O Brasil, como bem consta em seu nome oficial – República Federativa do Brasil – é uma federação. Tal sistema está disposto na Constituição Federal de 1988, em seu artigo 23, que decreta que é “competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios zelar pela guarda da Constituição, das leis e das instituições democráticas e conservar o patrimônio público”. Assim, cada ente federado tem sua parcela de responsabilidade no governo do país.
O equilíbrio entre as responsabilidades, contudo, é um dos nossos grandes desafios. A Emenda Constitucional nº 53, de 2006, determinou que uma “lei complementar fixará normas para a cooperação entre a União e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, tendo em vista o equilíbrio do desenvolvimento e do bem-estar em âmbito nacional.” A realidade, entretanto, não é essa.
A divisão de responsabilidades na educação, ponto crucial nas políticas públicas, é determinada pelo artigo 211 da Constituição Federal de 1988. Segundo o artigo, os municípios atuarão prioritariamente no ensino fundamental e na educação infantil e os estados e o Distrito Federal atuarão prioritariamente no ensino fundamental e médio. A União é responsável por organizar o sistema federal de ensino, financiar as instituições de ensino públicas federais e exercer, em matéria educacional, função redistributiva e supletiva, de forma a garantir equalização de oportunidades educacionais e padrão mínimo de qualidade do ensino mediante assistência técnica e financeira aos estados, ao Distrito Federal e aos municípios.
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Nesse setor, em 2010, a União foi responsável por 1.248 matrículas em creches, os estados, por 7.308; e os municípios, por quase a totalidade, 1.345.180. Dos recursos arrecadados, no mesmo ano, a União ficou com 57%, os estados e DF com 25% e os municípios com somente 18%. A participação percentual dos gastos, porém, foi de 41% nos estados e DF, de 39% nos municípios e de 20% pela União. A educação infantil é, claramente, a etapa mais fragilizada da educação básica, pois somente 23,5% das crianças de 0 a 3 anos são atendidas em creches no Brasil.
Para tratar do problema, são necessários diagnósticos e, nesse quesito, o Brasil é muito rico. A educação conta com estatísticas que permitem um planejamento adequado para seu desenvolvimento. Pesquisas elaboradas pela sociedade civil combinadas com as estatísticas do MEC e do Inep, por exemplo, dão conta de que temos todas as informações necessárias para tomar as medidas cabíveis para enfrentar esse desafio.
Nessa perspectiva, foi realizado um estudo pela Campanha Nacional pelo Direito à Educação, da qual a Fundação Abrinq faz parte de seu Comitê Diretivo, que se chama Custo Aluno Qualidade inicial (CAQi), onde são considerados todos os insumos para se ter uma educação de qualidade e, a partir disso é feita uma estimativa anual para cada criança em cada etapa da educação básica, inclusive para a creche, que apresenta um custo mais alto por conta da necessidade de maior infraestrutura e de cuidados para a criança pequena.
PublicidadeA fim de atender a demanda por creches, a presidenta Dilma prometeu a construção de mais 6 mil creches durante sua gestão. E com o intuito de efetivar uma educação infantil de qualidade, o governo federal criou o Programa Nacional de Reestruturação e Aquisição de Equipamentos para a Rede Escolar Pública de Educação Infantil (Proinfância), por considerar que a construção de creches e pré-escolas bem como a aquisição de equipamentos para a rede física escolar desse nível educacional são indispensáveis à melhoria da qualidade da educação.
Mas onde está o nó? O governo federal pode construir milhares de creches, mas quem deverá arcar com os custos de funcionamento delas são os municípios, que já possuem déficit para responder à demanda atual no setor. Se o município não tiver receita própria, só contará com os recursos repassados pelo Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) para essa finalidade.
Por meio dos cálculos do CAQi, conclui-se que os recursos destinados à educação infantil através do Fundeb são insuficientes para garantir o atendimento das crianças que estão fora da creche, talvez por isso as prefeituras não se interessam tanto no recurso federal para construção.
É preciso ampliar o aporte financeiro para a educação infantil, pois já se sabe qual é o montante de recursos necessários para custear cada etapa e demandas da educação. É preciso agora ter vontade política de priorizar a qualidade na educação pública, com uma atenção especial a essa etapa.
E isso pode ser mudado, basta que se priorize a questão. Nesse sentido, foi apresentado pelo deputado Alessandro Molon (PT-RJ) o Projeto de Lei 7029/2013, que dispõe sobre o reajuste do repasse do Fundeb para a educação infantil. O projeto merece o apoio dos parlamentares e dos gestores municipais, pois se for aprovado e o repasse for reajustado para o dobro do seu valor, é possível que os municípios passem a priorizar a construção de novas creches para atender as famílias que necessitam de um espaço educacional e de desenvolvimento para seus filhos de 0 a 3 anos. Com a aprovação desse projeto de lei, será possível desatar um nó histórico da educação infantil no Brasil.
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