Convocada para prestar esclarecimentos na CPI sobre a origem de seus honorários, Catta Preta diz que sua decisão está diretamente relacionada a um dos depoimentos do lobista Julio Camargo. Um dos presos que colaboram com a Justiça em regime de delação premiada, Camargo acusou o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), de receber US$ 5 milhões em propina no esquema de corrupção na estatal. Em seus primeiros relatos, o delator não havia denunciado Cunha por “medo”, diz a advogada.
“Receio. Ele tinha medo de chegar ao presidente da Câmara”, afirma Catta Preta, instada a comentar o que o teria feito mudar de ideia. “A colaboração dele, a fidelidade, a fidedignidade da colaboração. O fato de que um colaborador não pode omitir fatos, não pode mentir, o levaram então a assumir o risco. Aquele risco que ele temia, em levar todos os fatos à Procuradoria-Geral da República”, acrescentou a advogada.
Diante dos novos desdobramentos da Lava Jato, Beatriz Catta Preta já determinou o esvaziamento completo de seu escritório. Todos os funcionários foram dispensados e as salas desativadas. Depois de 34 dias de férias em Miami, ela ainda se diz “perseguida e intimidada”.
“Depois de tudo o que está acontecendo, e por zelar pela segurança de minha família, dos meus filhos, eu decidi encerrar a minha carreira na advocacia. Eu fechei o escritório”, concluiu a advogada.
Em ação paralela à decisão de Catta Preta, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) ajuizou pedido de habeas corpus no Supremo Tribunal Federal (STF) para que a advogada não seja obrigada a prestar esclarecimentos à CPI da Petrobras. Com críticas à CPI, o presidente do STF, ministro Ricardo Lewandowski, já aceitou a solicitação da OAB. “É inadmissível que autoridades com poderes investigativos desbordem de suas atribuições para transformar defensores em investigados, subvertendo a ordem jurídica. São, pois, ilegais quaisquer incursões investigativas sobre a origem de honorários advocatícios, quando, no exercício regular da profissão, houver efetiva prestação do serviço”, justificou o magistrado.
Segundo o advogado de Eduardo Cunha, o ex-procurador-geral da República Antônio Fernando de Souza, as declarações veiculadas no Jornal Nacional não têm sentido.
Advogada criminal há 18 anos, Catta Preta é tida como uma das principais especialistas do Brasil em delação premiada, procedimento que exige dos depoentes provas justificando a concessão de redução de futuras penas. Marcada pela discrição, ela não costumava dar declarações públicas a respeito de seus trabalhos. Além de Julio Camargo, estavam entre seus clientes o ex-diretor e o ex-gerente da Petrobras Paulo Roberto Costa e Pedro Barusco, respectivamente. Recentemente, ela já havia desistido de atuar na Lava Jato.
Fator Kroll
Como este site mostrou mais cedo, a partir de informações do jornal O Estado de S. Paulo, os aliados de Eduardo Cunha na CPI da Petrobras solicitaram ao grupo de espionagem Kroll que priorize as investigações justamente sobre o lobista Júlio Camargo. A ideia dos pares do peemedebista é desqualificar a versão apresentada por Camargo aos investigadores da Lava Jato de forma a demonstrar que ele descumpriu, ao omitir fatos, seu acordo de delação premiada, o que poderia levar à anulação do acordo.
Dois dos maiores aliados de Cunha – Hugo Motta (PMDB-PB), presidente da CPI da Petrobras, e André Moura (PSC-SE), um dos sub-relatores do colegiado – foram responsáveis pela escolha de 12 dos alvos da empresa de espionagem. Ainda segundo a reportagem, apenas Cunha, Hugo Motta e André Moura, “em tese”, têm acesso à lista de investigados da Kroll – empresa que foi contratada sem realização de licitação, o que provocou protestos na CPI. Membro do colegiado, o deputado Ivan Valente (Psol-SP) diz que Motta esconde os trabalhos da Kroll.
Leia mais:
Lava Jato: aliados de Cunha usam CPI para defendê-lo de delator