Cleber Lourenço *
No último domingo (3), tivemos a revelação do Pandora Papers, a maior investigação jornalística mundial sobre as offshores a partir de 11,5 milhões de documentos relacionados a milhares de empresas abertas em paraísos fiscais e que no Brasil foi publicada por veículos como o portal Metrópoles, o jornal El País e a revista Piauí.
A investigação revelou que, no dia 25 de setembro de 2014, o então economista Paulo Guedes e sócio da Bozano Investimentos fundou a Dreadnoughts International, uma offshore nas Ilhas Virgens Britânicas, um paraíso fiscal no Caribe. Aportando US$ 9,54 milhões — o equivalente, hoje, a mais de R$ 50 milhões — na conta da offshore.
A intenção do atual ministro seria proteger os seus recursos das turbulências do governo Dilma Rousseff, por fim, acabou protegendo-se de si próprio.
Defesa de Guedes diz que ele não movimentou a offshore desde 2018, mas que apresentarão as provas à PGR. Eu também tenho certeza de que ele não movimentou diretamente a conta.
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Afinal, para valorizar os investimentos nela, basta o real se desvalorizar. Tudo sem encostar na conta.
Basta olhar ontem! O dólar voltou a ser negociado acima de R$ 5,50 e com isso Paulo Guedes já lucrou mais R$ 200 mil na sua offshore dolarizada.
No mesmo dia, o IBGE mostrou que as vendas no varejo em agosto caíram 3,1%, maior queda para o mês e terceiro pior resultado para o setor em 20 anos.
No dia 2 de dezembro de 2019, o ex-presidente americano Donald Trump escreveu em seu Twitter:
“Brasil e Argentina estão promovendo desvalorização em massa de suas moedas, algo ruim para os nossos fazendeiros. Portanto, tendo efeito imediato, vou restaurar as tarifas sobre aço e alumínio que são importados aos Estados Unidos desses países”.
Porém, o que acreditávamos ser uma discussão restrita apenas ao campo comercial mudou com a vinda do Pandora Papers. Como mencionei acima, Guedes, por ter investimentos dolarizados em uma offshore, lucra sempre que o dólar sobe.
Quem pode ter uma offshore?
O artigo 5º do Código de Conduta da Alta Administração Federal, de 2000, proíbe funcionários do alto escalão de manter aplicações financeiras – no Brasil ou no exterior – que possam ser afetadas por políticas governamentais.
Eu posso ter uma offshore? Sim! E você? Também! Sabe quem não pode? O responsável direto pela política econômica do país que lucra sempre que a sua própria moeda desvaloriza.
É tipo Sérgio Moro com Lula: um juiz fazendo parte da acusação. Não dá.
Guedes, como ministro da Economia, é homem que dita os rumos da política econômica do Brasil, ou seja, são suas ações e decisões que definem se o real irá se desvalorizar ou não, assim como fatores externos, porém, é inegável a sua influência no câmbio brasileiro.
E a situação só fica pior quando lembramos das seguidas declarações do ministro da Economia e que eram flagrantemente contra o dólar baixo, o que segundo ele era “uma bagunça danada”.
A alta contínua do afeta diretamente no aumento de custos das empresas, que impacta diretamente o consumidor, isso em um país onde a o desemprego se tornou uma epidemia e a fome voltou a assolar outros milhões de brasileiros.
Ou seja, é um fato concreto: quando Guedes lucra, o brasileiro perde.
O IBGE já deixou claro que a corrosão do poder de compra já impactou o consumo e quanto menor o consumo, pior é o cenário econômico que se desenha à frente.
E Bolsonaro se recusa a demitir o Paulo Guedes por ter no ministro a confiança de que a política econômica não sofrerá mudanças radicais.
Ou seja: ou Bolsonaro acredita que, do jeito que está, a economia está boa, com a inflação fora de controle, desemprego e desaceleração do consumo ou o presidente simplesmente não se importa com descalabro econômico no país.
Você viu o Paulo Guedes atuando para minimizar a inflação, retomar o consumo ou diminuir a alta do dólar? Todos esses, quem está tentando resolver é o Congresso.
Sabe onde ele se meteu? Convencendo relator da MP da reforma tributária a não taxar recursos de paraísos fiscais. Se um ministro que atua para não ter os próprios investimentos tributados não é conflito de interesses, então eu não sei o que é.
A imprensa
E, embora os três principais jornais do país tenham surfado na onda anticorrupção dos últimos anos e se coloquem contra os desatinos da Presidência da República, me pergunto:
Por qual motivo nenhum dos jornais deu o devido destaque para a denúncia no dia seguinte? Um dos jornais sequer mencionou o fato, os demais se resumiram a notas diminutas, praticamente de rodapé.
Nos principais telejornais, seja da TV aberta ou fechada, a abordagem do ocorrido foi praticamente inexistente.
A convocação
Esse é um estrondoso conflito de interesses que afeta os milhões de brasileiros assalariados desse país, está claro que o ministro não atua em prol do Brasil.
E nas próximas semanas a situação poderá se agravar ainda mais. Guedes, em toda a sua passagem pelo governo, colecionou conflitos e atritos com os parlamentares, ele já deixou claro em diversos episódios o desdém que possuí pela política e os políticos.
Também é um notável destemperado, que sempre possui uma declaração mordaz na ponta da língua.
A convocação certamente será desastrosa para o ministro que foi abandonado até mesmo pela base governista.
Será que ficaremos livres do ministro que sempre promete e nunca entrega?
* Cleber Lourenço é pós-graduando em Jornalismo político.
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