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Embora os dois congressistas sejam os mais visíveis e frequentes autores de emendas nas mais recentes MPs, não são os únicos. Para se ter uma ideia de como tal expediente tem sido usado, a MP 579/2012, por exemplo, apresentada em 12 de setembro, já recebeu nada menos que 483 emendas parlamentares.
Sete das mais recentes MPs protocoladas na Câmara receberam a mesma emenda de Eduardo Cunha. São elas: MP 576/2012; MP 577/2012; MP 578/2012; MP 579/2012; MP 580/2012; MP 581/2012; e MP 582/2012. Dessa lista, Inácio Arruda não apresentou emenda apenas à MP 579/2012.
Exame da ordem
A ação recorrente de Eduardo Cunha visa extinguir o exame da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Ser aprovado no exame é exigência para que o bacharel em Direito possa exercer a advocacia. O deputado é contrário à exigência e a bombardeia emendando medidas provisórias.
“Um dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil é a ‘livre expressão da atividade intelectual’, do ‘livre exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão’. A exigência de aprovação em Exame da Ordem […] é uma exigência absurda que cria uma avaliação das universidades de uma carreira, com poder de veto”, justifica Eduardo Cunha, no texto que sempre acompanha a sua emenda. Eduardo Cunha lembrou ainda que tal exigência corporativa vem sofrendo questionamentos. De fato, um bacharel chegou a contestar a obrigatoriedade da prova junto ao Supremo Tribunal Federal (STF), que rejeitou a ação em 26 de outubro de 2011, por unanimidade.
Para o deputado peemedebista, a OAB deveria combater os “maus profissionais” em vez de exigir teste para ingresso em seu quadro de advogados. “Vários bacharéis não conseguem passar no exame da primeira vez. Gastam dinheiro com inscrições, pagam cursos suplementares, enfim, é uma pós-graduação de Direito com efeito de validação da graduação já obtida. […] Estima-se que a OAB arrecade cerca de R$ 75 milhões por ano com o Exame da Ordem, dinheiro suado do estudante brasileiro já graduado e sem poder ter o seu direito resguardado de exercício da profissão”, arremata Eduardo Cunha, acrescentando que nenhuma outra carreira faz exigência semelhante. Além de tentar a modificação via MP, Eduardo Cunha pretende alterar a Lei 8.906 , que dispõe sobre o estatuto da OAB e foi sancionada em 4 de julho de 1994.
Castanha de caju
Candidato a prefeito de Fortaleza derrotado nas eleições do último 7 de outubro, Inácio Arruda repete sempre duas emendas às MPs. Uma delas pretende enxertar os “códigos TIPI – Tabela de Incidência do Imposto sobre Produtos Industrializados” em anexo da Lei 12.546/2011, para incluir o setor produtivo da castanha de caju, “inclusive do líquido da casca da castanha de caju – LCC”, entre os setores a contribuir sobre o valor da receita bruta, com alíquota de 1% do total.
A sugestão de Inácio substitui contribuições definidas no artigo 22 da Lei 8.212/1991, que versa sobre a organização da Seguridade Social e institui Plano de Custeio, entre outras providências. Para o senador, a inclusão da indústria de beneficiamento da castanha de caju entre os setores contemplados, no âmbito do Programa Brasil Maior, com medidas de desoneração remuneratória, “terá significativo impacto” no Nordeste, ao garantir renda e emprego “tanto no campo como nas cidades”.
Para o senador, sua emenda ajudará o segmento exportador do caju a ter mais condições para enfrentar a concorrência internacional. “Trata-se de um setor relevante para o comércio exterior da Região [Nordeste]. […] A desoneração da folha de pagamento representará contribuição indispensável para garantir a manutenção e expansão da taxa de ocupação de mão-de-obra no setor, inclusive com a incorporação do grande número de empregados atualmente terceirizados”, emenda Inácio na justificação, lembrando que no Ceará, seu reduto eleitoral, a indústria do caju é responsável por cerca de 520 mil empregos diretos e indiretos.
“Drawback”
A outra emenda de Inácio também tem preocupações mercadológicas. Trata-se da prorrogação, “em caráter excepcional”, dos atos concessórios dos chamados “drawbacks” da indústria têxtil – em termos gerais, regime aduaneiro instituído em 1966 que busca suspender ou eliminar tributos sobre insumos importados utilizados em produtos exportados. Segundo a Receita Federal, “o mecanismo funciona como um incentivo às exportações, pois reduz os custos de produção de produtos exportáveis, tornando-os mais competitivos no mercado internacional”.
Inácio lembra que sua emenda contemplará os drawbacks a vencer em 2012 ou cujos prazos máximos tenham sido prorrogados segundo os ditames do Decreto-Lei 1.722, de 3 de dezembro de 1979 – altera o sistema de estímulos fiscais à exportação de manufaturados.
Na justificativa da sugestão, o senador faz menção aos efeitos deletérios da crise econômica mundial para a economia brasileira, em “ambiente de incerteza” vivido por empresas daqui. “Não bastasse a redução do consumo mundial e as medidas restritivas adotadas por diversos países, os exportadores brasileiros ainda estão enfrentando a forte valorização do Real frente ao dólar, o que prejudica sensivelmente nossa competitividade externa – sobretudo quando os maiores exportadores de produtos têxteis e confeccionados do mundo mantêm suas moedas depreciadas de forma administrada […]”, registra Inácio, acrescentando que países estrangeiros também concedem subsídios às suas empresas exportadoras.
Gaveta
O tema das medidas provisórias tem provocado debates intensos no Congresso, sobretudo quando a oposição discorda de suas disposições ou do excesso de enxertos por parte de parlamentares. Nesta legislatura, diversas MPs já foram arquivadas depois de divergências incontornáveis, algumas delas capazes de resultar em agressões físicas em plenário – como aconteceu em 2 de junho do ano passado, quando os senadores Mário Couto (PSDB-PA) e Marcelo Crivella (PRB-RJ), atual ministro da Pesca, quase se estapearam em meio às discussões sobre as MPs 520/2010 e 521/2010.
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Diante da situação, o Senado até que tentou disciplinar a tramitação dessas matérias. Em 17 de agosto, a Casa aprovou a Proposta de Emenda à Constituição 11/2011, que justamente pretende coibir os abusos no rito que esses instrumentos legislativos sofrem no Congresso. Tão logo foi anunciada a aprovação, o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP) chamou a atenção do plenário para dizer que assinava naquele instante o envio da proposição à Câmara, como que a pedir àquela Casa, para onde segue o texto, sua rápida tramitação. Até o presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), tentou alteração no rito de MPs que trancam a pauta (impedem a votação de outras proposições antes das medidas), mas pouca coisa mudou.
Passados exatos 14 meses desde a aprovação da PEC 11/2011, não há data prevista para a apreciação da matéria pelos deputados. Não há informação sequer se a proposição pode ser apreciada ainda em 2012 – ano eleitoral que frustra o avanço da pauta legislativa, devido ao esvaziamento do Congresso por parlamentares envolvidos em campanhas. Segundo a assessoria da Câmara, a votação da matéria em plenário depende da concordância do colégio de líderes, que ainda não se manifestou sobre o assunto.