Por meio de nota (íntegra abaixo), o presidente Michel Temer (MDB) voltou a tentar desqualificar nesta quinta-feira (14) o conteúdo do diálogo com o empresário Joesley Batista (J&F), gravado em março de 2017 no subsolo do Palácio do Jaburu. Na conversa, gravada por Joesley sem Temer saber, em encontro secreto, o emedebista ouve o interlocutor dizer que mantém boa relação com o deputado cassado Eduardo Cunha (MDB-RJ), preso e condenado na Operação Lava Jato e de quem se esperava uma delação premiada. Nesse instante da conversa, Temer sugere que Joesley mantenha a situação sob controle, o que foi interpretado como forma de calar o presidiário.
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A nota de Temer é uma reação ao teor do relatório final da Operação Cui Bono, como este site mostrou mais cedo, por meio do qual a Polícia Federal afirma haver “indícios suficientes de materialidade e autoria” de que o Temer tentou comprar o silêncio do ex-presidente da Câmara e de Lúcio Funaro – delator da Lava Jato, Funaro é apontado nesta e em outras investigações como operador do PMDB em esquemas de corrupção.
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A acusação é baseada na delação premiada de Joesley Batista, reforçada com a ação coordenada do Ministério Público Federal (MPF) com a própria PF para fazer o flagrante da gravação. Além do áudio, a força-tarefa da Lava Jato flagrou a entrega de uma mala de dinheiro com R$ 500 mil em espécie ao ex-deputado suplente Rodrigo Rocha Loures (MDB-PR), ex-assessor direto de Temer que foi gravado e filmado correndo por uma rua de São Paulo depois de receber a quantia – segundo o MPF, parte de uma mesada milionária a ser paga a Loures e o presidente, a título de propina em troca de apoio aos negócios da J&F.
Segundo a PF, o presidente incentivou Joesley Batista a manter pagamentos a Cunha e Funaro, ambos presos, para que eles não fizessem acordos de delação premiada. Em depoimento, Joesley disse que repassou R$ 5 milhões para Cunha depois que ele foi preso, em outubro de 2016, como “saldo de propina”. O empresário contou ainda que pagou R$ 400 mil por mês para Funaro. Em sua delação premiada, o operador admitiu que recebeu o dinheiro em troca de silêncio. O esquema configura obstrução de Justiça, aponta o MPF.
Segundo a nota, “é mentirosa a insinuação” de que o presidente atuou para manter o silêncio dos potenciais delatores. “Apesar da ausência absoluta de provas, investigadores insistem em retirar do contexto diálogos e frases para tentar incriminar o presidente da República”, diz trecho do comunicado.
Suspeita de obstrução
Mas a nota não faz qualquer menção aos demais elementos da gravação. Em uma parte da conversa, Joesley conta a Temer que tem controlado as ações de um juiz auxiliar e de juiz substituto envolvidos com as investigações da Lava Jato. Além disso, continua o empresário, conseguiu um procurador da força-tarefa da Lava Jato para mantê-lo informado sobre a consecução das apurações. Em boa parte da conversa, não é possível ouvir o que Temer diz. Leia trecho abaixo:
[…]
Joesley: Também. Eu tô segurando as pontas, tô indo. Meus processos, eu tô meio enrolado aqui, né. No processo, assim…
Temer: [inaudível]
Joesley: Isso, isso, é, é investigado. Não tenho ainda a denúncia. Aqui eu dei conta de um lado, o juiz, dá uma segurada do outro lado, o juiz substituto, que é um cara que fica…. [Inaudível] Tô segurando os dois. Consegui um procurador dentro da força tarefa, que tá, também tá me dando informação. E lá que eu tô para dar conta de trocar o procurador que tá atrás de mim. Ô, se eu der conta, tem o lado bom e o lado ruim. O lado bom é que dá uma esfriada até o outro chegar e tal. O lado ruim é que se vem um cara com raiva, com não sei o quê…
Temer: [inaudível] ajudando.
Joesley: Tá me ajudando tá bom, beleza. Agora, o principal… O que tá me investigando. Eu consegui colar um [procurador] no grupo. Agora eu tô tentando trocar…
Temer: O que tá… [inaudível].
Batista: Isso! Tamo nessa aí. Então tá meio assim, ele saiu de férias. Até essa semana eu fiquei preocupado porque até saiu um burburinho de que iam trocar ele, não sei o quê, fico com medo. Eu tô só contando essa história para dizer que estou me defendendo aí, to me segurando. Os dois lá estão mantendo, tudo bem.
Reincidência
Esta não é a primeira vez em que um relatório da PF implica Temer em grave enredo de corrupção. Em setembro de 2017, como o Congresso em Foco também noticiou, a PF concluiu o inquérito que investiga a formação de uma organização criminosa composta pelo núcleo do PMDB da Câmara. A PF aponta que Temer tinha o poder de decisão no grupo ao lado de Cunha, e que o presidente recebeu do esquema ao menos R$ 31,5 milhões em vantagens ilícitas.
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O relatório, apresentado no dia 11 daquele mês, aponta que Michel Temer, os ministros Eliseu Padilha (Casa Civil) e Moreira Franco (então na Secretaria-Geral da Presidência), os ex-ministros Geddel Vieira Lima e Henrique Eduardo Alves (Secretaria de Governo e Turismo) e Eduardo Cunha formavam uma organização criminosa para desviar recursos de órgãos públicos como a Caixa Econômica Federal. Os peemedebistas negaram toda as acusações à época, mas só dois deles não foram presos, Eliseu e Moreira.
Além de duas denúncias congeladas no STF, que serão reativadas quando Temer deixar o Palácio do Planalto, o presidente é alvo de dois inquéritos ativos sob responsabilidade do STF. Em um deles, é acusado de receber propina por meio da edição do Decreto dos Portos, legislação sob encomenda para beneficiar concessionárias do Porto de Santos como a Rodrimar. Em outro, é apontado como um dos beneficiários de pagamentos milionários acertados com a Odebrecht em um jantar no Palácio do Jaburu.
Leia a íntegra da nota:
Nota à imprensa
É mentirosa a insinuação de que o presidente Michel Temer incentivou pagamentos ilícitos ao ex-deputado Eduardo Cunha e a Lúcio Funaro. Isso jamais aconteceu. A gravação do diálogo com Joesley Batista foi deturpada para alcançar objetivo político. A verdade é que, na conversa grampeada, quando o empresário diz que mantinha boa relação com o deputado, o presidente o incentiva a não alterar esse quadro. Segue a transcrição desse trecho do diálogo:
Joesley – “Eu tô de bem com o Eduardo”
Michel Temer – “Tem que manter isso, viu?”
Portanto, não tem nada a ver com aval a qualquer pagamento a quem quer que seja. Assim, é ridículo dizer que houve obstrução à Justiça e, muito menos, relativamente a qualquer caso envolvendo integrantes da Magistratura e do Ministério Público. O presidente não tinha nomes, e nem sequer sabia que o procurador Marcelo Müller estava trabalhando para a J&F da família Batista.
Apesar da ausência absoluta de provas, investigadores insistem em retirar do contexto diálogos e frases para tentar incriminar o presidente da República.Perpetuam inquéritos baseados somente em suposições e teses, sem conexão com fatos reais.
Secretaria Especial de Comunicação Social da Presidência da República
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