Repassado pelo coletivo Vila Vudu, um excelente artigo do jornalista americano Robert Parry do Consortium News faz um retrospecto cheio de humor cáustico da história do moderno jornalismo ianque, e de como este se tornou “imprensa-empresa”. Até por que nos EUA a imprensa-empresa jamais foi liberal.
No Brasil, idem, sequer de centro, sempre foi de direita mesmo e a mais impertérrita- udenista-fascistóide, virou tucana-uspeana num mix de Sorbonne & Escola de Chicago e ultimamente enquadra-se como sionista-opusdeiana-Danuza-Leãosista – contudo, sempre fascista. Na melhor das hipóteses, pode-se dizer que houveram períodos, no passado não muito distante, quando as grandes empresas-imprensa faziam melhor seu trabalho no sentido de apresentar os fatos. E havia a chamada imprensa “underground” que publicava algum material que a grande imprensa-empresa não tinha onde por ou simplesmente ignorava.
Assim, existiram jornalistas que revelaram os horrores sobre a segregação racial nos anos 50 e 60; correspondentes de guerra expuseram a terrível violência da Guerra do Vietnã nos anos 70; algumas grandes empresas-jornais desafiaram o governo dos EUA e publicaram a história real, vazada, daquela guerra, em 1971; o Washington Post revelou uma parte (embora evidentemente não tudo) dos crimes políticos de Richard Nixon entre 1972 e 1974; e o New York Times liderou a divulgação de uma parte da história suja da CIA em meados de 1970.
Apesar desse trabalho ofender a Direita & alas do Establishment, tais matérias tiveram um elemento comum: eram histórias verdadeiras. Nesse sentido, não eram nem “liberais”, nem “conservadoras”, nem “centristas”. Era jornalismo simplesmente acurado, honesto, bem feito, e contribuiu para reavivar as instituições democráticas dos EUA, dos protestos nas ruas à pressão pelos tribunais contra quem chantageava e pressionava com lobbies funcionários do Estado.
Essa ressurreição da democracia participativa era o que os poderosos mais temiam, fosse no sul segregacionista ou nos bancos de Wall Street e grandes corporações. Estes organizaram uma poderosa contra-ofensiva para simultâneamente: a) impedir novas ‘revelações’ (provavelmente mais ameaçadoras a cada dia) de crimes, erros e vícios, e b) reassumir o controle dos canais de informação que influenciam o modo como o povo norte-americano vê o mundo.
Naquele contexto, uma das estratégias mais efetivas de propaganda sempre foi apresentar o jornalismo decente como “de esquerda” e desqualificá-lo como “antiamericano”. Assim, muitos leitores/espectadores/ouvintes começariam a duvidar de qualquer informação de boa qualidade, ao mesmo tempo em que passariam a descartar a informação honesta, acusada de possuir “viés político”.
Nos anos 80, os homens de Reagan referiam-se às suas principais metas como “chutar para bem longe a Síndrome do Vietnã”, quer dizer: apagar, na população dos EUA, qualquer resistência a qualquer movimento para os arrastar novamente para guerras em países longínquos, instigados por mentiras.
A chave para o sucesso sempre foi conseguir controlar a maior quantidade possível de veículos de mídia – fosse através de jornalistas-proprietários da Direita ativa; ou com pressão sobre os executivos dos veículos de notícias para que adotassem postura mais “patriótica”; ou por intimidação direta contra qualquer um que não se alinhasse.
As táticas deram certo. Aliás, com uma grande força da própria Esquerda, que se vendeu ou se fechou (ou radicalizou ou se dividiu, como sempre e eternamente) e, no geral, desistiu, de vários dos veículos da imprensa “underground” da era Vietnã para concentrar-se em questões locais: “pensar globalmente e agir localmente”, tornou-se sua divisa.
Essa combinação de fatores deu à Direita e conservadores do Establishment domínio completo sobre a imprensa. Como um exército que controlasse os céus, a Direita e os conservadores passaram a fazer o que bem entendesse para detonar qualquer um que se interpusesse, fosse político, jornalista ou cidadão. Nenhum ser humano meramente atento aos fatos jamais estaria a salvo, na noite escura que desceu sobre o jornalismo-empresa.
O sucesso da Direita pode ser aferido em diferentes momentos do processo: quando os Republicanos conseguiram esconder o escândalo dos “Contra” do Irã em 1987 e quando o presidente George H.W. Bush disse, depois de destruir o já destroçado exército iraquiano, em 1991: “Chutamos para bem longe, de uma vez por todas, a Síndrome do Vietnã”.
A realidade da imprensa-empresa de notícias – que só cresceu durante os anos 90 e início de 2000 – então já era que a Direita podia inventar qualquer tema forjado e convertê-lo em noticia, na certeza de que milhões de norte-americanos engoliriam qualquer coisa. Assim, o presidente George W. Bush pode inventar dezenas de mentiras a pretexto de invadir o Iraque em 2003, que os proprietários e jornalistas das empresas-imprensa não apenas nada fizeram para estabelecer a verdade como até o ajudaram engrupir o povão coletivamente.
Vez ou outra algumas vozes emergiam na Internet e em alguns veículos de baixa circulação e audiência para desmentir as mentiras de Bush sobre a guerra do Iraque; mas não era difícil para a grande empresa-imprensa desqualificá-los ou ignorá-los. Foi preciso que se acumulassem os erros e fracassos de Bush na Guerra nessa guerra e outras crises locais e internacionais para que, afinal, a máquina superpotente de propaganda da direita começasse a engripar.
Mas a dinâmica geral nunca mudou. Sim, a rede MSNBC – depois de fracassar na tentativa de se posicionar tanto à extrema direita quanto junto à Fox News – se moveu ligeiramente para o centro e conseguiu algum sucesso de audiência com interpretações “liberais” da política doméstica (porém sem jamais desafiar abertamente o que o Establishment mandava dizer sobre política externa).
O mote da ultra-direita agora é comprar as empresas para controlar as notícias. Simples assim. Num futuro próximo, algumas das mais conhecidas e influentes redes regionais de noticiário poderão já estar sob controle direto de ideólogos da extrema direita nos EUA, como Rupert Murdoch ou os Irmãos Koch.
As Koch Industries, gigante de petróleo e gás, que oferecem todos os recursos necessários para que Charles e David Koch financiem fartamente inúmeros think tanks e organizações do movimento Tea Party, já começaram a comprar oito veículos regionais da Tribune Company, incluídos aí o Los Angeles Times, o Baltimore Sun, o Orlando Sentinel, o Hartford Courant e o Chicago Tribune, segundo o New York Times domingo passado. Ao comprar os veículos do grupo Tribune, os Irmãos Koch não só terão mais uma importante plataforma para distribuir propaganda de extrema direita, como irão fazer da vida política (e privada) dos adversários políticos, um perfeito inferno.
Outro a entrar nesse negócio, comprando o Los Angeles Times, é o magnata sionista Rupert Murdoch, dono da rede Fox News e de poderosos jornais diários no Reino Unido e nos EUA, dentre os quais o Wall Street Journal.
Até muitos sites da internet, com um forte interesse em fazer jornalismo investigativo, vivem sob a pressão da falta de recursos financeiros e de material humano para produzir esse tipo de projeto com regularidade.
Se não forem feitos mais investimentos – de cidadãos e empresas honestas – seja na velha mídia impressa ou na nova mídia eletrônica, para que se produza jornalismo de melhor qualidade –, os EUA continuarão a navegar para o fundo do poço num mundo de ficção, interesses escusos, paranóia direitista e factóides.
Um grave risco para todo o planeta, sendo os EUA (ainda) a potência culturalmente hegemônica.
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