ISTOÉ
A boa vida de Demóstenes
Sem mandato e prestígio, o ex-senador Demóstenes continua a desfrutar dos luxos da época de parlamentar. Comemorou o Réveillon num dos melhores restaurantes de Paris, frequenta uma badalada academia, faz tratamentos em clínicas estéticas e degusta vinhos.
Apanhado nos grampos que ajudaram a condenar o contraventor Carlinhos Cachoeira a 39 anos e 8 meses de prisão, o ex-senador Demóstenes Torres perdeu o mandato de senador em junho de 2012 e foi afastado do Ministério Público de Goiás. Seis meses depois, porém, embora desprovido de cargo e prestígio, o ex-parlamentar do DEM não perdeu a pose nem a boa vida sustentada por luxos e prazeres dos tempos de parlamentar, quando foi considerado no Congresso uma espécie de paladino da ética, antes de ser flagrado em tramoias com o bicheiro. A fama de mocinho acabou, mas sua rotina continua à base do bom e do melhor.
Na quarta-feira 23, em seu primeiro aniversário depois da queda, assistiu-se a uma pequena romaria na entrada do condomínio Parque Imperial, em Goiânia, onde Demóstenes reside num apartamento avaliado em R$ 2 milhões. Vestido de paletó e gravata, Demóstenes saiu de casa pouco depois das 9 da manhã. Ocupado, conforme um assessor, com os preparativos de um jantar de aniversário, assumiu o volante de uma Vera Cruz Hyundai e passou duas horas fora de casa. No fim da tarde, saiu mais uma vez, dirigindo-se a uma clínica estética. No carro com o vidro semiaberto, dava tchauzinho para quem o reconhecia. Em sua vida sem mandato, Demóstenes tem aproveitado para fazer testes frequentes de popularidade.
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Semanas antes de comemorar seu aniversário, o ex-senador saiu-se bem quando enfrentou 20 minutos de fila no Vapt-Vupt – nome do Poupatempo em Goiânia – para trocar o passaporte diplomático, a que tinha direito como senador, pelo comum. Foi reconhecido por cidadãos anônimos, que tiraram fotos com celular. A maioria o aplaudia, mas a funcionária Raquel Silva enquadrou a equipe de atendentes que ameaçava entrar na algazarra: “Coloquei o Demóstenes numa fila. Quando o pessoal foi tirar foto, igual a uma celebridade, eu disse: ‘Menos, gente, menos.’” Dias depois da cassação ele foi à rodoviária para renovar a carteira de motorista. Recebeu abraços e cumprimentos. O mesmo aconteceu em suas idas a supermercados.
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A força do PMDB
Desde a Constituinte, o PMDB nunca acumulou tanto poder. Com isso, reforça o papel de principal aliado do governo e pode ganhar musculatura para voos próprios em 2018
Com a eleição praticamente certa de Renan Calheiros para o comando do Senado e de Henrique Eduardo Alves para a Câmara, o PMDB retoma o controle das duas Casas legislativas como não fazia desde a Assembleia Constituinte há mais de 25 anos. Terá ainda o domínio sobre os três postos da linha sucessória, uma vez que já ocupa a vice-Presidência da República com Michel Temer. O efeito prático disso é uma capacidade incomparável de barganha com o Executivo. Mas o que alimenta os sonhos mais fisiológicos dos peemedebistas traz embutida uma contradição. As conquistas ou derrotas políticas dos próximos dois anos poderão ser diretamente creditadas, ou debitadas, na conta do partido. Uma responsabilidade quase inconveniente para uma legenda que dispensou o protagonismo de seus fundadores para encarnar o papel de coadjuvante e aliado principal do governo.
O PMDB de hoje é uma espécie de avesso do MDB da Anistia, das Diretas Já e da Constituinte. Não é mais um partido de grandes nomes, como Ulisses Guimarães, Tancredo Neves e Franco Montoro, mas de cargos e cifras. Uma agremiação política que se revela poderosa pela capacidade de compor e tem se tornado uma máquina de eleger prefeitos e deputados. Nas eleições do ano passado, por exemplo, conquistou 1.024 das 5.568 prefeituras em disputa, ou 18,4% do total. Bem à frente do PSDB com 702 municípios e do PT com 635. A preocupação em encravar sua bandeira nos milhares de distritos políticos do território nacional está na raiz da atual lógica partidária da legenda. Se no velho MDB o poder emanava de cima para baixo, no PMDB ocorre de baixo para cima. Engloba, dessa maneira, interesses dos mais diversos recantos do Brasil.
A ausência de ideologia garante aos peemedebistas liberdade para alianças ao sabor de seus interesses regionais. O tamanho e a capilaridade se traduzem no imprescindível papel de fiador da estabilidade institucional. Foi assim com José Sarney, depois com o tucano Fernando Henrique e até hoje com Lula e Dilma. Foi excluído por Fernando Collor, que rompeu com a legenda e não terminou o mandato. “É um superpartido”, diz o cientista político Antônio Lavareda. O sucesso do PMDB, segundo ele, está na habilidade de colocar a estrutura do partido a serviço tanto de interesses paroquiais de prefeitos, como das articulações nacionais com o Planalto.
Hóspede incômodo
Sem ver o sol há mais de 240 dias, o senador boliviano Roger Pinto transformou uma sala de 20 metros quadrados, localizada no primeiro andar da Embaixada brasileira em La Paz, em escritório e moradia. Vigiado por fuzileiros navais, o cômodo em que vive o parlamentar – um barulhento político do partido Convergência Nacional (CN) – é separado do resto da representação diplomática por uma porta com tranca eletrônica. Ali ele faz suas refeições, dorme, recebe visitas, pratica exercícios em uma bicicleta ergonômica comprada pela embaixada e divide seu tempo entre leituras políticas e bíblicas desde maio de 2012. Há quase oito meses, a Embaixada do Brasil acolheu Roger Pinto como asilado, depois que ele alegou sofrer perseguição política e correr risco de vida. O senador não pode sair da Bolívia porque o governo Morales não lhe concede um salvo-conduto a fim de que embarque para o Brasil. Sua situação é semelhante à do jornalista australiano Julian Assange, fundador do site WikiLeaks, refugiado na Embaixada do Equador em Londres há sete meses.
Líder da oposição no Congresso boliviano, Roger Pinto diz ser alvo de perseguição desde que acusou o presidente Evo Morales de ser complacente com a corrupção e o narcotráfico. “A base financeira de sustentação do governo de Evo Morales é o narcotráfico”, denunciou Roger Pinto, antes do asilo. Sem o salvo-conduto, o parlamentar boliviano fica impedido de pôr os pés nas ruas do seu país. Para solucionar essa querela que completará oito meses na segunda-feira 28, os partidários de Roger Pinto desencadearam nos últimos dias uma campanha internacional de solidariedade ao político. “Encaminhamos um pedido junto à ONU e à OEA para mediar essa crise que a cada dia ganha contornos ainda mais desumanos e complicados”, revela o deputado Adrián Esteban, da Convergência Nacional. “É um absurdo como o governo da Bolívia trata um assunto que envolve os direitos da pessoa em uma queda de braço política”, argumenta Esteban. Em carta enviada por Roger Pinto à presidenta Dilma Rousseff no pedido de refúgio, o parlamentar disse que teria urgência em deixar a Bolívia. “Se o meu pai colocar os pés para fora da embaixada, ele pode ser assassinado. Alguém tem que nos ajudar a resolver esta crise”, desabafa Denise Pinto, filha do senador. Denise é a única familiar do senador que ainda vive em solo boliviano. A mulher do político asilado e as outras duas filhas dele mudaram-se para o Acre, Estado fronteiriço com a Bolívia.
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Distinto público: abrem-se nesta semana as cortinas para o mais bufo dos espetáculos políticos deste ano. A partir da sexta-feira, os parlamentares escolherão os presidentes do Legislativo. O voto deles é livre e secreto. Ao que tudo indica, duas estrelas da política subirão ao palco sob unânime aplauso. Na Câmara, será eleito presidente o deputado Henrique Eduardo Alves, do PMDB do Rio Grande do Norte, que há 42 anos engrandece o Parlamento brasileiro. No Senado, após cinco anos de ensaios forçados na coxia, voltará à presidência da Casa Renan Calheiros, também do PMDB, este por Alagoas. Henrique e Renan – ou Renan e Henrique, conforme pareça melhor à plateia – têm o mesmo estilo de atuação: gestos contidos, expressão ladina e repertório riquíssimo. Nos cofres da Polícia Federal, onde se encontram vários registros do trabalho dos dois, ÉPOCA descobriu uma pequena e inédita obra-prima, estrelada por ambos, mas que ficara esquecida por não tão misteriosas razões. Trechos dela também podem ser encontrados no Superior Tribunal de Justiça. Trata-se da íntegra da Operação Navalha, que, em 2007, revelou ao país a existência de um esquema comandado pelo empreiteiro Zuleido Veras, da construtora Gautama, que pagava propina a políticos e burocratas em troca de contratos com ministérios de Brasília e governos estaduais. Apenas uma minúscula fração da enorme quantidade de provas produzidas pela PF veio a público naquele momento. Na papelada, há evidências fortes de pagamentos de propina para Renan e Henrique. Ou Henrique e Renan.
As provas constituem-se de interceptações telefônicas autorizadas pela Justiça, relatórios de vigilância dos assessores de Renan e Henrique Alves, recibos bancários, anotações em agenda – e até uma contabilidade de caixa dois, preparada pelo tesoureiro de Zuleido. Entre a miríade de episódios de corrupção, conta-se aqui o que envolveu a construção da barragem Duas Bocas/Santa Luzia, no Rio Pratagy, em Alagoas, para ampliar o abastecimento da região metropolitana de Maceió. A busca de Zuleido para liberar dinheiro para a obra mobilizou tanto Renan quanto assessores de Henrique Alves. Era uma obra de R$ 77 milhões que, depois de receber R$ 30 milhões, está parada. Nada mudou. Assim como nada mudou em Brasília, onde os personagens envolvidos nesse desvio continuam em seus cargos. E, agora, subirão a seu derradeiro e consagrador ato final. Ao espetáculo:
I – O homem está cobrando
Para levar a cabo a obra do Pratagy, Zuleido precisava da influência, entre outros, de Renan. Segundo a PF, Zuleido comprara essa influência por meio de Everaldo Ferro, assessor de estrita confiança do senador. Os contatos eram invariavelmente discretos, como manda a boa etiqueta nesse tipo de negócio. Numa das conversas captadas pela PF, ainda em junho de 2006, a secretária de Zuleido lhe informa que é aniversário de Renan. “Mande um telegrama”, diz o empreiteiro. A secretária se mostra cautelosa: “Ah, mas ele não gosta muito, né? De notícia… Eu ia sugerir que o senhor ligasse para o Everaldo e transmitisse e tal”. Zuleido acata a sugestão da secretária e, minutos depois, liga para o assessor de Renan. O que segue é uma conversa de dois amigos. Diz Zuleido: “Disseram que vão resolver neste final de semana, até segunda, aquele negócio, tá?”. “Negócio” seria propina, segundo a PF. Everaldo não se contém: “Você é um irmão, rapaz!”. O empreiteiro encerra o telefonema amistosamente, sem se esquecer de Renan: “Tem de ter calma… Transmita os parabéns ao nosso amigo!”. Nas provas obtidas pela PF, constam registros de pagamentos a Everaldo, que continua despachando em Brasília, no gabinete de Renan.
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Quando foi presidente, o senador Fernando Collor (PTB-AL) celebrizou o estilo bateu-levou. Quer mudar tudo em sua nova campanha ao Planalto – creia, ele sonha com isso. Não se trata de uma obsessão, mas de uma saída estratégica. Se decidir pela reeleição, Collor disputará o cargo com o governador Teotônio Vilela (PSDB). Se optar pelo governo alagoano, concorrerá o atual vice Thomaz Nonô (DEM) e, talvez, com o futuro presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB). A amigos, disse até que aspira ter o marqueteiro Duda Mendonça na sua campanha. Duda, criador do Lulinha Paz e Amor, diz que não foi procurado pelo homem daquilo roxo.
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