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Titular da CPI que apura as relações políticas do contraventor, preso desde março, o pedetista sugere que Cachoeira receba um benefício que vá além da chamada “delação premiada”, instrumento que prevê a redução da pena do acusado em troca de revelações sobre o processo.
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“Se ele souber mais do que nós sabemos, poderíamos encontrar uma fórmula por meio da qual ele se explicaria sobre o jogo para a polícia. Na parte das relações políticas, ele poderia receber uma espécie de anistia. Não é difícil construir, pelo bem que ele poderá prestar ao Brasil”, sugere.
PublicidadeCom a experiência de quem participou das CPIs do PC e dos Anões do Orçamento, duas das que tiveram maior repercussão na história do país, Miro Teixeira rebate as críticas de que a CPI do Cachoeira não tem avançado em relação às investigações da Polícia Federal e do Ministério Público. Para ele, a comissão já produziu resultados: abriu caminho para a cassação de Demóstenes e impediu a venda da Delta Construções para o Grupo JBS.
E tem tudo para revelar “fatos surpreendentes”. “Ela já chegou a resultados. E chegará a vários lugares. Não vamos imaginar que acabaremos com a criminalidade no ambiente público. Temos de revelar que a impunidade ficou mais difícil”, afirma. Para ele, esse é o maior legado que a CPI pode deixar.
Leia a entrevista concedida pelo deputado:
Congresso em Foco – Há uma percepção generalizada de que a CPI do Cachoeira não está conseguindo avançar. Na sua avaliação, essa percepção corresponde à realidade?
Miro Teixeira – A CPI já produziu resultados. Um deles, por si só, já seria útil para o país. Mas, com razão, nós queremos mais sempre. A cassação do Demóstenes ganhou corpo com a revelação de documentos e conversas em poder da CPI. No início, ele fez um discurso com mais de 40 apartes a favor. Foi a CPI que revelou o nível de intimidade dele com a organização. A Delta esteve vendida para o grupo JBS, possivelmente com financiamento do BNDES. A CPI impediu esse negócio, trazendo grande economia para o povo brasileiro. A revelação dessa malha de espionagem é maior do que se imagina. Chegamos à conclusão de que Cachoeira grampeia inclusive o pessoal dele. Ele consegue informações que deixam as pessoas nas mãos dele. Tenho razões sólidas para imaginar que a CPI trará ainda fatos surpreendentes.
A CPI tem prazo delimitado e seu objeto de apuração tem amplitude enorme. Não há risco de a CPI terminar sem chegar a lugar nenhum?
Ela já chegou a resultados. E chegará a vários lugares. Não vamos imaginar que acabaremos com a criminalidade no ambiente público. Temos de revelar que a impunidade ficou mais difícil. Que não existe autoridade absolutamente imune, acima da lei. Tenho a impressão de que demonstraremos isso. Não pode haver perseguição a inocentes, por lutas político-partidárias, assim como não pode haver proteção a culpados.
Mas a disputa política, polarizada entre o PT e o PSDB, não pode contaminar o resultado da CPI?
Toda CPI tem isso. No final, tem uma coisa que determina a CPI, que é o fato. Hoje você tem a opinião pública. Não acredito que uma pessoa com responsabilidade na prática saia impune. Nem que uma pessoa inocente receba uma punição. Isso é uma coisa que a sociedade brasileira exige.
Como o senhor vê a CPI do Cachoeira em relação às outras duas comissões parlamentares de inquérito das quais participou, a do Collor e a do Orçamento. Quais são as principais diferenças entre elas?
A CPI do Collor foi uma guerra, porque o próprio Collor tem temperamento aguerrido. As pessoas à volta dele também eram muito agressivas. Foi aí que ganhou mais corpo a expressão tropa de choque. A CPI dos Anões foi a mais dolorosa, porque verdadeiros ícones da Casa, como Ibsen Pinheiro, viraram réus. Esta é uma CPI desafiadora pelo caráter técnico da prova. Esta CPI não depende de nenhum depoimento. A CPI do Collor dependeu do depoimento do Pedro Collor. A CPI dos Anões, do depoimento do José Carlos Alves dos Santos. Surgiram o Eriberto França [motorista] e a Sandra Fernandes de Oliveira, que desfez a Operação Uruguai. Nesta CPI, não haverá nenhuma ex-mulher ou motorista. É a prova técnica. Neste recesso, temos de nos dedicar ao exame da prova técnica.
O recesso não esfria a CPI?
Pelo contrário. Agosto fará jus ao nome na CPI. Há depoimentos como o do Luiz Antonio Pagot [ex-diretor do Departamento Nacional de Infraestrutura] e do Fernando Cavendish [presidente licenciado da Delta] que, pela simples presença, não importa o que digam, terá repercussão enorme. Há outras pessoas dizendo que querem falar. Isso pra mim será surpreendente. Não acredito em depoimento, que alguém assuma a responsabilidade por um ato hoje em dia, abrindo uma maletinha 007, tirando dois chicotes e começando a se açoitar, dizendo “eu pecador, confesso”. É o cruzamento de dados, a identificação da empresa fantasma, que vai formar a convicção dos membros da CPI. Esses são os fatos. Tudo será comandado pelos fatos. É preciso trabalhar a prova técnica.
Dizem que, ao contrário das CPIs do PC e do Orçamento, a atual comissão não pediu ainda a ajuda de técnicos da Polícia Federal e do Ministério Público… Por quê?
Tem muita gente da PF aqui. É que, naquela época, havia a possibilidade de fazer busca e apreensão. Agora não pode mais. A CPI agora não determina escuta telefônica, não faz busca e apreensão, não prende. É bom que seja assim. É uma comissão parlamentar. As instituições vão se aperfeiçoando. Nós temos, em paralelo, a 11ª Vara Federal, em Goiânia, trabalhando e em estágio muito adiantado. Você tem aqui a Operação Saint Michel, no DF. Está começando a haver uma relação harmoniosa de aparelhos de Estado. A PF está aqui dentro. Há sigilos que a CPI quebrou que nós poderemos transferir depois para a Polícia Federal. Poderá haver prova emprestada. Mandaremos ao Ministério Público. O aparelho de Estado está conseguindo trabalhar com maior harmonia.
Da CPI do PC para cá, diminuiu a impunidade no Brasil?
Diminuiu a impunidade. A CGU tem números que mostram isso. A ação da equipe do[ministro] Jorge Hage [da Controladoria Geral da União] é muito boa. A maneira como foi feita a declaração de inidoneidade da Delta foi de uma perfeição jurídica exemplar. Os prazos foram acatados. E agora os contratos começam a ser denunciados nos estados.
Pelo que o senhor já conhece, de que forma resumiria esse esquema? Até onde ele vão os tentáculos do grupo do Cachoeira?
A senhora do Cachoeira [Andressa Mendonça] foi muito feliz ao dizer, em uma entrevista, que a vida ia muito bem quando ele só mexia com bingos. Que quando começou a se meter com políticos corruptos, ele começou a se dar muito mal. Eu fiz menção a essa frase, dando a ela o crédito, que nós queremos saber quem são esses políticos corruptos. Nós queremos os nomes deles. Está chegando a hora de o Cachoeira falar. Não é dizer que quer falar. Dizer que quer falar adianta muito pouco. Soa como ameaça. Falando, ele pode inaugurar até outra discussão no Brasil. Talvez Cachoeira seja uma personalidade que possa ter mais do que a lei lhe assegura por meio da delação premiada. Hoje ele tem pouca coisa a oferecer, muito já foi desvendado. Mas o que penso tem pouca importância, o importante é o que ele sabe. Se ele souber mais do que nós sabemos, poderíamos encontrar uma fórmula por meio da qual ele se explicaria sobre o jogo para a polícia. Na parte das relações políticas, ele poderia receber uma espécie de anistia. Não é difícil construir, pelo bem que ele poderá prestar ao Brasil.
A CPI tem como interceder nesse sentido?
Penso que é um gesto voluntário, da vontade do Cachoeira. Não existe prisão boa. Ele estava em Mossoró (RN) e veio para a Papuda. Toda prisão é ruim, ainda mais para quem levava uma vida de fausto como ele, viajando para o exterior, comendo comidas caras, achando pequena a casa que o Perillo vendeu, achando que tinha de ter mais de mil metros quadrados. De repente, o recolhimento pode levá-lo a uma reflexão. Especialistas em matéria criminológica dizem que, depois do oitavo mês, a pessoa se convence de que realmente está presa. E aí começa a pensar diferente. Isso vai se completar em outubro. Até lá, dificilmente, ele se livrará. Quando examino os documentos, percebo nos diálogos que há pânico enorme entre as pessoas pela libertação daqueles membros da quadrilha que receberam habeas-corpus. É preciso que todos saibam disso. São criminosos. E mais criminosos são os políticos que com eles se envolveram. Eles roubam o leito do hospital.
E onde entra a responsabilidade do eleitor nisso?
Você pega o “Analfabeto político” do Bertold Brecht, que virou lugar-comum, e faz dele uma interpretação (leia aqui o poema “Analfabeto Político”, de Bertold Brecht). O Brecht remete ao analfabeto político a responsabilidade pela prostituta, pela criança sem escola, pelo doente sem hospital. É uma peça fantástica do Brecht, mas podemos fazer uma adaptação. A grande responsabilidade é do político, não do cidadão que não se importa com a política. Porque o cidadão que não se interessa pela política hoje é um desencantado. Acho difícil tirar dele a razão. A não ser que possamos dar demonstração efetiva do fim da impunidade, no fim das contas, a democracia terá perdido. Em um artigo publicado há 15 anos, no Le Nouvel Observateur, o professor Jacques Julliard escreveu que, depois de ter combatido a esquerda, depois de ter combatido a direita, a democracia perdeu força, está fenecendo. Não vou divergir dele, mas acho que podemos construir outra teoria, a de que a força da democracia está em exibir os malefícios que são feitos pelos administradores. É transformar a fraqueza em força, esse é o objetivo de quem luta.
Mas a impunidade não é o que deixa o eleitor incrédulo?
Temos pressa em melhorar. Vivemos sucessivas ditaduras. O bem que havia de maior valor para o povo era a liberdade, os direitos individuais. Isso nós conquistamos. Nós chegamos à democracia e, com a liberdade de expressão, a formação de carreiras de Estado, como o Ministério Público, a Receita e a Polícia Federal, o fortalecimento da magistratura, tudo isso tem trazido à tona males que já existiam antes e que agora parece que aumentaram. Não. É que agora são exibidos. A nova busca é o fim da impunidade. Para cada caso resolvido, as pessoas querem outro.
O senhor foi ministro e líder do governo Lula. Como reputa o julgamento do mensalão, marcado para agosto?
É um processo contra o Dirceu e, em resumo, contra o Lula. Não há importa se são 37 ou 38 réus. A opinião pública estará voltada para o julgamento do Dirceu, que era o chefe da Casa Civil do presidente Lula. Esse resultado será espetacular no sentido etimológico da palavra, para um lado ou para outro. Não acredito em resultado por um voto. Não será por um placar apertado. Presumo que a responsabilidade de um juiz não pode admitir qualquer espécie de dúvida. A responsabilidade de um juiz numa corte como o STF tem uma linha comum. Temos uma boa suprema corte. Quando você analisa a composição – e você pode até divergir da posição de um ou outro – não identifica uma razão menor na decisão daquele juiz. Existirá também entre aquelas pessoas a formação de um senso comum.
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