Thomaz Pires
Coordenador do Movimento Mais Feliz, Mauro Motoryn aguarda o retorno dos trabalhos no Congresso para avançar na tramitação da PEC da Felicidade. A proposta, que estabelece a obtenção dos direitos sociais fundamentais para a busca à felicidade, corre nas duas casas do Congresso. Parada em função do período eleitoral, a iniciativa terá o desafio de sensibilizar os novos congressistas, em janeiro de 2011, e percorrer as comissões até chegar à votação em plenário.
Em entrevista ao Congresso em Foco, Mauro diz estar otimista com a atenção que será dada pelo novo Congresso. “O discurso dos presidenciáveis deixa isso claro”, argumenta o coordenador. Segundo ele, as preocupações com as políticas públicas apresentadas pelos candidatos associam-se à essência da PEC, e, portanto, já estão pautadas no debate dentro e fora do Congresso.
Na entrevista, Mauro também destaca a tendência mundial. Segundo ele, o Brasil está entrando num debate já em curso nas sociedades avanças: a atenção voltada ao cidadão. Em outras palavras, o coordenador do + Feliz explica que a intenção não é garantir na Constituição o direito à felicidade – um equívoco que estão cometendo os que avaliam a proposta de forma mais apressada. O que a proposta pretende é reforçar ainda mais a garantia das políticas sociais básicas, previstas na Constituição, que passariam a ser consideradas como essenciais para a conquista da felicidade.
Cada vez mais países e instituições têm adotado índices que levam em conta o bem-estar social (ou a felicidade) para aferir o grau de desenvolvimento dos países. A PEC da Felicidade insere-se nessa discussão absolutamente moderna. Na última semana, o Congresso em Foco mostrou em reportagem que mesmo o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), passou a adotar um Índice de Valores Humanos (IHV) para medir a satisfação das pessoas com relação a saúde, educação e trabalho. Numa escala de 0 a 1, o Brasil apresenta um IVH de 0,59.
Sobre a falta de entendimento e eventuais críticas disparadas, inclusive por uma minoria de parlamentares, Mauro Motoryn afirma não acreditar que ainda haja pessoas dispostas a se oporem ao assunto, que segundo ele é de fundamental importância para o avanço do país para o crescimento social. “A felicidade mexe com tudo. Desde a economia, passando pela política, e chegando no social”, explica.
Confira abaixo a entrevista na íntegra do idealizador da PEC da Felicidade:
Congresso em Foco – Em efeitos práticos, o que muda com a PEC caso ela se torne lei? O que ela trará de mudanças práticas ao cidadão?
Mauro Motoryn – A aprovação da PEC nos levará ao resgate dos valores essenciais. Faz 22 anos que foi promulgada a Constituição federal e até hoje nós continuamos, apesar dos progressos, com o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) abaixo de países muito menos desenvolvidos que a gente. Então, o primeiro objetivo é o resgate dos valores já previstos no artigo sexto da Constituição, que trata dos direitos sociais. A partir do momento que a gente conseguir dar um sentido para esses direitos e fazer o Estado mais presente, a sociedade poderá conquistar os valores sociais dos seus governantes.
É possível dizer que os candidatos estão atentos aos problemas de políticas públicas que levam à felicidade?
Com toda a certeza! Todos os candidatos colocam uma ênfase absolutamente grande na ideia de felicidade. A candidata Dilma, por exemplo, encerrou suas colocações no debate do UOL dizendo que o Brasil está mais feliz. E, se está mais feliz, eu acredito que a candidata, caso eleita, vá colocar a felicidade como um norteador de políticas públicas. Assim como eu vi o candidato Serra, numa mensagem em letreiro, afirmar que o Brasil pode ser mais feliz. Se eleito for, ele poderá estabelecer a felicidade como parametrização e ponto importante para o estabelecimento de políticas públicas. E a candidata Marina tem dito que a felicidade é o que norteia todas as relações de sustentabilidade. Então, eu acredito que todos os candidatos assumiram a felicidade de forma mais ou menos enfática, e entendendo que ela está associada à função do Estado. Ou seja, o Estado existe para servir ao cidadão.
Esse debate eleitoral traz alguma colaboração para as PECs em andamento no Congresso?
A gente pode tomar como base o discurso feito pelos candidatos nas últimas 48 horas. Todos eles defendendo de forma mais ou menos enfática o direito do cidadão ser mais feliz. E dizendo que, se eleitos, assegurarão o estabelecimento de políticas públicas e que terão como foco o cidadão. Ou seja, eu acredito que possam ter vozes discordantes. Mas vamos escutar os candidatos à presidente, que estão entusiasticamente falando em mais bem-estar. O importante é perceber que o assunto está em debate e soluções estão sendo apresentadas. Portanto, isso já é uma grande colaboração.
Você acha que realmente há uma preocupação com a busca pela felicidade ou é discurso vazio dos candidatos?
Eu acho, na verdade, quando se colocam algumas candidaturas, se coloca na verdade uma carta de intenções para a sociedade brasileira. E se todos os três (presidenciáveis) estão falando que se ganharem querem trabalhar por uma sociedade feliz, eu estou acreditando, portanto, que eles têm noção plena do que é ser uma sociedade mais feliz. Primeiro, é respeitar os direitos essenciais que constam na Constituição. Segundo, o estabelecimento de políticas públicas que permitam essa felicidade.
O Brasil está entrando atrasado nessa discussão?
Esse debate da felicidade é uma tendência mundial. Ontem, eu estava vendo que a London Business School anunciou o lançamento de um aplicativo para IPhone para medir a felicidade do cidadão inglês. E podemos deduzir com isso que se essa preocupação tivesse amadurecido há mais tempo no Brasil, nós teríamos feito nesses últimos 50 anos opções bastante diferentes daquelas que aconteceram. Ou seja, nós poderíamos ter uma sociedade muito mais desenvolvida e feliz.
Em 2011, estaremos com um Congresso renovado. Haverá de fato espaço para o debate da PEC?
Eu acredito que esse novo quadro congressual poderá vir de uma forma mais oxigenada, até porque estará em início da legislatura. E, com isso, perceber com entusiasmo que a felicidade é o norteador de políticas públicas. Eu acho que o trabalho de mobilização que deve ser feito, e na verdade já está sendo feito por mais de 30 entidades, será ampliado até o período pós-eleitoral. Nós temos que fazer um trabalho de convencimento, tanto dos atuais parlamentares, quanto daqueles que virão. Porque eu acredito que essa será a tônica da sociedade não só no Brasil, mas no mundo todo.
Mas seguindo a tendência de renovação do Congresso, os parlamentares sempre chegam preocupados com alianças e outras questões políticas. Como será então?
Olha, eu acho que tem essa dificuldade e você tem razão. Mas, por outro lado, existe uma oxigenação trazida por uma nova legislatura para toda a sociedade. E virá todo mundo com sangue novo e esperançoso de marcar o seu mandato por alguma coisa mais conseqüente em relação à própria sociedade. Ela quer menos interesses pessoais e mais ações estruturantes. E eu acho que a felicidade é uma ação estruturante, e isso será cobrado.
E já é possível pautar o tem da PEC com os futuros congressistas?
Se eu soubesse quem será eleito eu já estaria trabalhando. Mas eleição você só sabe o resultado quando abre a urna. Então, isso vai acontecer só após outubro, quando a gente poderá ter a nova composição. E, aí sim, nós saberemos as ações de convencimento que deveremos adotar. E, se antes parecíamos cavaleiros andantes, hoje somos uma realidade posta. Existem duas emendas tramitando no Congresso, versando sobre o mesmo assunto e com a mesma intensidade. E entidades sociais que estavam distantes antes desse processo se juntaram a nós. Se antes nós éramos milhares, hoje somos milhões de pessoas. Então, acho que vai ser fácil a mobilização com os novos congressistas.
Recentemente, o Programa nas Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) lançou um novo índice para medir o desenvolvimento, o Índice de Valores Humanos. Qual a importância dele para a medição da felicidade?
Olha, o Índice de Valores Humanos (IVH) é muito importante, pois retrata uma condição de momento. E eu acho que essa medição pode nortear algumas áreas que nós não estamos atendendo com a devida atenção. Então, é extremamente interessante a gente atentar para um sistema como esse. Como é importante também, a gente se nortear pelo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH). E a gente não está bem. Essas fontes de medição são importantes para nortear a criação e aplicação de políticas. Ou seja, é mais um ingrediente que faz que se busquem políticas públicas que visem a felicidade do cidadão.
Há uma intenção do movimento Mais Feliz já iniciar outra campanha pelos direitos sociais?
Estamos preparando uma pesquisa de como, em cada área social, as políticas poderiam ser trabalhadas. Nós vamos distribuir essa pesquisa para toda a rede social que trabalha conosco, que são mais de 300 entidades, para que a gente possa sentir lá da ponta como essas pessoas gostariam que os governantes e congressistas pudessem vir a trabalhar as políticas públicas. E esse resultado poderá inclusive embasar o trabalho dos congressistas.
E, seguindo essa preocupação com os direitos sociais, poderia dizer que há algo prioritário?
O estabelecimento de políticas públicas é importante no seu conjunto. Agora, a prioridade é uma decisão do governante e dos reclames da sociedade. Esse é um trabalho que estamos fazendo com um instituto de pesquisa e com as redes sociais. Eu espero poder divulgar isso dentro de uns 15 a 20 dias para que os candidatos possam se pronunciar. Porque uma coisa é o pronunciamento que eles fazem “eu quero uma sociedade mais feliz”. Mas vamos fornecer os subsídios.
A PEC da Felicidade, assim como várias outras, poderá ficar engavetada na espera de uma longa fila. Isso é um motivo de preocupação?
É. É um motivo de preocupação sim. Encostar a felicidade num canto e jogar pela janela uma possibilidade de mudança. Agora, o fato é o seguinte: existe um movimento mundial trabalhando pela felicidade. Canadá, França, Estados Unidos, Alemanha, Holanda, Bélgica, Países Nórdicos, Coréia do Sul . Nós vamos perder essa história? Vamos correr atrás da felicidade? Não podemos ser uma grande potencia social? Ou podemos, se quisermos, embarcar nesse avanço. O Brasil pode fazer história.
Alguns parlamentares receberam a proposta com entraves e até ironias. O que você acha disso?
Olha, se é motivo de chacota uma PEC que venha a tratar de uma forma estruturante à felicidade, também seria motivo de chacota grandes pensadores mundiais que tratam do assunto. E nós temos a reunião dos 20, agora em 2012, e estamos nos preparando para isso. Ou seja, teremos uma presença cada vez mais atuante nesse assunto. A felicidade não é apenas uma emenda constitucional. A felicidade é algo que está sendo estudado com seriedade em todos os países do mundo. Felicidade é coisa séria. Por isso que ela pega. E por isso que às vezes pessoas que não querem entrar mais profundamente não percebem que isso é um momento histórico. Temos que perder o complexo de vira-lata e discutir a felicidade sem achar que é um puro e simples factóide. Não é um factóide. É um fator que mexe na economia, política e vida do cidadão.
E como você recebe as críticas que vem sendo apresentadas? Há quem diga que a proposta é inócua e subjetiva.
Olha, entre os noticiários fazemos uma análise detalhada do fatores positivos e negativos que foram ditos. E estamos com um saldo positivo de 68%. As notas positivas suplantam em muito as notas negativas. As pessoas podem inicialmente considerar que felicidade não é função do Estado. Mas, quando você explica que o que se pretende é elaborar uma situação que estimule a criação de políticas públicas que melhorem a qualidade de vida, as pessoas mudam. Ou seja, esse espaço que você está me dando para poder falar sobre a felicidade me ajuda a passar com clareza aquilo que defendemos.
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