São fortes as evidências que reforçam a relação entre a liberdade econômica e a qualidade de vida da população. Em países livres as pessoas ganham em média oito vezes mais (os pobres ganham dez!), existe mais emprego, a população é mais feliz (medida pelo IDH) e vive em média 20 anos a mais. Evidentemente os benefícios atribuídos à abertura comercial atraem as pessoas, desde para discussão sobre os caminhos para se chegar lá até a efetiva fuga para outros países onde possam viver melhor.
[bs-quote quote=”“Eu só queria saber que caminho tomar”, questionou Alice.
“Isso depende do lugar aonde quer ir”, diz o Gato tranquilamente.
– Eu não sei para onde quero ir!
– Se você não sabe para onde ir, qualquer caminho serve.” style=”default” align=”left” author_job=”(Trecho de Lewis Carroll em Alice no País das Maravilhas).”][/bs-quote]
Sobre o assunto, Hong Kong e Singapura estão sempre entre os exemplos, pois são os países mais abertos para o comércio, segundo o Fórum Econômico Mundial. Ambos estão na dianteira do Global Enabling Trade Report. O estudo demonstra que a abertura comercial é parte da estratégia de desenvolvimento econômico dos dois países, uma receita com diferentes ingredientes, técnica de implementação e um tanto de experimentação.
Hong Kong na década de 50 era paupérrima, uma favela a céu aberto. Entre 1960 e 2012 o PIB real per capita cresceu 900% e tornou Hong Kong uma das economias mais pujantes do planeta. O nome por trás do milagre econômico é sir John James Cowperthwaite, que implementou a abertura comercial. A receita? Corrupção mínima, Judiciário independente, segurança jurídica, transporte e telecomunicações desenvolvidos, ausência de déficit no orçamento público e simplificação e baixa carga tributária: hoje em 13,9% do PIB. As pessoas não fogem de Hong Kong. Elas correm para Hong Kong.
Singapura também era pobre em 1965. Tornou-se o segundo país mais livre do mundo, com uma moeda forte e estável, sem interferência política, negou empréstimos estrangeiros, aboliu a pobreza, promoveu a criação de empresas, mínima regulação, segurança pública, burocracia perto de zero, um governo pequeno e transparente e uma carga tributária de 13,6% do PIB. Hoje 11% de sua população é composta por milionários.
Mas para isso é preciso antes preparar o terreno. A experiência desses e de outros países mostra que a abertura comercial fez parte de uma estratégia planejada, que mitigou ou excluiu gargalos que emperravam o crescimento econômico. Foi preciso preparar a terra antes de semear.
O Brasil ainda não tem os ingredientes básicos para essa receita. O estudo Competitividade Brasil 2017-2018 analisa e compara o país segundo fatores de competitividade: disponibilidade e custo de mão de obra, disponibilidade e custo de capital, infraestrutura e logística, carga tributária, ambiente macroeconômico, competição e escala do mercado doméstico, ambiente de negócios, educação e tecnologia e inovação. Os dados são claros ao nos dizer que ainda padecemos com infraestrutura deficiente, alta carga e complexidade tributárias, burocracia e gasto público.
O tema ganhou projeção na Câmara dos Deputados. Uma frente parlamentar foi recentemente criada e levantou a discussão. Em audiência pública realizada, a Academia defendeu que o Brasil viva a sua abertura comercial. Especialistas ligados aos setores produtivos da economia, contudo, alertaram para os riscos de uma abertura ideológica, sem critérios, não planejada. Riscos altos e que o país não tem condições de assumir: fuga de investimentos, desemprego, inflação e pobreza. Uma Abertura dos Portos em sua mais nova versão.
Existe tramitando uma série de projetos que tratam de temas específicos de abertura comercial, como investimento estrangeiro, barreiras e acordos comerciais. Todas essas proposições podem ser a qualquer momento tiradas da manga para tentar viabilizar políticas não coordenadas.
O tempo, aliás, não poderia ser mais inoportuno: em meio às negociações para um acordo de abertura comercial entre Mercosul e União Europeia. Os governos do Brasil e da Argentina têm interesse no acordo ainda para este ano. As ofertas já foram ampliadas nos setores automotivo e de serviços e na indicação de origem, mas a expectativa de uma contraproposta para o setor agrícola por parte dos europeus foi frustrada. Discutir abertura comercial irrestrita, neste momento, seria perdermos tudo que dispomos e ficarmos sem ter o que negociar. Daremos tudo e não receberemos nada.
Abertura comercial é um processo, não um ato. Tem consequências diretas na vida da população e não pode ser feita de maneira açodada. Deve-se ter muito bem definidos o objetivo e os desafios que precisamos superar para darmos cada passo nesse caminho de maneira pensada. A discussão e a tomada de decisão devem considerar a análise dos setores e de especialistas, e não se pautar por ideologias.
Se não tivermos uma definição bem clara do que queremos, de onde queremos chegar, seremos incapazes de criar uma política eficaz. Daí qualquer caminho serve.
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