Rabino Samy Pinto *
Um forte e acalorado debate envolvendo o projeto Escola Sem Partido vem ganhando destaque no meio educacional brasileiro há um bom tempo. Apoiadores e críticos estão apresentando seus pontos, sobre o polêmico assunto, em diversas discussões que, pouco a pouco, perderam seu foco. E se perdeu devido a forma que a questão é tratada atualmente, que considera toda a problematização com uma visão política, e não científica, como deveria ser. Então, a conversa se transforma em um impasse, em que dois polos defendem suas posições. Mas qual seria esse o cerne da questão, que é exatamente o que importa para desenvolver uma discussão saudável?
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O primeiro passo é entender sobre o que se trata o projeto Escola Sem Partido, firmado na figura do advogado Miguel Nagib. A proposta defende uma educação neutra, sem a interferência da posição política do professor, da instituição e muito menos do governo. Essa linha de pensamento já gera um espanto, pois não existe uma escola sem partido, a proposta e o projeto são utópicos. Ao entrar em sala de aula, o docente carrega consigo uma carga de conteúdo que, forçosamente, levará o juízo de valor do educador e sua forma de ver o mundo, podendo ocorrer um exagero por parte daquele que está lecionando, mas que é inevitável deixar do lado de fora da escola. Existe uma politização, ainda mais quando um grupo de pessoas se reúne. E esse fator deve ser levado em consideração no debate em questão.
O histórico da educação brasileira levou a reação que estamos vendo nos últimos anos, em que uma parte da camada social brasileira não quer que a visão de mundo da esquerda seja apresentada aos seus filhos, e deseja que eles aprendam a partir de uma perspectiva liberal. E este é um assunto que não entra nas conversas sobre a Escola Sem Partido. Este é um ponto chave para se tratar. É tarefa do governo fazer isso, ou não? Qual o papel da escola no século XXI? Somente ensinar as habilidades e competências de escrita, oralidade, matemática, ou também cabe à escola trazer esses debates sobre política, sociologia, filosofia e religião?
Essas questões demandam um debate, um grupo de estudo, mais afinado, que leve em consideração a realidade das salas de aula, que reproduzem a própria formação do professor. Apenas colocar cartazes com os deveres do profissional é preocupante, e acaba por trazer uma imagem de policiamento e desconfiança sobre os professores, causando um ambiente de desrespeito e de indisciplina em sala de aula. O que acentua a importância de uma visão cientifica, e não só política, na discussão que aborda a educação brasileira.
O que não se pode dizer é que a escola é neutra, quando na verdade ela não é. Porque os professores têm, sim, um posicionamento, possuem uma opinião política e social. A missão do professor ela tem que estar clara na relação com seu coordenador, seu diretor, e na própria missão da escola.
Cabe ao governo dar autonomia para as escolas se posicionarem de acordo com o seu nicho comunitário ou sua ideologia. Seria uma ideia saudável para todos. Deixando claro, para os pais, responsáveis e alunos, qual a linha de pensamento da escola, seja liberal, direita, esquerda, cristã, e assim possibilitar que se crie uma equipe que tenha harmonia com a devida visão. O Brasil precisa ficar mais maduro para esse debate. Respeitando as outras opiniões e buscando uma solução com bases cientificas, e não apenas pelos interesses políticos dos envolvidos.
* Formado em Ciências Econômicas, é especialista em Educação em Israel (Universidade Bar-llan). No Brasil, concluiu mestrado e doutorado em Letras e Filosofia pela Universidade de São Paulo (USP). É o responsável pela sinagoga Ohel Yaacov (ou da Abolição), no bairro dos Jardins (SP).
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