Não existe mais campanha política sem uso intensivo das mídias digitais.
– Como assim, PJ? Até outro dia você mesmo dizia que as campanhas só começavam pra valer quando a propaganda política obrigatória começava a ser veiculada pelo rádio e pela televisão…
É, mas o mundo mudou, Tião. Se quiser economizar tempo e não ler o que vem a seguir não tem problema, pode parar agora. Porque daqui pra frente eu só vou justificar essa afirmação do início.
Ah, quer continuar? Então me acompanhe. Mídias tradicionais e fortes até outro dia, como o rádio e a televisão, desabaram em audiência e em importância, Tião, diante da avalanche dos posts nas redes sociais, que lhes roubaram tempo e audiência. As redes podem ser acessadas e usadas de qualquer dispositivo, móvel ou fixo. Funcionam à base de um combustível atraente e sedutor, chamado interação. As outras mídias, as tradicionais, bem que tentam, mas não têm o mesmo apelo. No máximo, as emissoras de rádio e televisão recebem um e-mail aqui, um WhatsApp ali, os locutores leem o conteúdo no ar e é só. Interação mesmo que é bom, necas. Em compensação, restou a elas um bem preciosíssimo de que as redes ainda não dispõem: cre-di-bi-li-da-de.
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– Caramba, PJ, é verdade. A gente lê o que chega pelo zap, pelo Face, pelo Twitter. Mas só acredita com fé mesmo, pra valer, quando sai numa Folha, num Globo, num Estadão, num Jornal Nacional, numa CBN…
Credibilidade, Tião. Credibilidade. Um atributo que não se encontra no WhatsApp, no Instagram, no Facebook ou no Twitter porque, pela natureza dessas plataformas de uso aberto e sem controle, elas não obedecem a qualquer protocolo de verificação, checagem e confronto de pontos de vista, como é prática obrigatória dos veículos tradicionais.
Sim, a imprensa erra. E muito.
– Ah, PJ, mas a imprensa erra pra caramba!
Erra, sim, Tião, erra muito, você tem razão. Mas na imprensa tradicional existe a chance de um desmentido, de uma retificação, de uma correção de rumos. Qual foi a última vez que tu viste um desmentido numa dessas redes sociais?
– Não me lembro… Até porque a gente só presta atenção nas notícias sensacionais. Desmentido não tem graça, né?
Justamente por isso, a grande mídia, a mídia tradicional, pela sua alta taxa de credibilidade, continua sendo o único porto seguro na busca por informação qualificada, Tião. Na qual a gente pode acreditar, mesmo com seus erros.
– Mas se essas redes não têm credibilidade, então porque na primeira frase desse artigo tu disseste que nunca mais vai ter campanha eleitoral sem zap, sem Instagram, sem Facebook…, se o eleitor não acredita neles?
Não tem contradição alguma, Tião. Quem usa essas redes, como os youtubers, tem um forte poder de influência digital. Só que essa influência não está atrelada a um valor como a credibilidade, mas a outro – a popularidade. Por isso conseguiram se eleger para o Congresso figuras como o Luís Miranda, esse que postava lá dos States comparações entre a qualidade de vida dos americanos e a dos brasileiros. O Luís Miranda surfa nessa onda das mídias digitais, que a cada dia crescem mais em importância e influência. Como diz o cientista político Geraldo Tadeu Monteiro, “quem domina essa tecnologia vira referência em opinião”. E eu acrescento: esse negócio de credibilidade nada tem a ver com poder de atração de votos.
Alguém acreditou no Tiririca quando ele pedia voto dizendo: “Vote no Tiririca, porque pior do que está não fica”? Claro que não, né? Vota nele porque é popular, não porque acredita nele.
Então, lascou!
– Eu só sei é que a política está mudando, PJ. E mudando depressa.
E pra pior, Tião. Diante do discurso fácil e descompromissado que qualquer um pode fazer nas redes, o surgimento dos Enéas e dos Tiriricas ficou muito mais fácil. Porque existe um problema ainda maior: as pessoas não estão apenas despreocupadas com a qualidade dos conteúdos que recebem: elas estão é se lixando pra ir atrás de fontes confiáveis de informação, daí o declínio das mídias tradicionais.
– PQP! Então, lascou!
Do Oiapoque ao Piauí, Tião. A lasqueira foi federal. Se antes a eleição de figuras exóticas ou de um ou outro aventureiro era exceção, agora virou regra. E quem não se enquadrar, vai se f…
– Shhhh!
Vai se ferrar, Tião! Eu ia dizer se ferrar, se ferrar! Mas essa tua cabeça suja já pensou outra coisa, não foi? O que fazer? Cair nas redes e mandar ver. E, aos veículos tradicionais, cabe se associar às novas mídias e tocar o barco. Remar contra a corrente é que não funciona mais.
Peraí, criatura, não vai embora ainda, escuta só mais uma coisinha: sabe aquelas associações, sindicatos, partidos e tal, onde se fazia política? Pois fazem parte de um sistema velho, superado. Por isso a direita está na crista dessa onda. Olha esse Kataguiri, esse Alexandre Frota, esse povo aí, tudo da direita. Eles souberam usar as novas mídias e estão se dando bem. Enquanto isso o pessoal da esquerda até hoje ainda anda subindo em caixote, de megafone na mão, em porta de fábrica…
– Então, f…
Cala a boca, Tião! Tem gente de família lendo. Vira essa boca suja pra lá.
Do mesmo autor:
O jornalistas abandonaram o jornalismo para efetuarem panfletagem político-ideológico e acabaram por jogar no lixo sua reputação, e como consequência disso as pessoas estão preferindo acreditar mais no que recebem de seus familiares e conhecidos via WhatsApp, Twitter ou Facebook do que nas informações vindas desses pseudojornalistas corruptos dessa mídia arcaica.
Amigo, concordo que os interesses financeiros justificam em boa parte os ataques sistemáticos que Bolsonaro recebeu, afinal muitos veículos de mídia não param em pé e o capitão prometeu cortar a odiosa publicidade governamental da mídia, ou ao menos reduzi-la sistematicamente para que estes recursos sejam empregados em áreas muito mais relevantes para a sociedade, como saúde e educação. A imprensa que compita no mercado e apresente um produto decente para sobreviver sem parasitar o Estado.
No entanto, isso se deu também por tara ideológica. As faculdades de humanas em geral, e a de jornalismo não é exceção, são fábricas de idiotas úteis esquerdistas. Eu sobrevivi a uma faculdade dessas em universidade federal, mas porque sempre fui dado ao estudo autodidata e não me deixei levar pela doutrinação que os professores tentaram fazer.
Se você conversar com um jornalista da velha guarda, verá que ele tem noção de qual a sua função: embora a neutralidade seja impossível, o ofício é o de informar com a maior isenção possível, e deixar o julgamento dos fatos para o leitor. Hoje os estudantes saem do curso de jornalismo ignorando esta lição básica. Se acham iluminados, com a missão de ensinar seus leitores a como pensar. Em suma, foram idiotizados e exercem a militância política ao invés do jornalismo. Depois não entendem porque estão cada vez mais desacreditados.
Claro que as mídias sociais são o novo meio de comunicação, mas explorá-las não significa vitória certa. O autor é esquerdista e começa a esboçar uma autocrítica, mas ainda insuficiente. A esquerda também estava presente nas redes sociais. Por que sua mensagem não repercutiu tanto? Ora, a internet é só um meio. Essencial continua a ser o conteúdo e é nisso que a direita venceu. O discurso direitista atendeu melhor aos anseios imediatos da população. De nada adiantaria o Bolsonaro fazer cinco transmissões ao vivo por dia se as pessoas não estivessem dispostas a ouvi-lo, não concordassem com sua mensagem.
No mais, essa ideia de que a mídia tradicional é um repositório de credibilidade está superada. Entre em qualquer sessão de comentários e verá como as pessoas perderam (justificadamente) a confiança na mídia. Essas eleições apenas agravaram isso porque não se informou, mas se fez campanha escancarada para um dos candidatos, enquanto os defeitos do outro eram omitidos. Como confiar, por exemplo, na Folha que, em campanha aberta por um candidato, lançou um factoide contra o adversário e fez um carnaval em cima disso?