Determinado pelo ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), o afastamento do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), mergulha o Congresso e o presidente Michel Temer em uma nova incógnita a duas semanas do encerramento previsto das votações. O vice-presidente da Casa, Jorge Viana (PT-AC), ainda não se pronunciou oficialmente sobre o que pretende fazer no lugar de Renan, mas senadores de seu partido o pressionam a suspender toda a pauta de interesse do governo, como a análise em segundo turno da PEC do teto dos gastos, a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e mudanças na Lei de Licitações.
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Com Viana, também deve sair de pauta o polêmico projeto de lei de abuso de autoridade, priorizado nos últimos dias por Renan e objeto de reação de integrantes de promotores, procuradores e juízes e dos protestos de rua do último domingo (4). O presidente do Senado se recusou a receber a notificação de seu afastamento ontem à noite e pediu ao oficial de Justiça que retornasse hoje, às 11h. Ainda nesta terça, ele deve recorrer da liminar de Marco Aurélio.
Jorge Viana adotou tom de cautela assim que foi informado sobre a decisão do ministro. “O momento é gravíssimo. Não podemos, de jeito nenhum nos precipitarmos, porque o país está vivendo um momento muito difícil do ponto de vista econômico. A crise política se intensifica e os reflexos para a população são danosos”, disse o petista, irmão de Tião Viana (PT-AC), que assumiu interinamente a presidência do Senado, em 2007, quando Renan deixou o comando da Casa em meio a uma série de denúncias. Hoje Tião é governador do Acre.
O afastamento do peemedebista trouxe incertezas sobre uma votação dada como certa pelo Planalto: o governo esperava concluir, no próximo dia 13, a votação em segundo turno da PEC do teto dos gastos (PEC 55 no Senado, ou 241 na Câmara). O texto foi aprovado por ampla maioria em primeiro turno na semana passada. O PT, de Jorge Viana, é o principal opositor no Congresso da proposta que limita as despesas públicas da União pelos próximos 20 anos. Os governistas alegam que Viana não pode segurar a votação porque há um acordo de líderes para a análise da proposição antes do recesso de fim de ano. Mas petistas alegam, nos bastidores, que é preciso adiar a decisão sobre o assunto devido às polêmicas que cercam a proposta e ao clima de instabilidade política no Brasil.
Publicidade“Quem pauta o que será votado é o presidente do Senado e a nossa pauta não poderá ser tocada como se nada tivesse acontecendo, este não é um fato político qualquer”, afirmou o líder da oposição, Lindbergh Farias (PT-RJ). O senador defende o adiamento da votação da PEC 55 para o próximo ano.
Réu na linha sucessória
Renan, até o início desta manhã, evitou o confronto. Em nota, informou que só vai se manifestar sobre o assunto após consultar seus advogados e tomar conhecimento do inteiro teor da liminar concedida por Marco Aurélio. Ele alega que o Senado não foi ouvido no julgamento que prevê o afastamento do integrante da linha sucessória que virar réu no Supremo. Esse julgamento foi interrompido em novembro a pedido do ministro Dias Toffoli quando já havia maioria formada pela impossibilidade de um réu seguir no comando da Câmara, do Senado ou do STF. Na semana passada, os ministros aceitaram denúncia da Procuradoria-Geral da República contra Renan por desvio de verba pública.
O senador é acusado de destinar parte da verba indenizatória do Senado para uma locadora de veículos. Segundo a PGR, os serviços não foram prestados. O peemedebista pagou R$ 44,8 mil à Costa Dourada Veículos, de Maceió, entre janeiro e julho de 2005. Em agosto daquele ano, a empresa emprestou R$ 178,1 mil a Renan.
O Supremo analisou uma denúncia que estava engavetada na corte desde janeiro de 2013 em que o senador é acusado de prestar informações falsas ao Senado em 2007, para tentar comprovar ter recursos suficientes para pagar a pensão de uma filha que teve com a jornalista Mônica Veloso. Segundo a jornalista, a pensão era bancada por um lobista da construtora Mendes Junior. O caso resultou, à época, na renúncia de Renan da presidência do Senado em uma tentativa, bem-sucedida, de preservar o mandato parlamentar. Ele escapou duas vezes da cassação em plenário, em votação secreta.
Lava Jato
A decisão surpreendeu pela rapidez com que foi anunciada. A Rede Sustentabilidade havia protocolado nessa segunda o pedido de afastamento ao STF. De acordo com a legenda, ao se tornar réu por peculato em decisão proferida pela Corte na última quinta-feira (1º), o peemedebista ficou inabilitado de exercer cargo da linha sucessória da Presidência da República. O pedido foi imediatamente enviado ao ministro Marco Aurélio, que não tinha prazo definido para se manifestar. Ele ainda é alvo de 11 inquéritos, quase todos relacionados à Lava Jato.
No domingo, durante as manifestações realizadas em mais de 200 cidades, grande parte dos protestos foi voltada contra o peemedebista. Em Brasília, um grupo de manifestantes destacou que queria “urgência sim”, mas para a análise dos inquéritos contra Renan Calheiros que seguem em apuração no Supremo Tribunal Federal (STF). A faixa fazia referência à tentativa de Renan em antecipar a análise do pacote de medidas contra a corrupção no plenário do Senado.
As alterações feitas pela Câmara, que incluíram uma emenda para tipificar o abuso de autoridade de membros do Judiciário e do Ministério Público Federal (MPF), também foram bastante criticadas durante os atos deste domingo. De acordo com os procuradores envolvidos na Operação Lava Jato, a votação foi um tipo de “retaliação” às investigações feitas, desde 2014, que já arrolaram diversos parlamentares nos esquemas de desvio de dinheiro da Petrobras.
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