Thomaz Pires
É possível os três poderes caminharem juntos em torno de uma proposta? Para o presidente da Associação Nacional dos Defensores Públicos Federais (Anadef), Luciano Borges, não restam dúvidas que sim. E a iniciativa em questão é a proposta de emenda à Constituição (PEC) que sugere alterações no artigo sexto da Carta, incluindo a busca da felicidade como a chave para fazer valer todos os direitos sociais. A chamada PEC da Felicidade.
A iniciativa ganhou força após a realização da audiência pública proposta pelo senador Cristovam Buarque (PDT-DF). Pela proposta, o artigo 6º da Constituição Federal passará a vigorar com a seguinte redação: “São direitos sociais, essenciais à busca da felicidade, a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição”.
Luciano Borges argumenta que a PEC da Felicidade traz novos horizontes para o tratamento dos direitos sociais, além de possibilitar o diálogo entre os três poderes. “É perfeitamente possível Judiciário, Executivo e Legislativo buscarem o mesmo entendimento sobre um assunto e agiram juntos. E isso ocorre em torno dessa PEC. Há um claro esforço das três esferas em atuar juntos nessa modificação constitucional”, afirma ele.
Felicidade social
Uma decisão do Supremo Tribunal Federal de abril de 2008 é o pontapé inicial da tese defendida por Luciano. Na ocasião, o ministro Celso de Melo deu ganho de causa a um paciente que sofrera uma intervenção cirúrgica, respirava com ajuda de aparelhos e enfrentava dificuldades em custear o tratamento de saúde.
O ministro determinou que fosse concedido o apoio médico-financeiro alegando que “o direito à busca da felicidade é um consectário do princípio da dignidade da pessoa humana. Entre reconhecer o interesse secundário do Estado, em matéria de finanças públicas, e o interesse fundamental da pessoa, que é o direito à vida, não haveria opção possível para o Judiciário, senão de dar primazia ao último”.
Diante da posição do STF, a Anadef passou a disseminar o mesmo ponto de vista dentro do Judiciário. “Esse episódio da decisão do ministro é o exemplo claro de união de forças, já que houve uma mobilização inicial do Executivo. O mesmo pode ser feito em outras ações pelo Legislativo para garantir as políticas públicas que oferecem ao cidadão comum instrumentos necessários para a busca pela felicidade”, explica.
O texto da PEC está nas mãos do senador Cristovam Buarque, que tenta reunir o número mínimo necessário de 27 assinaturas de senadores para dar início à tramitação da proposta.
Na Câmara dos Deputados, a proposta já conta com o apoio de deputados de diferentes bancadas. Entre eles, Manuela d´Ávilla (PCdoB–RS) e Chico Alencar (Psol-RJ). Também apoiam o movimento + Feliz, do qual nasceu a PEC da Felicidade, as cantoras Fafá de Belém e Margareth Menezes, o ex-jogador de futebol Sócrates e o maestro João Carlos Martins, entre várias outras personalidades.
Felicidade universal
Diversos países atribuem ao Estado responsabilidade constitucional pela busca de meios para a garantia do direito de ser feliz. A Declaração de Direitos da Virgínia (EUA, 1776) outorgou aos cidadãos o direito de buscar e conquistar a felicidade. Na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (França, 1789), há a primeira noção coletiva de felicidade, determinando que reivindicações dos indivíduos sempre se voltarão à felicidade geral.
Constituições de outros países, como Japão e Coreia do Sul, também determinam que todas as pessoas têm direito à busca pela felicidade, devendo o Estado empenhar-se na garantia das condições para atingi-la.
Alem disso, a felicidade é adotada cada vez mais, por diversas nações, como um dos principais parâmetros para aferir o bem-estar de uma sociedade. Coube ao Butão, país asiático localizado ao Sul da China, o pioneirismo nessa área, ao criar, duas décadas atrás, o índice de Felicidade Interna Bruta (FIB).
A experiência recebeu o apoio da Organização das Nações Unidas (ONU) e passou a ser replicada em diversas nações. São Paulo poderá ser a primeira cidade brasileira a pesquisar o índice de felicidade, ideia defendida pelo atual secretário municipal do Meio Ambiente, Eduardo Jorge.
Com a aprovação da PEC, no entanto, pesquisas do gênero tendem a se generalizar, como querem especialistas em políticas públicas. Segundo eles, indicadores numéricos – como o total da renda gerada, vagas ocupadas em escolas, atendimentos de saúde e outros – são insuficientes para avaliar se o poder público está fazendo a sua parte para assegurar bem estar aos cidadãos. Essa noção de bem estar, entendem, tem de estar associada à noção de felicidade.
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