A ideia em um segundo Questionados sobre se os poderes exorbitam de suas atribuições constitucionais, congressistas isentaram a si próprios e, ao contrário, apresentaram fortes críticas aos seus colegas de Praça dos Três Poderes. Tanto o Executivo quanto o Judiciário rondam os 50% de crítica. Para cerca de metade dos deputados e senadores entrevistados, Executivo e Judiciário atuam além de suas prerrogativas. Tal quadro reflete o embate mais forte entre a oposição e o presidente Bolsonaro e uma crítica generalizada na Câmara dos Deputados ao Judiciário. Um bônus da análise é a luz que lança sobre dois assuntos ainda quentes: a (im)possível nomeação de André Mendonça ao STF e o destino da PEC que altera as regras de controle sobre o Ministério Público. |
Este Farol é o quarto da série que explora os achados da rodada de setembro do Painel do Poder, survey conduzido pelo Congresso em Foco Análise trimestralmente junto a cerca de 70 lideranças do Congresso Nacional.
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Nas semanas passadas, apresentamos aos leitores dados e análises sobre as possibilidades de impeachment do presidente Bolsonaro e o apoio e as chances de aprovação das reformas administrativa e tributária. Agora, abordaremos a crise entre os poderes, a partir do olhar dos parlamentares. Conclusões interessantes podem ser tiradas sobre o destino de André Mendonça em sua ainda possível condução ao STF, e ao futuro da PEC que muda as regras de controle sobre o Ministério Público (PEC 5/21).
A Exorbitância dos Poderes
Deputados federais e senadores foram questionados se os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário exorbitam de suas prerrogativas constitucionais.
O pano de fundo da pergunta consiste tanto na atuação corrente do presidente Bolsonaro, que chegou a atacar o STF e o Congresso, assim como a defender o não cumprimento de ordens judiciais, quanto à rusga permanente entre Legislativo, Judiciário e Ministério Público naquilo que para alguns é um freio à criminalização da política e para outros é a busca da impunidade.
PublicidadeA resposta dos parlamentares dividia-se entre sim, exorbita, e não, não exorbita.
A tabela abaixo mostra as porcentagens de respostas. Verifica-se que, segundo os congressistas, o Legislativo, sua própria casa, não exorbita de suas atribuições. Para 87,5% dos parlamentares, o Congresso mantém-se na linha, contra apenas 6,9% que avaliam que ele atua inconstitucionalmente.
A avaliação dos Poderes Executivo e Judiciário, ao contrário, foi acentuadamente crítica. Segundo 47,2% dos parlamentares, o Poder Executivo exorbita de suas funções, enquanto para o Judiciário o valor é ainda superior, 52,8%.
Exorbita? | Legislativo | Executivo | Judiciário |
Não | 87,5% | 50,0% | 41,7% |
Sim | 6,9% | 47,2% | 52,8% |
NS/NR | 5,6% | 2,8% | 5,6% |
Total | 100,0% | 100,0% | 100,0% |
A avaliação ruim do Poder Executivo está naturalmente associada aos ataques que o presidente Bolsonaro realizou aos demais poderes desde sua posse. Já o Judiciário paga pelo seu ativismo, ao praticamente deliberar sobre matérias e muitas vezes fazê-lo monocraticamente, e provavelmente pela associação do Ministério Público, e também seu ativismo, à imagem do Judiciário (embora o MP não seja a rigor poder Judiciário).
Ressalte-se que, em uma situação de normalidade em um sistema democrático constitucional, a resposta esperada seria que nenhum poder exorbita de suas funções. Os altos valores apontados pelos parlamentares para o poder Judiciário e o poder Executivo indicam o clima conflagrado e de hostilidade aberta entre os poderes vivenciado nos últimos anos.
Mas o povo pensa que… Em que se pese a autoavaliação extremamente positiva que os congressistas se atribuíram, quando se trata de avaliar o nível de confiança da população nas instituições, esses se saem pior do que os outros dois poderes.
O poder Legislativo é a instituição com menor confiança da população. Já o poder Executivo, seja na dimensão genérica ‘governo nacional’, seja na dimensão pessoal do presidente da República, alcança uma confiança maior. E o poder Judiciário, em comparação com seus pares, é a instituição mais confiável para a população. São indícios que podem alimentar a análise do cenário, inclusive eleitoral. Uma eventual candidatura de Sergio Moro, por exemplo, depende bastante dessa percepção da população de que o poder Judiciário é mais confiável do que os dois outros poderes. |
As diferenças de avaliação
Quando separados entre parlamentares da base, independentes e oposicionistas, a avaliação do Executivo é bastante díspar. A base maciçamente entende que o poder Executivo não exorbita de suas prerrogativas constitucionais. Já a oposição encontra-se em posição inversa (veja gráfico abaixo). Interessante, contudo, a avaliação dos independentes, que mantêm um padrão similar ao da base. Em outras palavras, a oposição consiste no grande crítico do poder Executivo, algo esperado.
A avaliação do poder Judiciário já se mostra mais interessante. Se a crítica ao poder Executivo se alinha fortemente ao embate clássico dos poderes políticos ativos, Executivo e Legislativo, os quais disputam eleições e criam coalizões, a avaliação do Judiciário deve-se a outro rol de fenômenos.
O gráfico a seguir mostra que a crítica ao Judiciário é majoritária na base e entre os independentes: 64,7% dos primeiros e 58,6% dos segundos entendem que o Judiciário exorbita de suas atribuições constitucionais.
No caso da oposição ─ que tem visto o STF opor-se a muitas políticas de Bolsonaro e assim colabora com seus objetivos de contrastar o presidente ─ a crítica não é majoritária, contudo, atinge valores ainda altos, pois 38,5% dos oposicionistas entendem que o Judiciário exorbita de suas atribuições constitucionais. Neste último caso provavelmente trata-se de rescaldos da Lava Jato.
A divisão entre deputados federais e senadores ganha muito significado na crítica ao Judiciário. Na Câmara dos Deputados, ampla maioria condena “práticas exorbitantes” dos magistrados, enquanto no Senado Federal, embora haja crítica, a maioria dos senadores entende que o Judiciário não exorbita de suas funções constitucionais.
Enquanto 75,0% dos deputados da base, 60,0% dos independentes e 47,4% dos oposicionistas apontam a exorbitância dos ministros e juízes, no Senado o clima é bastante mais ameno: 40,0% dos membros da base na casa, 55,6% dos independentes e apenas 14,3% dos oposicionistas criticam o Judiciário.
Os números nos permitem avançar duas constatações “quentes”.
A postura mais favorável ao Judiciário no Senado permite inferir, como tem-se visto na crônica política, que o grande obstáculo à nomeação de André Mendonça para o STF seja realmente localizado, um voo solo do presidente da CCJ, senador Davi Alcolumbre (DEM-AP). Parece-nos que os senadores não vêem razão para beligerância com o Judiciário.
De fato, o Painel do Poder também questionou os senadores sobre as chances de aprovação do nome de André Mendonça para o STF e o resultado foi favorável a ele, conforme se vê no gráfico abaixo. Para a maioria, as chances de aprovação são superiores a 3, a média na escala 1 a 5.
Em suma, André Mendonça ainda pode acalentar alguma esperança na aprovação, embora Alcolumbre deva estar avaliando com lupa as condições para sua rejeição.
A segunda conclusão “quente” refere-se à PEC que modifica as condições de controle do Ministério Público e a composição do seu Conselho. Objeto de forte embate político na Câmara.
De toda forma, a crítica acerba que leva à busca de maior controle sobre o Ministério Público parece não se mostrar com a mesma intensidade no Senado Federal, isto se considerarmos que a relação do Poder Legislativo com o Judiciário, conforme temos inferido aqui na pesquisa, também se estenda qualitativamente ao Ministério Público.
Assim, os membros do Ministério Público e os que defendem a PEC devem ter clareza que se trata de uma luta com dois rounds distintos, um na Câmara e outro no Senado.
TERMÔMETRO
CHAPA QUENTE | GELADEIRA |
Da reunião do G20, o grupo das 20 maiores economias do mundo, que acontece este fim de semana em Roma, na Itália, a grande maioria dos líderes seguirá para Glasgow, na Escócia, onde acontece a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, a Cop26. Esse, porém, não será o roteiro do presidente Jair Bolsonaro. O presidente sabe que, caso fosse a Glasgow, se tornaria ali o alvo preferencial das demais nações por suas posições ambientais. Ausente à Cop ou não, a pressão sobre Bolsonaro, porém, aumentará, especialmente depois de ter se tornado o primeiro líder mundial diretamente responsabilizado por integrantes de um dos poderes do seu país pelo agravamento da covid-19. |
Bolsonaro levou a tiracolo para Roma seu ministro da Economia, Paulo Guedes. Depois da crise da semana passada, quando quatro auxiliares de alto escalão do Ministério da Economia pediram demissão, Guedes permaneceu no cargo. Mas o ministro não é hoje nem sombra do que prometia ser no início do governo. Falta a essa altura combustível no Posto Ipiranga, mesmo que seja a R$ 7 o litro. Quem permanece na Esplanada dos Ministérios é um Paulo Guedes rendido à lógica do Centrão, que aceita furar o teto de gastos para pagar milhões de emendas ao orçamento. Seus professores da Escola de Chicago certamente devem estar corados…
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