Edson Sardinha e Lúcio Lambranho
Para aprovar a prorrogação da CPMF, o governo está recorrendo, além da pressão política dos governadores sobre os senadores de seus estados, a um estudo que mostra quanto cada um dos 26 estados e o Distrito Federal terão de retorno com as ações sociais financiadas pela contribuição em 2007 (veja a relação completa).
O levantamento elaborado pela Presidência da República, ao qual o Congresso em Foco teve acesso, revela que 12 estados devem receber do governo federal, em receitas originárias da CPMF, mais do que o valor desembolsado por seus contribuintes com o chamado imposto do cheque ao longo de todo o ano.
O retorno social da contribuição, de acordo com o governo, tem impacto direto em três áreas: o programa Bolsa Família, a Previdência rural e a saúde pública. Esses setores devem ficar com R$ 30,7 bilhões dos R$ 36 bilhões que a União está arrecadando apenas com a CPMF. O restante do recurso serve de caixa para o governo pagar juros da dívida pública.
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No documento, o governo admite a dependência quase total do Bolsa Família, carro-chefe de seus programas sociais, em relação à contribuição. Nada menos do que 76% dos R$ 9,8 bilhões que o governo estima destinar para o programa têm como origem o imposto do cheque. Ainda com a CPMF, a União diz honrar 21% dos R$ 35,5 bilhões que despende com o pagamento de aposentadorias de trabalhadores rurais.
Ações nos estados
O governo corre contra o relógio e as resistências partidárias para aprovar a prorrogação da contribuição até 2011. Isso porque a vigência do tributo se extingue no próximo dia 31. Para garantir a arrecadação estimada de R$ 40 bilhões no próximo ano, os governistas tentam conquistar os votos dos últimos senadores indecisos. Como argumento, têm recorrido à importância da CPMF para o custeio de importantes ações sociais em seus estados.
A estratégia começa a dar resultados. O senador Pedro Simon (PMDB-RS), por exemplo, já reviu sua posição ao tomar conhecimento dos dados desse levantamento em relação ao Rio Grande do Sul, que enfrenta uma das piores crises financeiras de sua história.
Os gaúchos, que contribuem com R$ 2,6 bilhões de CPMF por ano, recebem R$ 1,9 bilhão em programas sociais financiados pela contribuição sobre movimentação financeira. Não por acaso, a governadora do Rio Grande do Sul, a tucana Yeda Crusius, tem se desdobrado para convencer seus colegas de partido e de estado a votarem a favor da prorrogação do tributo no Senado.
“Chantagem barata”
Mesmo com esses argumentos, o governo não tem sensibilizado todos os senadores cujos estados têm estimativa de retorno social maior do que a arrecadação da contribuição. É o caso da relatora da CPMF na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), senadora Kátia Abreu (DEM-TO).
O estado da senadora arrecada R$ 200 milhões e recebe de volta R$ 207 milhões em ações sociais. “Esse retorno é a coisa mais natural do mundo, pois o imposto é feito justamente para que todos paguem e todos tenham retorno. Se não fosse assim, a CPMF só retornaria para São Paulo, o estado que mais arrecada”, argumenta.
Segundo Kátia Abreu, o governo tem feito “chantagem barata” ao dizer que, caso a contribuição não seja renovada, haverá cortes profundos na execução orçamentária da saúde e do Bolsa Família, que atende a mais de 11 milhões de famílias em todo o país.
“Com ou sem CPMF, o governo terá que cumprir a Emenda 29, destinando R$ 45 bilhões para a saúde. E o Bolsa Família tem outras fontes de arrecadação como o PIS e a Cofins”, diz a senadora. Porta-voz da oposição, Kátia Abreu diz não aceitar nenhum dos argumentos do governo por causa do superávit de arrecadação previsto para este ano, que deve bater na casa dos R$ 60 bilhões.
PAC da Saúde
O governo sustenta que vem da taxação sobre as movimentações financeiras metade dos R$ 29,8 bilhões que destina para o financiamento da saúde nos estados. Ou seja, R$ 15,6 bilhões por ano. Com esse valor, diz o relatório, foi permitido custear 849 milhões de atendimentos de cirurgia, transplante, parto e o tratamento de doenças graves como câncer e Aids na rede pública de saúde em 2007.
O estudo também bate na tecla, reforçada na última quarta-feira (5) pelo próprio presidente Lula, de que só a prorrogação da CPMF vai garantir a aplicação de mais R$ 24 bilhões para o PAC da Saúde, cuja previsão de investimentos é de R$ 89 bilhões até 2011 (leia mais).
Nordeste em peso
Segundo o levantamento da Presidência da República, todos os nove estados do Nordeste e três do Norte (Acre, Pará e Tocantins) receberão este ano mais do que contribuíram para o bolo do CPMF.
A Bahia, do governador Jaques Wagner (PT), e o Ceará, do governador Cid Gomes (PSB), têm o maior volume de retorno. Ambos, conforme o governo federal, receberão R$ 500 milhões a mais do que o total arrecadado por seus contribuintes.
Veja a relação dos 12 estados que, ao final do ano, terão recebido mais recursos provenientes da CPMF do que o valor arrecadado, segundo o governo federal:
– Acre
Contribuição: R$ 87 milhões
Retorno: R$ 104 milhões
– Alagoas
Contribuição: R$ 382 milhões
Retorno: R$ 539 milhões
– Bahia
Contribuição: R$ 2,0 bilhões
Retorno: R$ 2,5 bilhões
– Ceará
Contribuição: R$ 1,0 bilhão
Retorno: R$ 1,5 bilhão
– Maranhão
Contribuição: R$ 640,6 milhões
Retorno: R$ 1,1 bilhão
– Pará
Contribuição: R$ 797 milhões
Retorno: R$ 1,0 bilhão
– Paraíba
Contribuição: R$ 510 milhões
Retorno: R$ 713 milhões
– Pernambuco
Contribuição: R$ 1,2 bilhão
Retorno: R$ 1,6 bilhão
– Piauí
Contribuição: R$ 390 milhões
Retorno: R$ 581 milhões
– Rio Grande do Norte
Contribuição: R$ 470 milhões
Retorno: R$ 520 milhões
– Sergipe
Contribuição: R$ 317 milhões
Retorno: R$ 364 milhões
– Tocantins
Contribuição: R$ 200 milhões
Retorno: R$ 207 milhões
Clique aqui para ver a relação completa
Trio bilionário
Na outra ponta dessa relação custo-benefício, estão os três estados que mais contribuem para a arrecadação total da CPMF: São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro.
Responsáveis por quase um terço da contribuição arrecadada em todo o país, ou seja, cerca de R$ 10,3 bilhões, os paulistas têm o menor percentual de “retorno”, o que não os impede de ostentar, por outro lado, aquela que é de longe a mais expressiva cifra.
O estado mais rico da Federação recebe de volta R$ 6,6 bilhões na forma de benefícios sociais financiados pela CPMF. São R$ 3,77 bilhões para a saúde, R$ 2,2 bilhões para a Previdência rural e R$ 663,8 milhões para o Bolsa Família.
Já os mineiros, que contribuem com R$ 3,8 bilhões, têm o retorno de R$ 3,1 bilhões. Desse total, R$ 1,6 bilhão tem como destino o custeio da saúde pública; R$ 817,3 milhões, o Bolsa Família; e R$ 698,6 milhões, a Previdência Rural.
No Rio, os contribuintes pagam R$ 3,6 bilhões por ano de CPMF. De volta, os fluminenses recebem R$ 2,7 bilhões por ano. Parte desse dinheiro, R$ 297,3 milhões, vai para o Bolsa Família. Além disso, R$ 1,5 bilhão é destinado à saúde e outros R$ 871,2 milhões, para a Previdência. Com a contribuição, o governo diz pagar 100% (R$ 381 milhões) das aposentadorias dos trabalhadores rurais do Rio de Janeiro.
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