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Como denunciou o Congresso em Foco, o golpe da creche é um conjunto de expedientes ilegais praticados por uma quadrilha que vem sendo investigada na Câmara dos Deputados, pelos quais pessoas carentes são usadas com o propósito de desviar dinheiro público. Essas pessoas são abordadas com a promessa de obterem benefícios sociais (vale-transportes, auxílio-creche, etc). Na verdade, elas são contratadas como funcionárias dos gabinetes dos deputados e ficam com parte dos benefícios que a Câmara concede a seus servidores. E o esquema fica com o salário acertado na contratação. Em um dos casos mais notórios, o pasteleiro Severino foi contratado por R$ 7 mil como funcinário do gabinete de Mabel. Ele ficava apenas com os benefícios sociais, e o dinheiro do salário era usado para pagar despesas de pessoas ligadas ao deputado. Em sua defesa, Mabel sempre afirmou ser vítima da quadrilha, que teria atuado à sua revelia, até, segundo ele, falsificando sua assinatura nos documentos de contratação. E jogava a responsabilidade pelas irregularidades para seu ex-motorista Francisco José Feijão de Araújo, conhecido como Franzé.
Em parecer à 12ª Vara Federal de Brasília, Calabrich, porém, que atou no inquérito junto com a procuradora Andréia Araújo, afirma que Sandro Mabel foi responsável pela contratação do pasteleiro fantasma, “pessoalmente ou por intermédio de seu motorista”. Foi no depoimento à Polícia Legislativa da Câmara que Sandro Mabel disse que suas assinaturas foram falsificadas. Para atestar tal afirmação, foi pedido um exame grafotécnico ao Instituto Nacional de Criminalística. Dois anos, depois, porém, tal laudo ainda não concluído. Para Bruno Calabrich, porém, os índicos já demonstram que Mabel tinha, “naturalmente, pleno conhecimento do pagamento indevido das correspondentes vantagens” a Severino Lourenço, segundo parecer escrito em novembro de 2011.
Veja a íntegra do parecer do MPF
Como mostrou o Congresso em Foco, ao revelar o “golpe da creche” em 2009 e 2010, Severino foi contratado para o gabinete de Mabel, mas nunca trabalhou lá. Ele disse à polícia e ao site que cedeu seu nome, seus documentos e os de seus filhos na esperança de receber uma espécie de Bolsa Família, de R$ 100 para cada criança. Mas o pasteleiro virou servidor da Câmara, recebendo salários, auxílio-creche de cerca R$ 1.700 e vale-transporte de quase R$ 500. Parte dos rendimentos dele foi parar nas mãos de pessoas que, por ordem de Mabel, deveriam receber dinheiro do gabinete.
Mabel acertou contratação, diz motorista
Na manifestação à Justiça, Calabrich usa como indício da participação de Mabel no caso um novo depoimento da chefe de gabinete do deputado, Maria Solange Lima. O depoimento dela chegou à Procuradoria da República no Distrito Federal em novembro de 2011. Nele, Solange Lima afirmou que o motorista Franzé lhe relatou que foi o parlamentar quem acertou com ele a contratação do pasteleiro. Ela disse aos investigadores que observou o nome do pasteleiro na folha de pagamento do gabinete e constatou que ele não trabalhava. Solange foi, então, falar com Franzé.
A chefe de gabinete relatou: “Perguntou a pessoa de Francisco Feijão quem teria realizado a contratação de tal pessoa, tendo o mesmo respondido que havia acertado pessoalmente com o deputado Sandro Mabel a contratação do mesmo, não sabendo informar ainda qual seria a atribuição de Severino”.
Solange ainda disse que Mabel tinha controle sobre as contratações e sobre salários pagos a eles, tendo em vista que existe um limite de R$ 60 mil mensais para se pagar os secretários parlamentares. “As contratações, bem como os valores pagos aos servidores era (sic) resolvido pelo deputado, o qual sempre perguntava à declarante acerca da disponibilidade ou não de recursos dentro da verba parlamentar”. Como mostrou o Congresso em Foco, em depoimento à Polícia Legislativa da Câmara, em 15 de outubro de 2009, Mabel disse ignorar o paradeiro de cinco funcionários de seu gabinete envolvidos no golpe da creche.
Íntegra do depoimento do deputado
No novo depoimento à polícia, Solange disse que seria natural que Franzé, por ser motorista de Mabel, tivesse “uma convivência muito próxima” com o parlamentar. Assim, a chefe de gabinete disse que determinadas atos administrativos poderiam ser feitos sem o conhecimento dela. “Seria até natural que algumas autorizações de natureza administrativa pudessem ser decididas diretamente entre o deputado e a pessoa de Francisco”, disse Solange.
Oitiva do deputado
O procurador Bruno Calabrich pediu à juíza da 12ª Vara Federal, Pollyanna Kelly Alves, que remetesse o caso ao Supremo porque Mabel é deputado federal e, portanto, tem foro privilegiado. Além disso, essa seria a forma legal de o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, continuar as investigações. Uma das medidas seria tomar o depoimento de Sandro Mabel e analisar documentos recebidos pelos procuradores de primeira instância.
Com a manifestação do Ministério Público em mãos, a juíza Pollyanna Kelly concordou que a investigação “alcançava” o deputado. Ela determinou a remessa dos autos ao STF, que mandou o depoimento de Solange, as conclusões de Calabrich e toda a papelada para Gurgel. Na semana passada, o procurador geral começou a analisar o caso e disse ao Congresso em Foco que vai pedir mais diligências para complementar a apuração da Polícia Federal e da Procuradoria da República no Distrito Federal.
A reportagem pediu esclarecimentos ao deputado Sandro Mabel e à sua assessoria, mas não obteve nenhuma resposta. Desde quinta-feira passada (28), o parlamentar não comenta a investigação contra ele no inquérito 3421, aberto no Supremo Tribunal Federal.
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