Por Henrique Fróes
Da extensa lista de invenções que atribuímos aos gregos, podemos destacar – sem pudor! – a da representação artística do nu. Como toda questão referente à primazia de um povo sobre o outro, há sempre controvérsias: afinal, encontram-se figuras despidas também nas produções dos egípcios, caldeus e assírios. Mas, como afirma Sophia de Mello Breyner Andresen em seu livro O nu na antiguidade clássica, foram os gregos que fizeram do nu um tema constante e fundamental de sua arte.
Já no período arcaico da arte grega, temos os kouroi – estátuas que representavam jovens desnudos e eretos. O nu também está presente na pintura dos vasos, como podemos ver na célebre obra de Exekias, na qual o herói grego Ajax prepara o seu suicídio. No período clássico, estátuas famosas como o Discóbolo de Míron, o Doríforo de Policleto e o Hermes de Praxíteles aderem totalmente ao princípio da genitália desnuda.
O que todos esses artistas buscavam com a representação do nu era a revelação do divino. Eles viam nas formas do corpo humano a mesma beleza e a mesma harmonia que encontravam na natureza e no cosmos. Trataram, então, de evidenciar essa perfeição física em figuras ideais. Como atesta Ernest Gombrich em seu clássico A história da arte, não existe corpo humano que seja tão simétrico, bem-construído e belo quanto o das estátuas gregas.
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O corpo humano assim representado em sua perfeição ideal estabelecia uma relação direta entre os homens e os deuses. Como retratam os versos do poeta Píndaro, o homem grego via-se como um semelhante dos habitantes do Olimpo: “pela forma corpórea, ou no vigor do espírito, somos no entanto como os imortais.” Como censurar, ou mesmo se envergonhar, então, daquilo que nos aproxima da divindade?
Publicidade Nudez pública e feminina
Os artistas gregos tinham uma relação muito mais próxima do nu do que seus colegas de outras eras. Eles não precisavam recorrer a modelos ou mesmo a cadáveres para estudarem as formas e proporções do corpo humano. Diariamente, nos ginásios, poderiam ver os jovens exercitando-se ao natural – como era costume na sociedade grega. Nos Jogos Olímpicos, os atletas também competiam do jeito que vieram ao mundo.
Vale lembrar que os gregos também não se furtaram a representar a nudez feminina. Foi somente no período clássico que as estátuas perderam seus vestidos e véus. Um marco dessa evolução é a Afrodite de Cnido – mais uma obra de Praxíteles. O original se perdeu, mas as cópias mostram a deusa despindo-se ao preparar-se para o banho. Com a roupa em uma das mãos, ela esconde os genitais com a outra.
Diz a lenda que, ao receber a encomenda do povo de Cós de uma imagem da deusa Afrodite, o célebre escultor acabou por produzir duas, uma delas nua. Escandalizados, os que encomendaram a obra teriam rejeitado a versão menos pudica – ela foi então, comprada por alguns cidadãos de Cnido. Segundo Martin Robertson, em Uma breve história da arte grega, o povo de Cós acabou sendo alvo de escárnio por ter rejeitado a versão mais à vontade da deusa – mais uma prova da sabedoria imortal dos gregos.
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Assim como os gregos revolucionaram ao retratar o nu, os brasileiros com suas mentes de esquerda, degeneradas e amorais, também propulsionaram esta forma de arte quando do episódio em que uma chocadeira (aquilo lá não é mãe) levou sua filha criança para tocar um peladão num museu. Vemos a repercussão positiva e progressista através dos aplausos da nossa classe artística.
Minha admiração incondicional estará sempre com as mães que levam filhos aos museus…