O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), classificou como “graves acusações” o conteúdo da entrevista do ministro da Justiça, Torquato Jardim, veiculada pelo jornalista Josias de Souza no portal UOL. No material publicado ontem (31/out), Torquato diz, entre outras coisas, que o governador do Rio de Janeiro, Luiz Fernando Pezão, e o secretário de Segurança do estado, Roberto Sá, não têm a Polícia Militar sob controle, e que o comando da segurança pública fluminense é fruto de “acerto com deputado estadual e o crime organizado”. Representante do Rio, Maia cobra provas e diz ter reagido “com perplexidade” às declarações.
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A mensagem foi enviada à imprensa pela assessoria do deputado, que está em viagem de mais de uma semana com outros colegas de Câmara. “Recebi com perplexidade as declarações feitas pelo ministro da Justiça, Torquato Jardim, sobre a segurança pública do Rio de Janeiro. Espero que o ministro apresente provas sobre as graves acusações, que o governo federal também se pronuncie oficialmente e, principalmente, o Rio espera ações do governo e do ministro da Justiça”, diz Maia na nota.
A reação de Maia a um ministro de Estado da gestão Michel Temer – que acabou de barrar na Câmara uma segunda denúncia criminal, com a ajuda do deputado – é mais um elemento a alimentar a turbulência na base de sustentação ao governo. Um dos principais fiadores da política reformista do presidente, Maia tem demonstrando insatisfação crescente com os rumos da gestão peemedebista, que inclui disputa por parlamentares e espaço na máquina governamental.
Embora ainda não admita publicamente, Maia é eventual candidato ao Governo do Rio de Janeiro, que enfrenta onda de violência em favelas e continua a registrar casos de bala perdida. Sob o mote da segurança pública, o deputado usa a influência que desfruta no poder central desde o impeachment de Dilma Rousseff, concretizado em 31 de agosto de 2016, para se apresentar como agente público no combate à violência urbana.
Mas não só em relação ao tema da criminalidade. No início de setembro, por exemplo, substituiu Temer na Presidência da República e chorou ao assinar decreto que formalizou acordo de recuperação fiscal do Rio de Janeiro. Em cerimônia fechada no Palácio do Planalto, o deputado declarou que a medida garante ao Rio auxílio financeiro da ordem de R$ 3,5 bilhões, e que a ajuda da União seria o “único caminho” para impedir um colapso financeiro no estado.
“Incomunicável”
Mas o deputado do DEM também provoca reações adversas na base aliada. Como repercussão da viagem ao exterior em plena semana de feriado, em um momento de crise multifacetada no país, o líder do PMDB na Câmara, Baleia Rossi (RJ), deixou escapar uma mensagem de áudio sobre o assunto. A CBN teve acesso à fala de Baleia ao telefonar para um dos deputados participantes da comitiva – depois da gravação da entrevista, o parlamentar manteve o telefone ligado e o aparelho da rádio captou o áudio, cujo conteúdo estava audível.
Dizendo ter sido procurado pela imprensa para comentar os gastos da viagem, Baleia queixou-se da repercussão negativa sobre a viagem. “Agora o Rodrigo tem que falar o seguinte – não é que ele está devolvendo; ele não vai receber. Porque esse negócio de devolver… Aí coloca a gente numa saia justa do cão”, comenta o deputado.
“Agora de nove dias nós só estamos recebendo cinco diárias, não é? Eu estou falando que eu estou abrindo mão de quatro diárias. Abrir mão para economizar, para ajudar o país. Falei para meu jornalista [um de seus assessores de imprensa]: ‘Meu filho, estou incomunicável. Depois, no final da viagem, eu vejo o que eu faço’”, acrescenta Baleia.
O líder peemedebista disse ainda que a Câmara custeia, nos termos do regimento interno, diárias até o limite de cinco dias. Maia e seus pares fica fora por nove dias, em tour estimado em R$ 90 mil para os cofres públicos.
Ao debate
Diante da reação das autoridades fluminenses, que demonstraram indignação ante à fala do ministro, Torquato as desafiou a provar que ele esteja errado. Como desdobramento da primeira entrevista, o jornal O Globo veiculou nesta quarta-feira (1º) mais declarações do ministro, entre elas a que rebate o posicionamento de Pezão.
“Lamento a repercussão e extensão que teve [a entrevista ao UOL]. Fiz uma crítica institucional pessoal. Mas, se estou errado, que me provem”, provocou Torquato. Para o ministro, a “própria história da instituição” aponta a ligação do comando da PM com o crime organizado. “Em algum momento, neste ano, de uma única vez, foram presos 93 policiais de um batalhão em São Gonçalo. Alguns dias mais tarde, mais alguns. E qual foi a consequência disso? A polícia tem que revelar, tem que contar. [Tem] a questão de vazamento de informações”, acrescentou.
No Congresso, a reação às declarações de Torquato também se multiplicaram, com cobranças veementes de esclarecimentos por parte dos oposicionistas. De ontem para hoje (1º), deputados e senadores de vários partidos comentaram o assunto e cobraram mais explicações do ministro. Na próxima semana, o chefe da Justiça deverá ir ao encontro dos parlamentares para debater o assunto. A expectativa é que audiências públicas sejam realizadas com Torquato em comissões temáticas na Câmara e no Senado, ou por meio de reuniões conjuntas.
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