Fábio Góis
O senador Roberto Requião (PMDB-PR) parece não estar muito preocupado com a liberdade de imprensa ? ao menos a que pode contrariar seus interesses. Depois de tomar à força o gravador de um repórter em plenário, no início da tarde desta segunda-feira (25), Requião admitiu ter deletado o conteúdo do cartão de memória do aparelho, que continha entrevistas diversas feitas pelo repórter Victor Boyadjian, da Rádio Bandeirantes. Na ocasião, presenciada por diversos jornalistas e assessores, Requião se recusou a responder se abriria mão de sua aposentadoria caso o governo do Paraná adotasse restrições orçamentárias.
Confira: Requião toma gravador de repórter em plenário
A denúncia de violação por parte de Requião não encontrou respaldo no Senado. A Polícia Legislativa do Senado disse que está impedida de formalizar denúncia contra o parlamentar, alegando ser esta uma atribuição da corregedoria da Casa, como define a resolução número 17/93 da Mesa Diretora. O detalhe é que a corregedoria, que teoricamente é responsável por apurar desvios de senadores, está desativada desde outubro.
Depois de ampla repercussão pela imprensa, que acabou por movimentar a segunda-feira (25) esvaziada no Senado, Requião devolveu o cartão de memória, vazio. Preocupado pelos desdobramentos de seu ato, o próprio senador veiculou a íntegra da entrevista (excluindo-se trechos finais da discussão com o repórter) em sua página na internet. No final da gravação, o peemedebista ameaçou o repórter.
?Você já pensou em apanhar, rapaz??, bradou Requião. ?Calma, senador?, respondeu Victor. ?Vou ficar com isso aqui. Não vai mais desligar porra nenhuma?, completou Requião, depois de conversar sobre medidas antiinflacionárias, orçamento e, no estopim do destempero, sobre a aposentadoria vitalícia recuperada na Justiça em abril. A entrevista transcorria de maneira cordial, com Requião expondo seus pensamentos sobre questões econômicas. Em nenhum momento o repórter foi ?engraçadinho?, como o senador publicou em seu microblog, nem o provocou com perguntas sem fundamento ? muito menos Requião dava sinais de que reagiria com violência.
Antes do entrevero, o repórter quis saber se Requião abriria mão da aposentadoria em nome do enxugamento das despesas paranaenses. ?Por que eu abriria mão??, respondeu Requião, já esboçando contrariedade. ?Essa pensão no Paraná existe há 40 anos. Todos os ex-governadores recebem. Recebe a mãe do Beto Richa, que é governador do Paraná; (…). E eu recebo essa pensão porque, durante o governo em que eu chamei de ladrões os que haviam roubado o erário, predado [sic] o patrimônio do estado do Paraná, e como eles não tinham sido condenados, eu passei a ser condenado em multas porque os ladrões ainda não tinham sido condenados em instância final. Estou usando essa pensão para pagar as multas que me foram injustamente impostas?, justificou Requião, para quem o salário de senador é ?um bom salário [R$ 26,7 mil]?, apesar de ?inferior aos dos servidores de carreira do Senado?.
O repórter então insistiu em saber se não seria o caso de abrir mão da pensão vitalícia em nome do equilíbrio das contas públicas. O que se ouve em seguida é um barulho provocado pela retirada, à força, do gravador das mãos do repórter. ?Calma! Não estou mais gravando. Espera aí, deixe-me desligar?, ainda tentou ponderar o jornalista. Em vão. ?Não vai desligar mais porra nenhuma. Vou ficar com isso aqui?, diz o senador, já transtornado. A gravação é interrompida nesse ponto da conversa, mas o repórter diz que muito ainda foi dito ao passo em que o senador se retirava do plenário.
Depois de conceder diversas entrevistas no transcorrer do dia, em inversão de papéis, o jornalista resumiu seu estado de espírito. ?Eu quero paz. Nunca fui numa delegacia. Será a primeira vez?, desabafou Victor à reportagem, antes de se dirigir à polícia, onde registrará queixa contra o senador.
Tarde no Twitter
Depois do episódio, Requião se dedicou a atacar a imprensa por meio do Twitter, enquanto o Senado funcionava normalmente ? a Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional, por exemplo, encerrou há pouco uma audiência pública sobre ameaças religiosas fundamentalistas do Oriente Médio. Graças à dedicação do senador à rede de relacionamentos, ?requiao? chegou a entrar na categoria ?trend topics?, que registra os assuntos mais comentados do Twitter.
?Denunciei dupla militância da presidente da ANTT [Agência Nacional de Transportes Terrestres], silêncio! Deletei a entrevista do repórter agressivo e a ?catigoria? se alvoroça?, escreveu Requião, dando a entender que a imprensa deveria ter noticiado suas ?denúncias? e ignorado o roubo ao material jornalístico.
As provocações e acusações a setoristas do Senado continuaram ? a maioria recebendo repúdio de internautas. ?Alguns twitters, reflexo da má imprensa, bem que mereceriam bofetada. Sou civilizado. Quero apenas aprovar direito de resposta?, diz Requião, em postagem registrada pouco antes das 21h ? registro em que o senador demonstra desconhecimento da legislação e da prática jornalística, uma vez que o ?direito de resposta? a que ele se refere poderia ser concebido no próprio veículo que, eventualmente, veicular suas palavras, colhidas publicamente pelo repórter, que justamente ouvia sua versão dos fatos.
?Não me acusem de censura. Aqui a entrevista que eu não quis que a Band divulgasse. É minha, divulgo eu, na íntegra e sem edição?, diz Requião sobre o material veiculado em sua página na internet ? que, ao contrário do que alega o senador, não registra trechos finais da discussão, quando o repórter acompanhava o senador à saída do plenário para tentar recuperar, em vão, seu equipamento de trabalho.
O Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Distrito Federal avisou que já está preparando um processo por quebra de decoro parlamentar contra Requião. Além disso, o presidente do Comitê de Imprensa do Senado, Fábio Marçal, também prepara uma representação, em nome dos setoristas da Casa, a ser entregue ao presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP) ? que, aliás, classificou Requião como ?cavalheiro? ao responder por que a Corregedoria do Senado ainda desativada e vaga desde outubro, quando morreu Romeu Tuma. Para fundamentar as ações contra o senador, o comitê solicitou à Secretaria de Comunicação imagens de plenário que flagram a agressão de Requião ao jornalista.
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