A CPI da Covid ouviu nesta terça-feira (5) o sócio-administrador da VTCLog, Raimundo Nonato Brasil, bem como a diretora-executiva da empresa, Andreia Lima. Contratos da empresa de logística com o Ministério da Saúde estão sob suspeita de irregularidades e são investigados pela comissão. Esta é a última semana de depoimentos antes da entrega de seu relatório final, prevista para o dia 19 de outubro.
Durante o depoimento, os gestores confirmaram manter contato frequente com Roberto Dias, que se descobriu ser cliente de uma das empresas do mesmo grupo. A CPI conseguiu avançar em questões relativas a fraudes licitatórias e aditivos contratuais entre o Ministério da Saúde e a VTCLog, que mais o que dobrou as cobranças para o serviço prestado de fornecimento de insumos médicos.
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Confira o debate:
Aditivos
Visto pelos senadores como uma estratégia para lucro indevido, os aditivos nos contratos da VTCLog foram questionados pelo relator, senador Renan Calheiros (MDB-AL). Nonato confirmou que houve um aditivo de R$ 80 milhões. Ele disse, porém, que isso ocorreu a pedido do Ministério da Saúde por conta de um aumento de demanda em decorrência da pandemia.
PublicidadeO aditivo aconteceu sem licitação, mas foi suspenso por determinação do Tribunal de Contas da União (TCU).
Contratos sem licitação
Ainda durante sua intervenção, Calheiros apontou ao menos oito contratos sem licitação firmados entre a VTCLog e o Ministério da Saúde. Esse conjunto de contratos totalizou, nas contas do senador, mais de R$ 335 milhões.
Tanto o valor, quanto a falta de licitação para os contratos chamou atenção dos integrantes da CPI, pois ocorreram fora do período de pandemia. Eles foram firmados entre os anos de 2016 e 2018, quando o país não registrava nenhum caso de calamidade pública relacionado à saúde.
Na época, a pasta era comandada pelo atual líder do governo, Ricardo Barros (PP-PR).
Barros entrou no radar da CPI após o depoimento do deputado Luis Miranda (DEM-DF) que contou que, ao ser informado sobre possíveis irregularidades na compra de vacinas contra a covid, o presidente Jair Bolsonaro atribuiu ao deputado a responsabilidade sobre as negociatas.
Barros também é apontado como fiador do ex-diretor de logística da pasta, Roberto Ferreira Dias, suspeito de ter recebido valores indevidos pela VTCLog para favorecimentos nos contratos. Conforme revelado pela comissão, o ex-diretor do Departamento de Logística do Ministério da Saúde teve boletos pagos com recursos da empresa de logística.
Em sua resposta, Nonato afirmou que, na ocasião, o Ministério da Saúde fez uma consultoria e estudos junto à empresa antes de firmar o contrato. O presidente da comissão, senador Omar Aziz (PSD-AM) deve pedir ao Tribunal de Contas da União (TCU) o histórico da justificativa dada por Barros para a dispensa de licitação.
Saques em dinheiro
Os senadores também questionam o empresário sobre saques de mais de R$ 4 milhões por um motoboy da empresa. Em depoimento à CPI, o motoboy Ivanildo Gonçalves da Silva, funcionário da empresa de logística VTCLog, confirmou ter sacado mais de R$ 400 mil na “boca do caixa”. Os saques eram feitos com frequência quase que diária e os senadores apuram para quem o dinheiro era repassado.
Raimundo Nonato negou os saques de milhões pelo motoboy. Ele também rebateu a acusação de que a empresa teria pago contas de Dias em troca de benefícios no Ministério da Saúde.
“Nossa empresa é uma empresa familiar. A gente faz um cheque, vai para o aeroporto, no banco, para pagar despesa da empresa, despesa dos sócios, despesa do nosso agronegócio. O cheque não é para ser sacado e levado para a empresa”, disse Nonato.
Faturamento
O faturamento dos contratos da VTCLog, desde a assinatura com o Ministério da Saúde em dezembro de 2018, foi superior a R$ 400 milhões até o momento.
Questionado sobre os critérios de contratação e pagamento, o depoente disse que isso ocorre de acordo com as demandas de logística feitas pela pasta à empresa.
Em um dos momentos da reunião os senadores detalharam o faturamento da empresa, considerado suspeito. Em 2019, esse faturamento atingiu os R$ 96 milhões e em 2020 superou os R$ 400 milhões. Eduardo Braga questionou qual o motivo do alto valor em 2019, ano em que a pandemia ainda não tinha chegado no Brasil. Raimundo Nonato respondeu que isso seria consequência competência do operacional da empresa e não tinha condições de prestar maiores esclarecimentos.
Contato com Roberto Dias
Durante a CPI, a diretora-executiva da VTGLog, Andreia Lima, confessou ter mantido contato frequente com Roberto Ferreira Dias, ex-diretor de logística do Ministério da Saúde suspeito de solicitar propina na compra de vacinas contra a covid-19. Ao todo, foram 135 ligações, que Andreia Lima afirmou terem sido diuturnas e constantes por conta da alta demanda do ministério por equipamento.
O senador Randolfe Rodrigues (PSB-PA) estranhou o fato das ligações terem ocorrido todas durante os finais de semana, fato negado pela diretora. Andreia Lima também afirmou que Roberto Dias é cliente da Voetur Turismo, uma empresa do mesmo grupo familiar da VTCLog, com quem compartilha aparato financeiro. A entrega de dinheiro vivo em agência da Voetur, de acordo com Andreia Lima, era para quitar dívida de Dias enquanto cliente.
Além do vínculo com Dias, a Voetur também tem como cliente o PSL, partido que Andreia Lima afirmou prestar serviço de agendamento de passagens aéreas. Humberto Costa (PT-PE) afirmou não acreditar nas explicações da diretora. “É muito difícil acreditar nessa história. (…) Eu não posso jamais aceitar a ideia de que essa empresa não tenha uma governança que torne absolutamente desnecessário mandar o Seu Ivanildo para o banco”, declarou. Andreia depois se contradisse, afirmando que a VTCLog não possui qualquer vínculo com qualquer partido.
Fato que chamou a atenção da CPI foi que, após o início da gestão de Roberto Dias dentro do Ministério da Saúde, o valor dos contratos do ministério com a VTCLog ficou duas vezes maior. O aumento ocorreu quando o Ministério transferiu o controle de distribuição à empresa, com a premissa de redução de custos no processo de aquisição.
Perguntas do Ministério da Saúde
O colegiado da CPI da Pandemia deu ao Ministério da Saúde o prazo de 48h para responder requerimento com questionamentos sobre o programa de vacinação contra a covid-19. Entre as perguntas, está o motivo pela qual ficou suspensa até 2022 a compra do imunizante CoronaVac, produzido pelo Instituto Butantan em parceria com a farmacêutica chinesa Sinovac.
Além dos questionamentos sobre a Coronavac, a CPI quer saber a atual situação dos estoques de vacinas, bem como os planos do Ministério para a campanha vacinal no fim do ano. A situação dos estoques de vacinas é um dos fatores que geram estranhamento nas lideranças do colegiado com relação ao Ministério. Os parlamentares temem que a suspensão da campanha vacinal de adolescentes tenha acontecido por falta de imunizantes.
A VTClog
A VTCLog é uma empresa contratada pelo Ministério da Saúde para cuidar do armazenamento e distribuição de insumos de saúde, incluindo as vacinas contra a covid-19. A CPI apura se na relação da empresa com o ministério houve algum benefício ilícito concedido ao ex-diretor de Logística Roberto Ferreira Dias, que foi exonerado em julho suspeito de receber propina na negociação de compra de imunizantes.
Raimundo Nonato compareceu à CPI munido de habeas corpus concedido pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que garante o direito de permanecer em silêncio em questionamentos que possam o incriminar.
Deferida pelo ministro Dias Toffoli, a ação também impede que o empresário seja submetido a medidas privativas de liberdade no decorrer de seu depoimento à comissão. Segundo Toffoli, o pedido se justifica pela quebra de sigilos telefônico, bancário e fiscal, que colocam o sócio do VTCLog na qualidade de investigado.
De acordo com as investigações, a VTCLog obteve um aditivo em seu contrato, autorizado por Roberto Ferreira Dias, num valor 1.800% maior que o recomendado pela área técnica. De acordo com o parecer técnico, o contrato deveria ser de R$ 1 milhão enquanto a empresa defendia R$ 57 milhões. O impasse foi resolvido diretamente por Ferreira Dias, que concordou em assinar uma contraproposta da VTCLog no valor de R$ 18 milhões, bem menor que o pedido inicial, mas ainda assim 18 vezes maior do que defendia o parecer técnico.
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