Ricardo de João Braga *
Trabalho com política, e por isso frequentemente sou abordado por parentes, amigos e curiosos que perguntam sobre o assunto. Acho valiosa cada uma dessas perguntas, e busco dialogar com o interlocutor da melhor forma possível. Nos últimos tempos, contudo, o diálogo naufraga muito rapidamente. As causas disso são o radicalismo e a negação da política.
Diante da pergunta “o que acontecerá em 2018”, saudável questionamento do cidadão que pretende ter um país melhor para viver no futuro, os nomes Lula e Bolsonaro surgem frequentemente. Ambos os polos ensejam nos interlocutores apoios irrestritos ou repulsas viscerais; exatamente o que se necessita para tornar impossível o diálogo. Parece-me que o cidadão passou a raciocinar como se a política brasileira comportasse apenas posições radicais.
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Temo que hoje a cena pública esteja dominada por dois grupos muito atuantes, os radicais de direita e os de esquerda, o que se dá por uma série de razões. O radical tem plenas convicções, é energético, quer sempre agir. Ele divide tudo em verdades e mentiras absolutas, em portadores da verdade sacrossantos e mentirosos a serem destruídos – o radical acredita em salvadores da pátria.
Molda qualquer assunto e questão às suas crenças, tem uma visão restrita do mundo, em geral extrapola para o convívio social uma torrente de desconfortos existenciais que deveriam ser resolvidas na economia interna de suas reflexões. Esse ser que nunca duvida de si próprio abunda nas redes sociais, onde a violência é feita sem custos. São egos incontroláveis. Avançam, destroem, esterilizam a terra e partem para novas conquistas. A imprensa, por sua vez, adora o radical. Ele é noticioso, noticiável, sempre fazendo algo que choca. Vê-se que o problema não é em princípio a direita ou a esquerda, mas o radicalismo, que iguala atitudes e comportamentos de ambos os grupos em prejuízo do estado democrático de direito, da cidadania e, mais que tudo, da civilidade.
Espertamente, o sistema político passou a procurar uma alternativa aos polos radicais, e tem investido na franksteniana figura do “político não político”, como se criatura dessa natureza fosse possível existir. O cidadão, premido entre radicalismos, imagina que pode fugir ao “mundo sujo da política” optando por “alguém de fora”. Infelizmente, isso é uma inocência perigosa, pois a política é parte não suprimível da vida em sociedade. O perigo está em que, ao acreditar que se suprimiu a política, deixa-se o campo aberto para “qualquer política”. A questão mais útil seria “qual política” faz bem a nosso país.
A política democrática moderna foi construída para regular conflitos, para gerar, dentro do possível, tranquilidade e paz social. A política democrática não nega o conflito, não quer suprimi-lo, não quer varrê-lo para debaixo do tapete. As interações do mundo democrático assumem que há divergência de opiniões, posições e interesses, mas que antagonismos devem coexistir e antagonistas aceitarem-se mutuamente, permitindo a existência e a liberdade das pessoas e suas posições. O Estado Democrático de Direito é o convívio dos diferentes, não dos iguais.
O primeiro corolário do Estado Democrático de Direito é que todas as pessoas detêm direitos básicos que devem ser resguardados, mesmo que a grande maioria da população siga um adorador do fogo que pretenda destruir grupos “inferiores”. O urro da massa não pode destruir a igualdade, a liberdade de expressão, a de reunião, e os direitos relativos à dignidade humana. O segundo é que as instituições devem ser respeitadas, pois são as guardiãs dos princípios do Estado Democrático de Direito.
O Brasil é subdesenvolvido em vários campos, vale até dizer que um dos menos graves é o econômico. O subdesenvolvimento político lega-nos um sistema incapaz de criar alternativas moderadas, que respeitem o Estado Democrático de Direito e que assumam a política como uma tarefa nobre, responsável por criar apoios e diálogos entre governantes e cidadãos de todas as crenças e raças. Apenas para lembrar, um parêntesis relevante: a última eleição holandesa mostrou que os moderados saíram de casa, votaram, e deram um recado aos radicais. Essa maioria silenciosa precisa se mover também no Brasil.
Uma eleição tem por função dividir o poder político, mas também construir legitimidade para os governantes e o sistema político. Se nosso horizonte for preenchido por radicais que entendem a luta política como de morte, de tudo ou nada, ou então por “políticos-não políticos”, o que é uma farsa, temo que nosso país estará retrocedendo. Mais importante do que definir a bandeira vencedora, é legitimar o sistema de representação e formação de governos, o que exige moderação. Os não radicais estão saturados do debate amigo-inimigo, e também não devem ser enganados pelos políticos-não políticos.
Em tempos de beligerância, enfrentamento e certezas vibrantes, palavras moderadas recebem muito pouca luz e atenção. Não obstante, carecemos precisamente delas. Alguém deve dizê-las, e é preciso que saibamos escutá-las.
* Ricardo de João Braga é economista, graduado na Unesp, e cientista político, com mestrado pela Universidade de Brasília (UnB) e doutorado pelo Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Iesp/Uerj).
Trabalha com politica?? Você é mais um vagabundo pilantra sem vergonha a roubar o dinheiro do povo.
Hum hum…as esquerdas fizeram exatamente isso por quase 40 anos! Esses muitos isentões nem eram nascidos. Onde fomos parar? Maior crise da nossa historia! Quando lula e os quadrlheiros roubavam bilhões onde estavam suas palavras de reprovação? Ah ninguém sabia…ACABOU! Vamos destruir os vermelhos e as oligarquias.
É um alívio ver alguém com alta formação acadêmica defendendo uma posição moderada e o diálogo em público, começava a achar que só haviam radicais, especialmente de esquerda, entre os acadêmicos brasileiros. De fato é disso que precisamos. Estamos diante de uma oportunidade ímpar de reestruturar a distribuição de poder no Brasil, retirando uma longa dinastia política que se perpetua criando laços íntimos e corruptos com os grandes poderes econômicos do país. E é ignorância achar que isto é criação do Lula ou do FHC, isto vem desde que o Brasil é Brasil. Agora, diante desta oportunidade ímpar, até mesmo em comparação com outros países desenvolvidos no mundo, o que vamos fazer? Vamos ficar criando ódio e radicalismo, enquanto esta mesma classe de políticos e “empresários” realizam suas manobras para escapar das punições e manterem-se no poder (mesmo que fora de cena)? E depois, assumindo que haja sucesso na renovação política, o que queremos do nosso novo país? Quem assumirá o vácuo deixado por estes que dominaram o país por tantos anos? É preciso se unir, dialogar e criar um caminho sólido para o nossos futuro, sem isso, toda essa oportunidade será desperdiçada. Mas então pergunto, caro autor, como ampliar esta discussão?
Olá, Ricardo,
Desculpe o atraso na resposta. Fico feliz em saber que gostou das ideias. Realmente falar em moderação é algo que não atrai, vê-se inclusive pelos outros comentários ao texto.
A solução é participarmos mais das discussões de assuntos públicos de forma qualificada. Confesso que hoje não me animo com nenhum partido ou movimento. Creio mais na sociedade ativa, vigiando os políticos e apresentando suas posições.
Uma forma que descobri que casa melhor com minha natureza e crenças é essa, escrever.
São pequenas sementes que podem, com sorte, frutificar aqui e ali.
Abraços,
Ricardo
Olá, obrigado pela resposta!
Me atrai muito a ideia de uma sociedade ativa, pressionando as decisões políticas sem necessariamente ter que estar envolvida com partidos ou a carreira política diretamente. Também penso em escrever, expondo minha visão de leigo, que tem o estudo de política e economia como hobbie. O maior valor que vejo nisso é poder debater e validar ideias com outros pares, mas até então não encontrei terreno fértil para um debate prático, com diálogo, focado em resolver os problemas sem a contaminação (ou com mínima contaminação) de idealismos e radicalismos. Conhece algum local onde pode-se realizar este tipo de debate?
Ricardo, sobre essas suas indagações, peço por gentileza que me envie um e-mail (ricaflav2010@gmail.com) e aí podemos avançar de forma mais apropriada nas discussões.
Abraços,
Ricardo
Um texto enorme que não diz nada.
“O Estado Democrático de Direito é o convívio dos diferentes”
O Socialismo quer o convívio dos diferentes: deles, no luxo da riqueza, e os demais servindo-lhes na pobreza…