?
Então, você vê: toda a cadeia de comando do país. A presidente não está diretamente [sob investigação], mas todo o entorno de seu partido, e mesmo o de outros ligados a ela, está envolvido. O vice [presidente, Michel Temer], até que não. Mas sai do vice e vai paro segundo sucessor, o presidente da Câmara [Eduardo Cunha]. Envolvido. Mas aí vai para o segundo sucessor, que é o [presidente do Senado] Renan Calheiros… Também com suspeitas. É uma situação muito ruim para o Brasil. Eu não sei se já teve isso antes. Estamos em uma crise muito, muito séria. Estamos em uma crise social gravíssima, de guerra nas ruas, de violência. Acho que a gente não está percebendo que esse país está vivendo, hoje, uma situação pior do que a da Europa, com a migração. As pessoas estão descendo, sob a forma de assalto, de violência. E, finalmente, essa crise institucional muito séria da falta de credibilidade, cuja melhor indicação é a pesquisa recente que põe todos os políticos que foram pesquisados como rejeitados pela população.