Bruno Dantas F. Affonso (*), Franklin Brasil Santos (**) e Marcus Vinicius de Azevedo Braga (***)
A discussão sobre como se organizam os órgãos afetos a accountability – e aqui assumiremos esta como o amplo esforço de prestação de contas que envolve o controle governamental e as ações anticorrupção – ou seja, como funciona essa rede que busca assegurar o atingimento das finalidades das políticas públicas, de forma aderente e transparente, ganhou destaque nos últimos 20 anos.
Leia também
Nesse sentido, entrou em vigor no México no dia 19/07/2017 o Sistema Nacional Anticorrupção (SNA) daquele país, fruto de uma reforma constitucional de 2015. A inovação normativa traz um desenho interessante para o manejo da accountability que pode ser útil para as discussões de um certo país da América do Sul, que anda às voltas com problemas de natureza similar, na busca de um arranjo sustentável que dê conta dessas questões. As opções variam entre “dez medidas”, gestão de riscos, compliance, transparência e um sem número de propostas que ainda não lograram seu lugar ao sol.
O México, assim como o Brasil, é uma federação com profundos problemas sociais e de desigualdades regionais, o que faz a discussão do SNA mexicano relevante pelo seu aspecto coordenativo, podendo oferecer novas e decisivas capacidades estatais na seara do controle para nosso país.
O SNA é uma instância de coordenação interfederativa composta por um Comitê Coordenador, além do Comitê de Participação Cidadã, Comitê do Sistema Nacional de Fiscalização e pelos sistemas locais, contemplando na sua estrutura órgãos afetos ao controle interno, controle externo, judiciário, investigação (como nosso Ministério Público e a Polícia Federal), transparência e controle social, demonstrando que o sistema abarca a diversidade de visões em relação a questão da corrupção, bem como no que tange aos diversos poderes e entes na federação.
O arcabouço legal desse sistema, além da Constituição Federal, é a Ley General del Sistema Nacional Anticorrupción, de 18/07/2016, que estabelece mecanismos de coordenação, princípios gerais sobre o assunto, detendo-se mais sobre o Comitê Coordenador do sistema, seu baluarte.
Esse comitê também é composto por integrantes de diversos órgãos do sistema, apoiado por uma Secretaria Executiva e por um Comitê Executivo de caráter técnico (estudos e geração de informações), e tem uma função estratégica, consolidando informações, estabelecendo mecanismos de coordenação, fazendo recomendações aos integrantes do sistema, baseado em uma plataforma digital que integrará os diversos sistemas sobre o assunto no país.
A proposta do SNA não é excluir ou substituir as competências dos órgãos que o compõe, o que seria um erro, dada a autonomia e o controle mútuo necessários à accountability (desde Montesquieu), mas trazer a proposta de uma instância de coordenação, de consolidação de informações, de otimização de esforços, do aumento da cooperação e da redução dos conflitos, proporcionando diagnósticos estratégicos que se convertam em recomendações sistêmicas. Tais medidas são essenciais tanto para o federalismo, que amalgama órgãos e entidades plurais, como para as próprias questões afetas à corrupção, que admitem visões diversas do problema e da solução.
No Brasil as nossas ações coordenativas nesse tema são ainda tímidas e localizadas, como o Sistema de Controle Interno do Poder Executivo Federal (Lei nº 10.180/2001), a criação em 2003 da Estratégia Nacional de Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro (ENCCLA), o Conselho de Transparência Pública e Combate à Corrupção, órgão colegiado e consultivo vinculado à CGU (2005), e a Rede de Controle do TCU (2009). Poderíamos – e deveríamos, sobretudo – aprender com o México, na promoção dessa sinergia necessária, articulando esforços dos diversos órgãos envolvidos na questão, de maneira concreta, pela criação de espaços e ações, respeitada a autonomia de cada instituição, mas na busca de uma atuação mais efetiva, estratégica e sintonizada aos grandes objetivos. E viva o México!
* Auditor governamental e mestrando em Administração Pública (Profiap/ICHS/UFF);
** Auditor federal de Finanças e Controle e mestre em Controladoria e Contabilidade pela FEA/USP;
*** Auditor federal de Finanças e Controle e doutorando em Políticas Públicas, Estratégia e Desenvolvimento (PPED/IE/UFRJ).
Deixe um comentário